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o soneto brasileiro

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características hoje indicadoras de "dureza da metrificação", de "rimas<br />

forçadas" ou de "tibieza na construção" eram, na época, fenômenos<br />

naturais ao idioma e à poesia. Nenhuma rima é "forçada" em si mesma, na<br />

sua forma ou sonoridade, mas sim quando o vocábulo por ela terminado foi<br />

mal empregado no contexto. Afinal, nem todas as rimas são consoantes,<br />

nem ricas, e sua escolha cabe unicamente ao poeta, não à crítica.<br />

Ademais, nem toda metrificação é defeituosa quando atentamos para as<br />

particularidades da pronúncia corrente naquele tempo ou espaço. Basta<br />

notar que "com as" se contrai em "co'as" no <strong>soneto</strong> mirandiano, e, no de<br />

Ferreira, "espírito" soa como "esp'rito" e "juízo" como "j'izo", sem o<br />

menor problema.<br />

[4.22] Chega a ser engraçada a petulância com que historiadores do naipe<br />

de Fidelino de Figueiredo apontam "deslizes" métricos em Camões - tal<br />

como Garrett fez reparos em Bocage - como se a métrica (e com ela toda a<br />

versificação) não fosse praticamente inventada pelos próprios poetas - e<br />

só posteriormente codificada pelos esticólogos. Causa riso a facilidade<br />

com que certos autores - mesmo os que nem são poetas - querem "catar<br />

pulgas no leão", garimpando supostos cochilos em quem jamais os<br />

cometeria e, quando os comete, fá-los cabeludos, tão intencionalmente<br />

quanto cometo este cacófato. Chamar de "claudicante" quem faz<br />

malabarismos numa corda bamba, ou ver "rimas forçadas" em quem só faz<br />

força quando está sentado no vaso, é deplorável, se não for hilário.<br />

[4.24/25] Se a personagem de Natércia é lenda literária ou não, pouco<br />

importa. O que me causa espécie é essa pretendida imprescindibilidade<br />

(Que belo termo, hem?) da musa encarnada em mulher, que se identifique<br />

com o grande amor da vida de todo poeta. Nada contra, repito, o papel<br />

representado pelas Beatrizes, Lauras, Marílias ou Nises, mas nada de<br />

estender essa "musocracia" a qualquer poeta que se queira "maior", até<br />

porque o próprio Camões se imortalizou na poesia épica, mais que na<br />

lírica. O problema literário, ao que se vê, reside precisamente no<br />

<strong>soneto</strong>, que, se dependesse de determinadas vertentes da crítica e da<br />

historiografia, jamais se libertaria do lirismo platônico à moda de<br />

Arvers. (Ver 1.24/26)<br />

[4.32] Concordo que o gongorismo, em seus aspectos mais postiços e<br />

supérfluos, seja levado à conta de degenerescência do barroco, mas<br />

nenhuma hipertrofia pode servir de pretexto para impugnar, em bloco, a<br />

poética e a poesia barrocas. O perigo, implícito nesse repúdio<br />

generalizado, consiste em desmerecermos, no Brasil, a obra de ninguém<br />

menos que Gregório. Chamar de "sobriedade" e de "discreta elegância" a<br />

poesia arcádica, por oposição à "perversão do bom gosto" e à "decadência<br />

retórica" atribuídas maldosamente ao barroco, equivale a sonegar o<br />

devido tributo à obra gregoriana e à de seus referenciais espanhóis (a<br />

exemplo do caso que citei em 2.5). Ainda que seja compreensível, por<br />

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