Tese de Doutorado - versão final - Sistema de Bibliotecas da FGV ...
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inscrita em uma interiori<strong>da</strong><strong>de</strong> psíquica ou genética. Somos existentes e, como tais,<br />
in<strong>de</strong>termináveis a priori. Enten<strong>de</strong>r-se como algo simplesmente <strong>da</strong>do é uma possibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
humana (Eu nasci X, meu temperamento é Y, aprendi Z, então eu sou XYZ). Mas é uma<br />
possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> ao modo do fechamento, em que o impessoal (p. ex., a tradição, as ciências, a<br />
cultura, o grupo socioeconômico) produz um entendimento <strong>de</strong> si-mesmo <strong>de</strong> uma<br />
<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> maneira em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras. Isso significa que, na maior parte <strong>da</strong>s vezes,<br />
o si-mesmo supostamente livre e original é pouco mais que uma <strong>versão</strong> individual <strong>de</strong>ssas<br />
sobre<strong>de</strong>terminações do todo-mundo (do impessoal). O modo cotidiano <strong>de</strong> ser do Dasein,<br />
que <strong>de</strong>nominamos impróprio ou inautêntico, lhe “retira a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se guiar por si<br />
mesmo, <strong>de</strong> questionar e escolher a si mesmo.” (HEIDEGGER, 1997: 49)<br />
Mas o que seria o modo próprio ou autêntico <strong>de</strong> ser, consi<strong>de</strong>rando-se que não há um<br />
po<strong>de</strong>r-ser i<strong>de</strong>al a nortear ca<strong>da</strong> indivíduo? Como escapar à ditadura do impessoal sem um<br />
plano singular, que <strong>de</strong>fina o que ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>ve ser? No contexto ocupacional, por exemplo,<br />
as vocações não seriam os a prioris que norteariam o que <strong>de</strong>vemos ser? Não <strong>de</strong>veríamos<br />
buscar em nosso interior essas <strong>de</strong>terminações?<br />
questões:<br />
Recorramos ao próprio Hei<strong>de</strong>gger para buscar um caminho <strong>de</strong> entendimento <strong>de</strong>ssas<br />
A passagem do impessoal, ou seja, a modificação existenciária do próprioimpessoal<br />
para o ser-si-mesmo em sentido próprio <strong>de</strong>ve-se cumprir como<br />
recuperação <strong>de</strong> uma escolha. Recuperar a escolha significa escolher essa escolha,<br />
<strong>de</strong>cidir-se por um po<strong>de</strong>r-ser a partir <strong>de</strong> seu próprio si-mesmo. Apenas escolhendo a<br />
escolha é que a pre-sença [Dasein] possibilita para si mesma o seu próprio po<strong>de</strong>rser.”<br />
(HEIDEGGER, 2005: 53)<br />
O modo <strong>de</strong> ser do Dasein é existir. Logo, ele é um ‘sendo’, um ‘po<strong>de</strong>r-ser’. Só<br />
sabemos quem ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente somos, sendo. O Dasein não é suas potenciali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, não é<br />
sua vocação. Vocações são possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s, não <strong>de</strong>stino. Enten<strong>de</strong>r-se a partir <strong>da</strong>s vocações é<br />
uma mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> tão imprópria quanto tomar-se pelo que diz o impessoal, visto que ambos<br />
estão em fechamento. O modo próprio ou autêntico <strong>de</strong> ser é o existir; é o estar em abertura,<br />
enten<strong>de</strong>ndo-se em permanente <strong>de</strong>vir. O que <strong>de</strong>nominamos nossa interiori<strong>da</strong><strong>de</strong>, qualquer<br />
que seja sua acepção, se toma<strong>da</strong> como aquilo que somos, implica novo fechamento. Essa<br />
interiori<strong>da</strong><strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser o que temos sido; mas, se compreendi<strong>da</strong> <strong>de</strong> modo próprio, <strong>de</strong>ve ser<br />
uma <strong>de</strong>ntre várias possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s do que ain<strong>da</strong> po<strong>de</strong>mos ser.<br />
Uma conseqüência direta <strong>de</strong>ssa concepção hei<strong>de</strong>ggeriana <strong>de</strong> ser humano é a<br />
<strong>de</strong>sconstrução do sujeito mo<strong>de</strong>rno, concebido a partir <strong>de</strong> Descartes: uma interiori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
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