Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira
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de povo,/ seu coração até aqui de mágoa/ E povo não é o que o senhor diz, não/ Ceda um pou-<br />
co, qualquer desatenção,/ faça não, pode ser a gota d'água.<br />
CREONTE - Muito bem. É com esse capital,/ seu Jasão, que você quer ser meu sócio?<br />
JASÃO - Não fique pensando que o povo é nada,/ carneiro, boiada, débil mental,/.../ Não. Tem<br />
que produzir uma esperança/.../ Chegou a hora de regar um pouco/ Ele já não lhe deu tanto? Em<br />
ações, prédios, garagens, carros, caminhões,/ até usinas, negócios de louco.../ Pois então? Preci-<br />
sa saber dosar os limites exatos da energia/ Porque sem amanhã, sem alegria,/ um dia a pimen-<br />
teira vai secar/ Em vez de defrontar Egeu no peito,/ baixe os lucros um pouco e vá com jeito/.../<br />
Com os seus ganhos, o senhor é que tem/ que separar uma parte e fazer/ melhorias/.../ Encha a<br />
fachada de pastilhas/ que eles já acham bom. /.../ Ao terminar,/ reúna com todos, sem exceção/<br />
e diga: ninguém tem mais prestação atrasada. /.../ Está com medo de mestre Egeu? /.../ Egeu vai<br />
ficar falando sozinho/ enquanto o povo está jogando bola! /.../ O senhor vai tomando/ essas<br />
providências que reacende a chama. Vai ver que o trabalho rende/ mais, daí eles ganham confi-<br />
ança,/ alimentam uma nova esperança,/ o moral se eleva, a tensão relaxa.../ Aí é que o senhor<br />
aumenta a taxa/ Com as melhorias eles vão ter/ energia bastante pra mais dez anos. /.../ Agora,<br />
se quiser ver, por acaso,/ quem ganhou nesta simples transação/ é só contar. Eles lhe dão dez<br />
anos,/ o senhor dá um só pelos meus planos.../ Fica com nove, a parte do leão” (p. 102 e ss).<br />
Creonte, sozinho, reconhece que Jasão está certo:<br />
“CREONTE - Você veja como é o mundo/ Me aparece esse vagabundo/ cantando sambinha,<br />
jeitoso,/ falando macio, sestroso/ E eu cá pensando: hum, é sambista?/ Não passa dum bom vi-<br />
garista/ Um oportunista, arrivista,/ isto é, um fresco metido a artista,/ sem perspectiva, sem vi-<br />
são/.../ Mas não é que esse disfarçado/ sabe onde tem o seu nariz?” (p. 107).<br />
M) No outro núcleo do conflito, Egeu, ao falar com Joana, soma à sua dor a dos outros<br />
moradores da Vila:<br />
“EGEU - A gente só avança quando é mais forte/ do que o nosso inimigo. A sua sorte é ligada à<br />
sorte de todo mundo/ na Vila. /.../ Então, cada passo tem que ser dado/ por todos. Se você avan-<br />
çar só,/ Creonte te esmaga sem dor nem dó/ Compreendeu, comadre Joana?” (p. 111).<br />
N) Joana, que começara pela primeira ação (a amante abandonada), projeta a sua trajetó-<br />
ria para a segunda ação (o conflito ideológico), reunindo em si todo o peso <strong>das</strong> tramas quando