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Paulo Pontes, A Arte das Coisas Sabidas - Paulo Vieira

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to com o país. Não tínhamos uma proposta efetiva para o país dos anos 60. Isso ficou muito<br />

claro" 29 .<br />

Mas o pior não fora o fato de descobrirem, na última hora, a sua impotência diante do<br />

poder <strong>das</strong> armas. O pior, talvez, foi descobrir que o povo aplaudia o golpe, que a cidade do Rio<br />

de Janeiro virara uma festa; fora perceber que o golpe assumira o papel de "Redentora" no ima-<br />

ginário popular. O golpe, afinal, viria para livrar o povo da ameaça cruel dos comunistas, os que<br />

bebiam o sangue <strong>das</strong> criancinhas. Passemos a palavra outra vez ao sociólogo Luís Werneck<br />

Vianna: "/.../ Chego à UNE (no dia seguinte, 1º de abril). Já muito pouca gente. A UNE vaiada<br />

pelas pessoas do prédio ao lado. As pessoas jogavam coisas, vaiavam. E todo esse sentimento<br />

nosso ainda se complicava porque fomos percebendo que havia clima de festa, como se a cida-<br />

de tivesse sido libertada de um domínio, uma coisa assim que fez com que a nossa impotência,<br />

a nossa sensação de não compreensão <strong>das</strong> coisas ainda fosse agravada pelo isolamento político<br />

e moral, que nós víamos que estávamos levantando" 30 .<br />

Só para completar esta imagem de desolação, vamos pedir o reforço do ator Carlos Ve-<br />

reza, ex-membro do CPC: "Aos poucos foram chegando carros e mais carros em frente a UNE<br />

com rapazes da então classe média da época, bronzeados, comendo cachorro-quente com coca-<br />

cola e dizendo que os comunistas haviam sido derrotados, que o Jango já havia fugido /.../ E<br />

nós não sabíamos, ainda, que o movimento militar já era naquele momento vitorioso" 31 .<br />

Não houve resistência ao golpe. Em todo o país, o que aconteceu foi a entrega do poder<br />

aos militares, o alívio do povo que via nas idéias esquerdizantes um martírio. O grande erro <strong>das</strong><br />

esquer<strong>das</strong>, parece-nos, fora o de acreditar que o povo está sempre ao lado da liberdade, da justi-<br />

ça e da verdade, como se esses termos não remetessem a conceitos extremamente subjetivos,<br />

longe da compreensão do homem comum.<br />

O fato estava consumado. O projeto esquerdizante, naquele momento, derrubado. Res-<br />

tava, então, a saída estratégica. Carlos Vereza: "Saímos pelos fundos da UNE, e uma imagem<br />

muito forte ficou na minha cabeça. Nós saímos pelo quintal, que era ladeado por dois prédios e<br />

dos dois lados pessoas gritavam. Enquanto um deles dizia: foge que eu quero ver, comunista;<br />

do outro lado diziam: não foge não, menino, nós estamos do lado de vocês /.../ E nós, enquanto<br />

29 Idem, ibidem, p. 166.<br />

30 Idem, ibidem, p. 170.<br />

31 Apud Deocélia Vianna. Op. cit. p. 171.

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