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Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira

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MÉDICO - Sem comer o senhor morre.<br />

ZAMBOR - Comendo morro também.<br />

MÉDICO - Aí é outro problema.<br />

ZAMBOR - Nada disso. Existem dois tipos de fome hoje, doutor. A constitucional e a institu-<br />

cional. A constitucional é a do sujeito que passa fome porque não tem o que comer. A Institu-<br />

cional é a do sujeito que passa fome exatamente porque come.”<br />

<strong>Paulo</strong> <strong>Pontes</strong> usa a antiga anedota para reforçar o peso do regulamento contra a vontade<br />

humana. Eis a continuidade do diálogo acima transcrito:<br />

“MÉDICO - (RI) - O senhor tinha que ser de teatro mesmo...<br />

ZAMBOR - Isso é problema meu.<br />

MÉDICO - Aqui vai ter que comer.<br />

ZAMBOR - E se eu não quiser?<br />

MÉDICO - É do regulamento.”<br />

To<strong>das</strong> as proibições constam do regulamento. Isso fornece a <strong>Paulo</strong> <strong>Pontes</strong> o gancho ne-<br />

cessário para ele voltar com o tema que lhe é mais caro, do ponto de vista filosófico: raciocinar<br />

sobre o que é o homem, o homem e a vida, o homem e os regulamentos que proíbem a vida, em<br />

mais um desenvolvimento do tema já contido em Rodízio.<br />

“ZAMBOR - Não pode, não pode, não pode, não pode... Posso! Posso o que eu quiser Dr. Es-<br />

tranguilove... (PARA A PLATÉIA) - Vocês sabem o que é um homem? O que é que vocês co-<br />

nhecem de um homem? Nada mais do que aprenderam de anatomia nas suas faculdades. Um<br />

homem é muito mais do que a sua anatomia. Você vai abrir o cadáver de todos os homens que<br />

já nasceram, examinar cada membrana, e não vai descobrir o que é um homem. Me mostre aí na<br />

sua anatomia onde fica o nervo do ódio. Não, não... Eu sei que você vai mostrar um pedaço da<br />

parte antero-posterior do cérebro que gera e transmite o ódio pras vísceras. Mas essa chuva de<br />

articulações, que vai do córtex às vísceras é feita com a corda de que não sei que violino que só<br />

o homem é que tem; e se você experimentar reconstruir uma réplica desse instrumento... Se<br />

quiser, vamos valer... Ele não vai sentir ódio nenhum. Assim era muito fácil... Você pega um<br />

homem... esse troço que extrai de si um mistério a cada segundo, só para no minuto seguinte<br />

sentir o prazer de uma nova revelação... E diz pra ele: “Não pode”... Não pode nada. Não pisa

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