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Tese de Doutorado - versão final - Sistema de Bibliotecas da FGV ...

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10.5. O sustento insustentável<br />

Dentre os aspectos comuns aos discursos dos entrevistados, um chamou a atenção<br />

por sua unanimi<strong>da</strong><strong>de</strong> e por seu caráter um tanto contraditório. Todos os entrevistados aos<br />

quais se perguntou “Se você não precisasse trabalhar para manter seu padrão <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, o que<br />

você faria?” respon<strong>de</strong>ram, sem hesitação, que não permaneceriam em sua ocupação atual.<br />

Deve-se ressaltar que aí se incluem profissionais altamente satisfeitos, motivados e<br />

a<strong>da</strong>ptados à impermanência e ao estresse <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> corporativa. Ou seja, nem mesmo esses<br />

indivíduos que relatam um gran<strong>de</strong> prazer em sua ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> profissional permaneceriam<br />

nessa ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> se isso não fosse necessário à sua subsistência. O que essas entrevistas<br />

sugerem é que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente dos significados e propósitos individualmente<br />

<strong>de</strong>svelados no trabalho corporativo, um propósito fun<strong>da</strong>mental estaria no cerne <strong>da</strong><br />

condição assalaria<strong>da</strong> corporativa: o sustento pessoal e familiar.<br />

Uma vez enuncia<strong>da</strong>, essa proposição parece um tanto óbvia. A<strong>final</strong> – po<strong>de</strong>ria se<br />

pensar – o trabalho é mesmo uma ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> humana <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> à sua subsistência material.<br />

Mas esse raciocínio não se sustenta diante <strong>de</strong> um contra-exemplo fornecido por uma<br />

psicoterapeuta entrevista<strong>da</strong>. Diante <strong>da</strong> mesma pergunta, foi enfática em afirmar que se<br />

manteria na mesma ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> profissional e manteria, inclusive, sua atual alocação <strong>de</strong><br />

tempo para trabalho, família e lazer. Ou seja, essa profissional não-assalaria<strong>da</strong> que trabalha<br />

para seu sustento continuaria a trabalhar e viver <strong>da</strong> mesma forma se o sustento fosse<br />

assegurado por outras fontes.<br />

Apesar <strong>de</strong> o objetivo <strong>de</strong>sse capítulo não ser discutir as causas ou as razões para<br />

essas diferentes relações entre trabalho e sustento, um possível caminho para esse<br />

entendimento po<strong>de</strong> estar nas diferenças fun<strong>da</strong>mentais entre o trabalho assalariado e o<br />

trabalho autônomo. Diferenças talvez tão significativas quanto aquelas entre o trabalho<br />

assalariado e o lazer, que fazem com que uma <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> possa ter experiências<br />

subjetivas distintas para um mesmo indivíduo. Por exemplo, uma mulher brincando com<br />

seus filhos está num momento <strong>de</strong> lazer, enquanto que essa mesma mulher brincando com<br />

filhos alheios em uma creche está trabalhando. Remontando às dicotomias greco-romanas<br />

em relação ao trabalho – trabalho intelectual x manual; trabalho liberal x servil – parece-<br />

nos que o estar subordinado em uma ocupação ain<strong>da</strong> seria percebido como condição servil,<br />

ina<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> para ci<strong>da</strong>dãos livres. Mesmo que essa ocupação seja caracteristicamente<br />

intelectual, como a dos trabalhadores informacionais.<br />

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