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se nos apresentam direta e cruamente, mas como que<br />
refratadas pela ambiência em que se movem. Pode-se dizer<br />
que ele usa aqui uma técnica algo semelhante à da construção<br />
da personagem proustiana {2} , a partir de três ângulos<br />
principais de enfoque: primeiro, uma notícia da sociedade<br />
sobre a personagem; segundo, suas ações (é através destas,<br />
especialmente, que os tipos femininos de Érico se firmam) e,<br />
por último, a imagem física. Para esta ele em geral se<br />
aproveita de circunstâncias incidentais como a informação<br />
sobre a cor do cabelo quando uma delas se penteia ou dos<br />
olhos quando, acaso, se miram num espelho. Outro elemento de<br />
caracterização, mas menos constante: as reflexões do Autor<br />
sobre suas criaturas.<br />
Significativamente, é nas suas melhores criações que o<br />
processo está mais à mostra. A primeira notícia sobre Maria<br />
Valéria nos vem de fora, justamente de um sitiante do sobrado<br />
onde ela se encontra cercada com a família do cunhado. É do<br />
Tenente Liroca, que mantém por ela uma velha “paixão<br />
recolhida”:<br />
“— Por alguns instantes José Lírio ficou a mirar a<br />
fachada do casarão, e de repente a lembrança de que Maria<br />
Valéria estava lá dentro lhe varou o peito com um pontaço de<br />
lança”. {3}<br />
Depois, as ações dela dominam por completo aquele<br />
ambiente dramático, transformando-a em heroína da<br />
resistência moral. Mesmo assim, somente transcorridas umas<br />
vinte páginas de seu aparecimento é que o leitor consegue<br />
entrever fugidiamente o seu rosto:<br />
“Maria Valéria acende uma vela nos tições e atravessa<br />
com ela a sala de jantar na direção da despensa. A chama<br />
ilumina-lhe o rosto descarnado e severo, um rosto anguloso e<br />
sem idade, mas de grandes olhos escuros e lustrosos”. {4}<br />
Não é menos típico o critério empregado na<br />
apresentação de Ana Terra. O autor nos desvenda seu segredo<br />
num diálogo imaginário com um repórter hipotético:<br />
“R — Como vê Ana Terra fisicamente?<br />
A — Essa criatura foi sempre um vulto quase sem<br />
feições na minha mente. Confesso que nunca lhe vi o rosto<br />
com nitidez, nem mesmo nos dias de grande sol. Para<br />
descrevê-la no livro usei um truque batido mas que não deixa<br />
de ter algo de telúrico. Fiz Ana ajoelhar-se à beira de uma<br />
sanga e mirar-se no espelho da água”. {5}<br />
Essa mesma dificuldade na caracterização dos tipos<br />
físicos de algumas de suas heroínas ocorreu ao autor destas<br />
linhas que, certa feita, apelou para o próprio Érico:<br />
— A propósito de Fernanda, como é mesmo seu rosto?<br />
Ele me confessou seu embaraço...<br />
No estranho conto-fantasia Sonata, um tanto excêntrico<br />
em seu contexto novelístico, o professor de piano a domicílio,<br />
que narra o acontecimento na primeira pessoa, confessa: