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que está no living: — Mamãe, vou até a casa da Chinita.<br />
D. Dodó ergue os olhos do livro que está lendo (A Vida de<br />
Santa Teresinha) e pergunta:<br />
— Vais demorar?<br />
Mas Vera já está fechada no quarto. D. Dodó baixa os<br />
olhos. Passam-se cinco minutos. Ouve-se o ruído do motor do<br />
Chrysler, na frente da casa. Vera desce a escada, apressada:<br />
— Adeus!<br />
— Manda logo o automóvel, minha filha, que eu tenho<br />
muitas obrigações para hoje.<br />
D. Dodó ouve a batida da porta da rua e pouco depois o<br />
ronco do motor do carro, que arranca.<br />
Fecha o livro por um instante e fica a pensar nos<br />
compromissos do dia. Visitar dois dos seus pobrezinhos naquela<br />
rua de Navegantes. Falar com a secretária da Sociedade das<br />
Damas Piedosas a respeito das notícias para a próxima<br />
quermesse. Passar pela casa das Monteiro para avisar que a<br />
distribuição de cobertores no Asilo ficou transferida para<br />
domingo que vem. Ir à casa da senhora do Dr. Martins<br />
combinar o dia da quermesse. Passar pela loja, dar um beijo no<br />
Teotônio (detalhes indispensáveis) e levar mais um vidro de<br />
Nuit de Noel. Ah! E também comprar umas fitinhas para botar<br />
nas camisas de dormir de Vera. (Essa menina não cuida da<br />
roupa dela! Nunca vi tamanho indiferentismo. Ai!)<br />
Com um suspiro, D. Dodó torna a abrir o livro.<br />
Podia em tais circunstâncias alimentar esperança<br />
de ser admitida de pronto no Carmelo? Para fazer-me<br />
crescer em virtude num momento, fazia-se mister um<br />
milagrezinho, e este milagre tão desejado fê-lo Deus no<br />
dia inolvidável, 25 de dezembro de 1886. Nessa festa do<br />
Natal, nessa noite abençoada, Jesus, meigo Infante<br />
recém-nascido, de uma hora para outra mudou as<br />
trevas da minha alma em catadupas de luz. Fazendo-se<br />
fraco e...<br />
D. Dodó esquece o livro e pensa no seu milagre. Foi há<br />
dez anos. Teotônio tinha caído de cama com uma pneumonia<br />
dupla. Três médicos à cabeceira: dois o desenganavam, só um<br />
tinha um restinho de esperança. Um dia ela foi ajoelhar-se aos<br />
pés da imagem de Santa Teresinha e pediu: Se ele sarar, eu<br />
prometo ficar mais religiosa do que sou e só cuidar da Santa<br />
Madre Igreja e da caridade. Amém. No dia seguinte Teotônio<br />
melhorou. A febre baixou, os médicos criaram alma nova.<br />
Explicavam: “O organismo reagiu.” Mas secretamente ela sabia<br />
que não tinha sido o organismo e sim a vontade de Deus Nosso<br />
Senhor e a mediação de Santa Teresinha. Passaram-se os dias<br />
e Teotônio foi melhorando sempre. Veio a convalescença. E<br />
quando ele ficou em condições de andar, ela o levou à Igreja e