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C. LEVI-STRAUSS<br />
TRISTES TR6PICOS<br />
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I<br />
tal;iles para se refugiar nos quiiombos. Mas, se os Nhambiquara<br />
tivessem recebido sangue negro numa epoca reeente,<br />
seria incompreensivel que, como verificamos, pertencessem todos<br />
ao grupo sangufneo 0, 0 que impIica, senao numa origem<br />
puramente india, em todo caso urn isolamento demografico<br />
prolongado durante seculos. Hoje, 0 tipo fisico dos Nhambiquara<br />
nos parece menos problematico; evoca 0 de uma autiga<br />
ra@, cujas ossadas se conhecem, encontradas no Brasil nas<br />
grotas da Lagoa Santa, no Estado de Minas Gerais. Quanto<br />
a mim, encontrava, estupefacto, as fisionomias quase caucasieas<br />
que se veem em certas esUituas e baixos-relevos da regiao<br />
de Vera Cruz e que se atribuem agora as mais antigas civi<br />
Iizal;iles do Mexico.<br />
Essa aproxima~ao<br />
tornava-se mais perturbadora pela indigencia<br />
da cuItura material, que nao levava a Iigar os Nhambiquara<br />
as mais altas culturas da America central ou setentrional,<br />
mas antes a trata-los como sobreviventes da idade da<br />
pedra. 0 traje das mulheres reduzia-se a uma fina carreira<br />
de contas de conchas, enrolada em Wrno da cintura e algumas<br />
outras a guisa de colares ou de bandoleiras; brincos de madreperola<br />
ou de penas, braceletes talhados na carapa!:ll do<br />
tatu-canastra e, as vezes, estreitas faixas, de algodao (tecido<br />
pelos homens) ou de palha, amarradas em Wrno dos biceps<br />
e dos tornozelos. 0 traje mascuIino era ainda mais sumario.<br />
salvo uma borla de palha pendurada, as vezes, na cintura, acirna<br />
das partes sexuais.<br />
AMm do arco e flecha, 0 armamento compreende uma especie<br />
de lan~a achatada, cujo uso parece tanto magico quanto<br />
guerreiro: s6 0 vi utiIizado em manipula~es destinadas a pOr<br />
-em fuga 0 furadl0 ou a matar, projetando-a na dir~ao conveniente,<br />
os atasu, que sao os espiritos maIfeitores do mato.<br />
Os indigenas chamam pelo mesmo nome as estrelas e os bois,<br />
de que tem grande mMo (mas matam e comem com apetite<br />
os burros, que, entretanto, conheceram ao meSillO tempo). Men<br />
rel6gio de pulso era tamMm urn atasu.<br />
Todos os bens dos Nhambiquara cabem folgadamente no<br />
cesto earregado pelas mulheres durante a sua vida n6made.<br />
li::sses eestos sao de taquara fendida, tran!iada em grade, com<br />
seis hastes (dois pares perpendiculares entre si e urn par<br />
obliquo), formando uma rMe de largas malhas estreladas;<br />
ligeiramente mais largas no oriffcio superior, terminam por<br />
baixo em dedo de luva. Suas dimensaes podem a1can~ar 1,50 m,<br />
isto e, sao por vezes tao altas quanto a carregadora. Poem-se<br />
no fundo alguns bolos de mandioca, cobertos de f6lhas; e em<br />
cima, 0 mobiIiario e os instrumentos: caba!ias; faeas feitas<br />
com lascas de bambu, pedras grosseiramente talhadas ou peda~os<br />
de ferro - obtidos por troca - e fixados, com cera e<br />
cordeis, entre duas placas de madeira, formando 0 cabo; furadores<br />
compostos de um punctor de pedra ou de ferro, montado<br />
na extremidade duma haste que se gira entre as palmas<br />
da mao. Os indigenas possuem machados e machadinhas de<br />
metal, reeebidos da Comissao Rondon, e seus machados de<br />
pedra lhes servem quase exclusivamente de bigorna, para a<br />
fabrica!iao de objetos de concha ou de osso; sempre utilizam<br />
m6s e polidores de pedra. A olaria e desconhecida dos grupos<br />
orientais (por onde comecei a minha pesquisa); e, de resto,<br />
grosseira por tOda parte. Os Nhambiquara nao tem pirogas<br />
e atravessam os cursos dagua a nado, com 0 auxflio, por<br />
vezes, de molhos de lenha como b6ias.<br />
l!:sses utensflios sao rnsticos e mal merecem 0 nome de<br />
objetos manufaturados. 0 cesto nhambiquara contem sobretudo<br />
as materias-primas com as quais se fabrieam os objetos,<br />
a medida em que surgem as necessidades: madeiras variadas,<br />
sobretudo as que servem para produzir 0 fogo por fri~o,<br />
blocos de rera OU de resina, novelos de fibras vegetais, ossos,<br />
dentes e unhas de animais, peda~os de peles, penas, espinhos<br />
de ouri!iO, caseas de nozes e conchas fIuviais, pedras, algodao<br />
e graos. Todo Isso se apresenta num aspecto tao Informe que<br />
o colecionador se sente desanimado por uma exibi!iao que<br />
parece resultar menos da industria humana do que da atividade,<br />
observada a lupa, de uma ra~a gigante de formigas. Ka verdade,<br />
e numa coluna de formigas que fazem pensar as Nhambiquara<br />
marcbando em fila atraves da alta vegeta(;lio, cada<br />
muIher esmagada por seu eesto de vime claro, como as formigas<br />
as vezes 0 sao pelos seus ovos.<br />
Entre os indios da America tropical, a quem se deve a<br />
inven~ao da rMe, a pobreza e simbolizada pela ignoriincia<br />
desse utensflio e de qualquer ontro servindo para 0 repouso<br />
ou para 0 sono. Os Nhambiqnara dormem no chao e nus.<br />
Como as noites da esta!iaO seea sao frias, esquentam-se eneostando-se<br />
uns contra os outros, ou aproximando-se das fogueiras<br />
que se extinguem, a tal ponto que os indigenas aeordam de<br />
rnadrugada chafurdados nas cinzas ainda mornas. Por essa<br />
razao, os Pareci designam-nos por urn apeIido: uaikoakore, "os<br />
que dormem no chao".<br />
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