HIPERLEITURA
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Hiperleitura e escrileitura<br />
O suspense que o narrador constrói pela ausência de informações e<br />
pela recusa em cotejá-las não é apenas um corte folhetinesco, pois insere<br />
indeterminação também pela ambiguidade das personagens e dos fatos.<br />
O suspense, aí, não está no modo de leitura, em que o controle do leitor se<br />
resume a apressar a passagem para chegar ao desfecho, mas justamente na<br />
condição da participação, exigindo que o leitor responda às perguntas do<br />
texto, a partir de uma leitura intensiva. O nível de indeterminação alterna-se<br />
em camadas, possibilitando a leitura participativa desde os mais jovens até<br />
os adultos, de acordo com o repertório de cada leitor. O preenchimento é<br />
condicionado pelo conhecimento do receptor dos aspectos do texto, desde<br />
o mundo mágico dos contos de fadas até a relação com a mitologia e as<br />
referências a outros textos, por exemplo, e pelo seu interesse em formatar<br />
uma história significativa a partir do que ele é capaz de acrescentar e cotejar.<br />
As lacunas no texto Harry Potter predominam nos campos semântico<br />
e pragmático, conforme classificação de Iser LVII , que inclui ainda o campo<br />
sintático. Nesse último – relação entre os aspectos 59 do texto –, a ocorrência<br />
é mínima na série, já que a seleção e a combinação de palavras devem<br />
implicar um nível elevado de determinação na linguagem, para que seja<br />
coerente e lógica ao receptor infantil e juvenil. A indeterminação no nível<br />
sintático implicaria a reversão da sintaxe do texto, de uma simples frase<br />
(sujeito e predicado) até a estrutura textual ampla (relação entre os acontecimentos,<br />
temporalidade, início-meio-fim), podendo, ainda, promover,<br />
desde a ironia, até o absurdo. A elipse do sujeito, na frase, por exemplo, é<br />
uma forma de lacuna cujo nível de indeterminação permite a inferência do<br />
leitor infantil, capaz de buscar o termo a ser preenchido, como o exemplo<br />
da observação do narrador, “Como estava enganado”, que se refere ao Sr.<br />
Dursley, embora esteja no parágrafo seguinte, sem expressar o sujeito “ele”.<br />
Como todos os níveis – sintático, semântico e pragmático – estão<br />
interligados, também as lacunas nesses campos conectam-se, exigindo a<br />
59<br />
Essa é a minha interpretação da teoria. No texto, os aspectos esquematizados têm, sintaticamente,<br />
relação entre si, semanticamente, relação entre eles e o objeto a que representam, pragmaticamente,<br />
entre eles e a representação do leitor, aqui, já como um sentido amplo em relação<br />
ao texto – história.