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— Deve ser a bruta! — gritou-lhe alguém.<br />
Zé Maria caminhava como um ébrio, os olhos turvos, a<br />
cabeça tão tonta que nem podia pensar. A uma esquina<br />
encontrou o Madruga.<br />
— Onde vais com tanta pressa, homem?<br />
Zé Maria afastou-o com a mão.<br />
— Me deixa.<br />
Madruga ficou rindo, o palito tremeu-lhe nos lábios.<br />
— Pensas que tiraste a sorte grande, animal?<br />
Na frente da agência do italiano Bianchi havia gente<br />
amontoada, procurando ler o número escrito no quadro-negro.<br />
Bianchi, rindo com toda a cara vermelha e enrugada, emergiu<br />
da maçaroca humana e correu para Zé Maria, de braços<br />
abertos:<br />
— Felizardo! Felizardo! A bruta!<br />
Zé Maria negava-se a compreender, a acreditar. Era<br />
demais. Aquilo não lhe podia acontecer. Ah! Não podia.<br />
— Mas é a bruta. Dois mil contos! Eu mandei na loja lhe<br />
avisar!<br />
Diante dos olhos do coronel tudo dançava: o italiano, as<br />
árvores, as pessoas... Os foguetes continuavam a subir para o<br />
céu e estouravam lá em cima, provocando ecos atrás da<br />
igreja. Agora em torno de Zé Maria havia muitas pessoas,<br />
conhecidas umas, desconhecidas outras. Ele tinha vontade de<br />
gritar. Sons confusos lhe chegavam aos ouvidos: — Parabéns!<br />
Felizardo! Qual foi o número? Nasceu empelicado! Sim senhor!<br />
Depois que se livrou dos abraços da primeira hora,<br />
examinando com os próprios olhos s telegrama que trouxera o<br />
resultado da extração; depois que bebeu um copo dágua fria é<br />
que Zé Maria começou a se habituar à realidade maravilhosa.<br />
Quando serenou, o seu primeiro pensamento foi para o amigo:<br />
“Eu só quero é ver a cara do Madruga.” E viu. Madruga chegou,<br />
fingindo indiferença.<br />
— Ouvi dizer que tiraste a sorte grande.<br />
O sorriso largo de Zé Maria era uma confirmação.<br />
Madruga segurou o palito, fleumático, fez uma careta de<br />
dúvida e disse:<br />
— Não sei se te felicito... Bem diz o ditado que a fortuna<br />
é cega. Deus às vezes dá osso pra cachorro sem dente. Dentro<br />
de dois anos não tens mais um miserável níquel. Por falar<br />
nisto, me empresta vinte mil-réis.<br />
Zé Maria tirou do bolso uma cédula de cinqüenta.<br />
— Leva cinqüenta! Estou louco da vida.<br />
Quando souberam a notícia, Chinita e Manuel soltaram<br />
urros de prazer. O rapaz quebrou uma compoteira de vidro<br />
amarelo. Tinha raiva daquela coisa. Havia muito que refreava<br />
uma vontade insuportável de quebrar aquele objeto que lhe<br />
irritava os nervos. Agora que estavam ricos tudo se podia<br />
fazer.<br />
D. Maria Luísa, ao saber do grande acontecimento, teve<br />
um desmaio. Chamaram o Carvalho da Farmácia, que veio com