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HIPERLEITURA

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162<br />

Hiperleitura e escrileitura<br />

ponto crucial fosse o fascínio que o burguês comum tem pela emblemática<br />

personalidade do (ex) philosopher naqueles anos finais do Antigo Regime,<br />

imagem histórica (e, portanto, posterior ao fato) talvez mais relacionada<br />

ao sentimento do próprio Darnton do que ao do leitor.<br />

Os pontos analisados pelo historiador satisfazem um olhar geral sobre<br />

a motivação do leitor Jean Ranson para responder ao texto de Rousseau<br />

e que, enfim, combinam com a própria conclusão de Darnton, em poucas<br />

palavras, sobre o fato de que Ranson era o receptor ideal do escritor francês.<br />

Rousseau declarava-se um leitor voraz que não distinguia entre literatura e<br />

realidade LIX , característica que começava a distinguir os praticantes de uma<br />

leitura extensiva, possível a partir da industrialização do livro. Além disso,<br />

o autor imprimia em suas personagens essa mesma característica, como<br />

afirma Darnton, vinculando sua forma de pensar a vida e a sociedade à ficção.<br />

O que podemos ressaltar daí é, pois, a intensa identificação que houve<br />

entre o que Rousseau expunha dos seus ideais e aqueles que possuía o jovem<br />

leitor francês, explicada também pelo fato de que, logo que constituiu família<br />

com sua prima, sobre quem refere “a feliz natureza dessa querida pessoa” LX ,<br />

passou a comprar muitas obras pedagógicas. A identificação entre o jovem<br />

leitor protestante 62 , sério e trabalhador, interessado na educação dos filhos<br />

– qualidades que Darnton impute a Ranson no início da análise – com o pensador<br />

da “religião civil” não estranha a ninguém e, certamente, explica o seu<br />

interesse em não apenas ler os textos de Rousseau, mas também em buscar<br />

informações sobre o autor em periódicos, como bem anota o historiador em<br />

sua análise. As cartas de Ranson, para Darnton, são emblemáticas:<br />

Mostram como o rousseauísmo penetrou no mundo cotidiano de<br />

um burguês nada excepcional e como o ajudou a entender as coisas<br />

que mais importavam na existência: amor, casamento, paternidade<br />

– os grandes eventos de uma pequena vida e o material de que a<br />

vida era feita em toda parte, na França. LXI<br />

62<br />

Rousseau teve de abjurar o protestantismo e estudar o catecismo quando jovem, assim como os<br />

pais de Jean Ranson tiveram de assinar uma confissão de catolicismo, muito comum à época, para<br />

dar aos filhos uma identidade civil, reconhecida pelo Estado.

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