Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira
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é o que nos parece importante, pela permanência da cena aberta. A luta era pela existência do<br />
teatro e contra a sua destruição, contra a sua morte, uma vez que estava o teatro totalmente cer-<br />
cado pela ditadura e pela pressão econômica, que, aliás (não mencionada por Tânia Brandão),<br />
foi o que conseguiu destruir a experiência do Arena, do Oficina e do Opinião, os três grupos<br />
mais importantes da década de 60. Para só ficarmos em alguns poucos exemplos, vale a pena<br />
lembrar que Augusto Boal, líder do Arena, teve que se exilar do país, depois de preso e tortura-<br />
do; José Celso Martínez Correa, líder do Oficina, teve que se exilar do país e o Opinião, entre<br />
outros problemas, não suportou a pressão econômica e houve, então, uma ruptura no seu elen-<br />
co, inclusive com o exílio de Ferreira Gullar. São apenas alguns poucos exemplos da pressão<br />
com a qual o regime ditatorial fechava o cerco contra o teatro. A luta travada era pela sobrevi-<br />
vência do artista no seu lugar de trabalho: o palco. E, para isso, era preciso estabelecer alianças.<br />
A luta pela “palavra” significava solidariedade com o público pelo momento difícil que todos<br />
atravessavam, e não seria agredindo o público que se conseguiria a necessária solidariedade,<br />
mesmo porque, um espectador agredido é um espectador a menos no teatro. É sabido também<br />
que o “Teatro Agressivo”, o teatro supostamente influenciado pelas vanguar<strong>das</strong> internacionais,<br />
era agressivo com o público, e não com as forças opressivas da sociedade. Era lutando contra<br />
um comportamento que dividia o teatro, afastava o público e enfraquecia a resistência contra a<br />
opressão, que <strong>Paulo</strong> <strong>Pontes</strong> e tantos outros se debatiam.<br />
Foi pensando nisso que ele falou a Márcia Guimarães: “A nossa história parece que se<br />
dá aos saltos. Parece que a gente não tem memória. É difícil a gente ver em desenvolvimento,<br />
por exemplo, a história do teatro brasileiro. E por quê? Porque em consequência dessa depen-<br />
dência cultural, aparecem sempre fenômenos de fora, exógenos, que perturbam, que fincam<br />
uma cunha, que seccionam um momento do outro. E o processo nunca se faz, nunca se comple-<br />
ta. Então, são raros os momentos que a gente tinha realmente condição de ver um século de<br />
vida brasileira /.../ É preciso aprender a perceber em cada instante da história, aquilo que ela<br />
tem de permanente. Aprender a ver o passado de uma forma histórica. Aprender a tirar do pas-<br />
sado aquilo que ele pode dar. Aprender a fazer com que o passado se contente no presente. A<br />
história não é um constante nascer do nada. É desenvolvimento. É acrescentar alguma coisa ao<br />
que já foi feito. É assim que o processo se desenrola e se enriquece. Se você estiver permanen-<br />
temente derrubando o passado e inventando o novo, você não está fazendo história. Está fazen-<br />
do um jogo de quebra-cabeças. Então, porque não tivemos direito à nossa história, de repente,<br />
não tivemos meio de evitar que o nosso teatro se desligasse de seu povo” 62 .<br />
62 GUIMARÃES, Márcia. “Em vez do banquete, a “Gota D'água”. In jornal Última Hora. Rio de Janeiro, 28.11.76.