15.01.2016 Views

HIPERLEITURA

WG5b2B

WG5b2B

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

98<br />

Hiperleitura e escrileitura<br />

e este se tornasse o informante que o conduz na continuidade da história.<br />

O narrador torna-se, assim, um par de olhos, enquanto o leitor é a mente,<br />

a quem cabe processar os esquemas do texto que só ele pode ler. O leitor<br />

sente-se tomado de um poder que ultrapassa o de qualquer personagem,<br />

pois só ele tem acesso aos esquemas da história que o tornam capaz de<br />

montar o todo. Da forma como o narrador conta a história, nem mesmo<br />

Dumbledore sabe o que Harry pensa. O leitor, enxergando pelos olhos de<br />

Harry, sente que ele, sim, observa as engrenagens do herói funcionando.<br />

A história terminada, o leitor já sabe que, como indicado pelo narrador<br />

no início da série, ele podia ter mesmo confiado em Dumbledore e, portanto,<br />

também em Severo Snape, como o próprio Diretor de Hogwarts pedia a<br />

Harry. No entanto, o narrador induzia-nos a ficar contra Snape, posicionando-nos<br />

ao lado de Harry e suas suspeitas. Desde o primeiro capítulo, o<br />

leitor é confrontado pela dubiedade da posição de Dumbledore em relação<br />

a Snape: confiar em Dumbledore parece significar o descrédito de Snape,<br />

mas o Diretor de Hogwarts instiga a confiança de Harry no mestre de<br />

Poções. E o leitor precisa acreditar no herói.<br />

O narrador reveste-se de imparcialidade, como se ele desconhecesse<br />

o desfecho e não exercesse qualquer reflexão sobre os acontecimentos<br />

narrados, mas os aspectos da história que ele seleciona para sua narrativa<br />

é uma forma de jogo, que conduz a determinado caminho de leitura. Dessa<br />

forma, o narrador induz o leitor a pensar que o controle é seu, e não dele, do<br />

desatento contador da história. O leitor considera a si mesmo como parte<br />

integrante do mistério, já que só ele é capaz de cotejar as informações que<br />

recebe e tecer admiráveis conclusões. O narrador, assim, leva ao leitor a<br />

sensação de que ele é capaz de captar o não dito nas entrelinhas e controlar<br />

os significados do texto, promovendo uma maior participação.<br />

O mistério fascina; como dizia Barthes, é a intermitência que seduz LIII .<br />

No entanto, aqui, não se trata do interstício da linguagem, “onde o vestuário<br />

se entreabre” LIV , mas de uma capa intencionalmente vestida e esvoaçante,<br />

um controle erigido pelo narrador através do fio da narrativa, com que ele<br />

brinca de desenrolar e suspender. O narrador é o caçador atrás da árvore,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!