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meios de comunicação colaboraram <strong>na</strong> mudança da estrutura das famílias <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s<br />

Marques.<br />

Os relacio<strong>na</strong>mentos entre os m<strong>em</strong>bros da família também modificaram, as<br />

relações entre mari<strong>do</strong> e mulher e, principalmente, entre pai e filhos, segun<strong>do</strong><br />

depoimentos, foram as mais significativas. No passa<strong>do</strong> o relacio<strong>na</strong>mento entre pais e<br />

filhos era regi<strong>do</strong> pelo autoritarismo paterno <strong>em</strong> que as ordens vinham <strong>do</strong> pai e o silêncio<br />

<strong>do</strong>s filhos, s<strong>em</strong> nenhum gesto de carinho.<br />

O carinho era meio pouco <strong>na</strong>quela época, porque era uma turma grande, se vai<br />

dar carinho pra um os outros iam ficar com ciúme. (...) Era mais reto! E as<br />

crianças eram meio arteiras, se fosse duas casas a passear se juntava <strong>em</strong> vez de<br />

oito era dezesseis e aí já complicava, tinha que trazer meio reto! (...) A gente não<br />

sentava [no colo], a gente tinha vergonha <strong>do</strong> pai. (...) A gente tinha muito<br />

respeito, então a gente não se animava a abraçar o pai. Eu fui abraçar meu pai<br />

depois de grande, custei a abraçar o pai! A gente tinha aquele respeito, a gente<br />

não sabia se ele estava de boa com a gente! Era geral, <strong>aqui</strong> <strong>na</strong> zo<strong>na</strong> era tu<strong>do</strong> mais<br />

ou menos assim. 275<br />

A agricultora descreve o relacio<strong>na</strong>mento entre pai e filhos. Os gestos de<br />

afetividade, como expressa<strong>do</strong>s hoje (com contatos físicos), eram quase inexistentes,<br />

tratavam os filhos com autoritarismos, tratamento justifica<strong>do</strong> pelo número de filhos e<br />

pela própria falta de merecimento – eram arteiros. Os pais também receberam o mesmo<br />

tratamento, reflexo <strong>do</strong> contato com as pessoas (relações mediadas pela desconfiança), e<br />

com a terra e os animais (mediadas pela força). O desconhecimento de outras formas de<br />

tratamento entre pessoas perpetuou essa relação que pouco expressava sentimentos de<br />

afeto, amor e carinho. 276 A expressão desses sentimentos de uma forma exteriorizada e<br />

expansiva poderia, <strong>na</strong> cultura gaúcha, significar si<strong>na</strong>l de fraqueza, algo não associa<strong>do</strong> à<br />

figura imaginária <strong>do</strong> gaúcho macho.<br />

Outra questão que observamos no depoimento da agricultora diz respeito ao<br />

relacio<strong>na</strong>mento entre pai e filha, o pu<strong>do</strong>r, a vergonha <strong>em</strong> sentar <strong>na</strong> colo <strong>do</strong> pai. Esse<br />

constrangimento pode ser reflexo da educação e <strong>do</strong> tratamento da<strong>do</strong>s pelos pais, mas<br />

também pode vir, de certo mo<strong>do</strong>, das marcas da infância. Como descrito anteriormente,<br />

as casas mais simples eram compostas de uma ou duas peças, a cozinha e o <strong>do</strong>rmitório,<br />

neste último a família <strong>do</strong>rmia unida, permitin<strong>do</strong> a observação, <strong>do</strong>s filhos mais curiosos,<br />

<strong>do</strong>s momentos de intimidade <strong>do</strong>s pais, que também poderiam ser presencia<strong>do</strong>s <strong>na</strong>s<br />

lavouras ou roças. 277<br />

Hoje a relação entre pai e filho mu<strong>do</strong>u, a ex<strong>em</strong>plo <strong>do</strong> descrito pela senhora<br />

Maria<strong>na</strong> (54 anos): “Hoje está muito melhor para os filhos! (...) A gente t<strong>em</strong> mais<br />

liberdade uns com os outros, a gente conversa, se está b<strong>em</strong> se está mal, de primeiro a<br />

criança não tinha como conversar. A criança n<strong>em</strong> conversava!” 278 O senhor Otávio (65<br />

275<br />

Maria<strong>na</strong>, 54 anos – agricultora no Rincão <strong>do</strong>s Marques. Observamos no discurso da agricultora a<br />

utilização da palavra meio (duas vezes) e <strong>do</strong> termo mais ou menos. O meio arteiras pode significar que<br />

exerciam liberdades e autonomias que tencio<strong>na</strong>vam as fronteiras <strong>do</strong>s comportamentos estabeleci<strong>do</strong>s pelos<br />

pais. O meio reto significa, por parte <strong>do</strong> pai, um comportamento entre rigidez e compreensão. Entretanto,<br />

lucubran<strong>do</strong> sobre essas palavras (meio e mais ou menos) e o mo<strong>do</strong> de expressar das pessoas da localidade,<br />

poderíamos dizer que identifica, de certa forma, situação de acomodação ou resig<strong>na</strong>ção. Palavras, da<br />

forma <strong>aqui</strong> utilizadas, que pod<strong>em</strong> indicar um esta<strong>do</strong> estático, não é mais n<strong>em</strong> menos, não vai n<strong>em</strong> para um<br />

la<strong>do</strong> n<strong>em</strong> para o outro, fica onde está.<br />

276<br />

Também pode-se interpretar como: o não reconhecimento como comportamentos retos e expressão de<br />

retidão de caráter.<br />

277<br />

Ver Woortmann e Woortmann (1997, p. 138-140).<br />

278<br />

A agricultora, além de responder sobre a relação entre filhos e pai, refere-se ao relacio<strong>na</strong>mento mari<strong>do</strong><br />

e mulher, deixan<strong>do</strong> transparecer que a autoridade <strong>do</strong> chefe de família restringia a liberdade de expressão<br />

tanto <strong>do</strong>s filhos como da mulher.<br />

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