Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira
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NELSINHO - Bebe mais, Raimundão. (NELSINHO ENCHE OUTRO COPO) Vamos de novo<br />
que o calor está demais.”<br />
Assim Raimundão vai bebendo sucessivos copos de cerveja, até não suportar mais. Ain-<br />
da assim, Nelsinho obriga-o a beber um último copo.<br />
Esta sequencia inicial tem uma dupla finalidade: apresentar Nelsinho e a sua vontade<br />
implacável, como também o seu poder sobre a área. Raimundão foi levado à sua presença por-<br />
que cobrou aluguel em barraco de favela, coisa que só Nelsinho se permite fazer. Nelsinho po-<br />
deria, se quisesse, matá-lo. Mas como aquele era o dia de Omulu, seu protetor, ele o perdoaria<br />
desta vez. Para reforçar o poder de vida e morte de Nelsinho, em outra sequência mais adiante,<br />
aparece uma outra personagem satélite, de nome Sujeito:<br />
“NELSINHO - Então, você vende os “pacáu” e queria ficar com o dinheiro só pra você.<br />
SUJEITO – É freguesia minha que eu arrumei sozinho.<br />
NELSINHO - Essa zona é minha. Pra tudo. Quem te arranja proteção pra vender erva sou eu.<br />
Quem arranja advogado sou eu. Já é mais de meia-noite. Não é mais dia de Santo Lázaro, meu<br />
protetor. Pode matar ele.”<br />
Apresentada a personagem e a sua vontade poderosa, na continuidade da sequência do<br />
Raimundão (alternada por cortes que mostram a mãe de Terezinha em casa, preocupada com a<br />
demora da filha, detida em casa de Nelsinho), é posto em foco o conflito representado pela fra-<br />
gilidade de uma moça diante do desejo do bandido:<br />
“NELSINHO - Eu escolhi você Terezinha. Já te disse. Você é a menina mais bonita que tem<br />
por essa zona. Vou casar com você. Olha seu vestido de casamento... Enxoval... Olha essa toa-<br />
lha felpuda. Tudo pra você. Essa casa é tua! Quero ter um filho teu. Pra quando eu morrer con-<br />
tinuar a ser dono da zona inteira.<br />
TEREZINHA - Não quero, não quero, sou noiva, eu...<br />
NELSINHO - Não quer? Não quer essa riqueza toda? Prefere continuar vivendo em barraco?<br />
Olha aí. Tenho dois ventiladores. Colchão de mola. Jóia. O banheiro tem bidê. Olha lá!<br />
TEREZINHA - Não quero. Me deixa em paz, por favor.<br />
NELSINHO - Juro, não vai ter nenhuma outra mulher dentro dessa casa. Só você, Terezinha.<br />
TEREZINHA - Me trouxeram à força aqui, quero ir embora (TENTA SAIR. NELSINHO A<br />
SEGURA FORTE).