HIPERLEITURA
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Hiperleitura e escrileitura<br />
de impressão – como o offset – que motivaram o crescimento do mercado<br />
editorial, mas justamente porque a instância da recepção, como autoridade<br />
no processo de significação, permitiu a elevação da voz do leitor. Além<br />
disso, a própria posição da Crítica, como instituição assegurada por teorias<br />
e métodos, movimentou a publicação de obras desse tipo.<br />
Temos, dessa forma, o exemplo de críticos e teóricos da literatura que<br />
publicaram obras em que suas histórias de leitura vêm à tona como mote e<br />
não apenas como instrumento auxiliar. Marisa Lajolo utilizou suas memórias<br />
de leitura para justificar Como e por que ler o romance brasileiro, a partir dos<br />
livros que habitavam a estante do quartinho dos fundos de sua infância:<br />
“Não incluo Inocência entre os melhores livros que li, mas foi ele que me<br />
ensinou a ler romances e a gostar deles: desconfiando primeiro, abrindo<br />
trilhas depois e, finalmente, me entregando à história” XLVIII .<br />
Harold Bloom também se posiciona, antes, como leitor, ao declarar, no<br />
prefácio de Como e por que ler, que os livros ali sugeridos por ele passaram<br />
todos por um diabinho que sussurrava “[eu] gosto” em seu ouvido, tal como<br />
contava Virgínia Woolf de suas escolhas. O cânone do crítico Bloom é ulterior,<br />
portanto, ao gosto do leitor Bloom. E se não há um percurso histórico<br />
de suas leituras, mas análises críticas, ainda assim são as leituras de Bloom<br />
as responsáveis por sua formação como crítico, evidenciadas mesmo nas<br />
ideias que ele tem sobre como e por que ler:<br />
Proponho uma fusão de Bacon, Johnson e Emerson, uma fórmula<br />
de leitura: encontrar algo que nos diga respeito, que possa ser utilizado<br />
como base para avaliar, refletir, que pareça ser fruto de uma<br />
natureza semelhante à nossa, e que seja livre da tirania do tempo. XLIX<br />
Se, para Bloom, a literatura é alteridade e satisfação pessoal, além de<br />
aliviar a solidão, Ítalo Calvino não se permitiu tal intimidade em seu Por<br />
que ler os clássicos, talvez justamente para interpor a distância necessária<br />
à validação do conceito clássico à sua extensa lista de indicações. No<br />
entanto, não é difícil encontrar o leitor Calvino sussurrando pela boca do<br />
crítico, mesmo que através de um pretenso “nós”, como ao sugerir que Três<br />
contos, de Flaubert, seja lido todo de uma vez, já que é possível fazê-lo em