Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira
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gangsters que habitam o mundo da noite e, pela sua própria condição de outsiders, transgridem<br />
o mundo do homem civilizado, isto é, o homem regulamentado, burocratizado, que obedece aos<br />
agentes, aos editais de interdição e não ousa matar ou roubar como os bandidos que obedecem à<br />
sua própria violência. Aquele mundo da transgressão é o que exerce fascínio sobre o homem<br />
comum. Por isso se faz tão presente no imaginário do nosso tempo. Além disso, diz Edgar Mo-<br />
rin, “a gang exerce uma fascinação particular, porque responde a estruturas afetivas elementares<br />
do espírito humano: baseia-se na participação comunitária do grupo, na solidariedade coletiva,<br />
na fidelidade pessoal, na agressividade em relação a tudo que é estrangeiro, na vindita, para a<br />
realização dos instintos predadores e depredadores” 86 .<br />
A gang, ou pelo menos o crime organizado, está presente nas obras vistas, desde a pri-<br />
meira, Sem Saída, ou A Testemunha, A Vida Por Um Fio, Uma Noite de Terror.<br />
venção.<br />
Em Sem Saída, o crime está organizado na figura do seu líder, Nelsinho, o bicheiro.<br />
Em A Testemunha é o bandido <strong>Paulo</strong> Mãozinha, rei da Baixada, quem lidera a contra-<br />
Em Uma Noite de Terror é o Miguelão. A estrutura do crime organizado é revelada pela<br />
estenografa Edite.<br />
A Vida Por Um Fio já não apresenta nenhum líder de gang, mas, em compensação, mos-<br />
tra como homens fazem da morte a sua mercadoria, ao apresentar dois assassinos profissionais<br />
cuja técnica de matar, pelo que comentam ao telefone, é impecável.<br />
Nesse sentido, A Vida Por Um Fio tem alguma semelhança com o texto O Justiceiro. A<br />
diferença está em O Justiceiro apresentar outro tipo de assassino, mas não do tipo qualquer, e<br />
sim uma espécie de herói, cheio de bom-mocismo e de senso de justiça que transcende a lei<br />
ordinária. Não esquecer que Estrela, o Justiceiro, não é um pistoleiro que mata na surpresa da<br />
tocaia, sem chance para o adversário. Ele provoca o adversário. Lembrar também que o Juiz, o<br />
oponente a qual o Justiceiro deveria matar, morreu não de bala, mas de susto, uma morte espe-<br />
tacularmente épica. Também este tipo de outsider está prevista no código da cultura de massas<br />
que os nossos autores manejavam tão bem. Sobre essa personagem, fala Edgar Morin: “O herói<br />
do Western é o Zorro, o justiceiro que age contra uma falsa lei corrupta, e prepara a verdadeira<br />
lei, ou o xerife que, soberano, instaura, de revólver em punho, a lei que assegurar a liberdade.<br />
Essa ambiguidade opera uma verdadeira síntese entre o tema da lei e o tema da liberdade aven-<br />
turosa. Ela resolve existencialmente o grande conflito entre o homem e o interdito, o indivíduo<br />
86 MORIN, Edgar. Cultura de Massas no Século XX/1. Rio de Janeiro, Forense-Universitária: 1987, p. 112.