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Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira

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a um mínimo de cumprimento do dever, como é para o bem da República e para a tranquilidade<br />

do povo brasileiro?” 53 . A linha dura do Exército reclamava punições contra o deputado. Mas, na<br />

verdade, o discurso candente e emocionado do deputado Márcio Moreira Alves estava mergu-<br />

lhado na mais pura realidade, na mais monótona rotina de tensão e medo que acompanhou a<br />

vida do país naqueles meses.<br />

Esse ano - 1968 - marcou a crise onde se evidenciava a falência do Estado e de to<strong>das</strong> as<br />

teorias salvacionistas. As velhas regras de comportamento não importavam mais e, como con-<br />

sequência, diante da recusa do mundo (ou <strong>das</strong> forças políticas permanecerem obstina<strong>das</strong> em seu<br />

medo de mudanças), a juventude procurou uma nova forma de libertar o imaginário: as viagens.<br />

Em gotas de ácido ou pelas estra<strong>das</strong>; com os cabelos longos e desalinhados como estatuto de<br />

uma nova tribo; seu corpo como dádiva primeira e última da liberdade, altar de todos os praze-<br />

res e fonte de todos os desejos, a juventude encontrou no psicodelismo a forma alternativa com<br />

a qual se poderia lutar contra as ditaduras políticas, contra o acomodamento burguês às regras<br />

do jogo social, e contra também o american way of life, o sistema de vida americano. Contra a<br />

caretice, somente éter na mente. Acreditavam nas flores vencendo canhões.<br />

Claro que esse comportamento psicodélico não era regra geral na juventude. No Brasil,<br />

por exemplo, existiam dois tipos de jovens: o hippie, tido como alienado, e o engajado na luta<br />

política. A propósito, vem-nos à lembrança a peça do Vianinha, Rasga Coração, cujo painel da<br />

vida brasileira mostra, no fim de tudo, aqueles dois jovens em pólos opostos.<br />

A Linguagem artística, de comum acordo com as mudanças de comportamento, também<br />

passou a exprimir-se de uma forma pouco racional, onde a experiência estética adquiriu valor<br />

em si, e não mais uma forma programática de intervir no mundo. Não foi à toa que Caetano<br />

Veloso fora pesadamente vaiado quando cantava, refletindo os anseios da rebeldia de 1968, “É<br />

proibido proibir”, pelo público de Geraldo Vandré, aquele de “Pra não dizer que não falei <strong>das</strong><br />

flores”.<br />

A postura sintonizada com a rebeldia pertencia à arte de vanguarda. A sintonizada com a<br />

resistência pertencia aos já conhecidos artistas engajados.<br />

lores.<br />

Entre um e outro grupo pairava, na sociedade e no campo da arte, profunda crise de va-<br />

53 Apud Hélio Silva, op. cit. p. 437.

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