06.05.2013 Views

Faça aqui o download do texto na integra em pdf.

Faça aqui o download do texto na integra em pdf.

Faça aqui o download do texto na integra em pdf.

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

impostas pela sociedade, produzin<strong>do</strong> comportamentos hostis como reação aos<br />

constrangimentos. As pessoas <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia tinham comportamento arredio com<br />

estranhos, resistiam à aproximação <strong>na</strong> relação para evitar reações precipitadas, pelo<br />

motivo de não se sentir<strong>em</strong> seguros <strong>em</strong> contra argumentar a estigmatização. No decorrer<br />

<strong>do</strong>s anos e a aproximação com outras realidades sociais, as pessoas <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia<br />

foram adquirin<strong>do</strong> conhecimento e confiança para reagir de forma civilizada contra as<br />

provocações, como observa<strong>do</strong> no relato <strong>do</strong> senhor Manoel (57 anos):<br />

Um dia fui leva a minha filha <strong>em</strong> Canguçu e tinha um al<strong>em</strong>ão que perguntou a<br />

onde eu morava e eu respondi: lá no Rincão; e ele respondeu: lá <strong>do</strong> pulgue<strong>do</strong>.<br />

Mas olha, <strong>aqui</strong>lo ferveu, ferveu e ai eu disse: será que tu não t<strong>em</strong> educação, isso<br />

não é coisa que tu diga. Aquilo ali mu<strong>do</strong>u muito, não é mais como muita gente<br />

pensa. Aí o al<strong>em</strong>ão me pediu desculpa.<br />

As reações aos estigmas, antigamente, eram menos civilizadas, o pouco<br />

conhecimento e o sentimento de inferioridade não deixavam outra alter<strong>na</strong>tiva de contraatacar<br />

as provocações. O estreitamento <strong>na</strong>s relações com outros grupos sociais e a<br />

aproximação com a religião e a educação formal foram transforman<strong>do</strong> a auto-imag<strong>em</strong><br />

das pessoas <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia, melhoran<strong>do</strong> a auto-estima e incorporan<strong>do</strong><br />

autoconfiança como pessoas que dispunham de condições para reverter a situação de<br />

forma polida. A estratégia foi de contra-estigmatizar, referin<strong>do</strong>-se aos opositores como<br />

mal-educa<strong>do</strong>s, inescrupulosos, etc., alia<strong>do</strong> à devolução <strong>do</strong> estigma, a sociedade <strong>do</strong><br />

Rincão <strong>do</strong>s Maia começou a trabalhar com o objetivo de apresentar, ou talvez de<br />

representar, uma outra concepção da sua própria imag<strong>em</strong>, como uma sociedade<br />

<strong>integra</strong>da e desenvolvida – civilizada. 516<br />

Seguin<strong>do</strong> a linha argumentativa de Elias (1995), a posição de “outsider” também<br />

t<strong>em</strong> presentes fortes sentimentos positivos, como, por ex<strong>em</strong>plo, o reconhecimento <strong>do</strong><br />

seu valor, mais precisamente pelos que imputam a condição de inferioridade; quer ser<br />

visto e trata<strong>do</strong> como pessoa de igual valor, por suas realizações. Para Elias (1995, p.<br />

39), muitas vezes, o maior desejo <strong>do</strong>s “outsiders” é ser<strong>em</strong> reconheci<strong>do</strong>s como iguais por<br />

aqueles que os tratam abertamente como inferiores. “A curiosa fixação <strong>do</strong>s desejos <strong>do</strong>s<br />

outsiders pelo reconhecimento e aceitação <strong>do</strong> establishment faz com que tal objetivo se<br />

transforme no foco de to<strong>do</strong>s os seus atos e desejos, sua fonte de significa<strong>do</strong>.” O valor <strong>do</strong><br />

reconhecimento pelos “establishment” pode representar aos “outsiders” a maior<br />

conquista, nenhuma outra estima ou sucesso teriam tamanho significa<strong>do</strong>. Os<br />

depoimentos das pessoas <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia d<strong>em</strong>onstram, às vezes, uma certa fixação,<br />

preocupação, com a opinião <strong>do</strong>s <strong>integra</strong>ntes das sociedades urba<strong>na</strong> e rural <strong>do</strong> município,<br />

como se observa <strong>na</strong>s falas <strong>do</strong> senhor Eduar<strong>do</strong> e <strong>do</strong> senhor Daniel (54 anos),<br />

respectivamente: “Falam mal <strong>do</strong> Rincão só porque era pobre, hoje eles vê como Rincão<br />

<strong>do</strong>s Maia cresceu!”; 517 “Então v<strong>em</strong> gente de outras localidades, então eu tenho que fazer<br />

bonito lá para depois receber bonito <strong>aqui</strong>.”<br />

O processo de desenvolvimento da sociedade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia foi constituí<strong>do</strong><br />

pela <strong>integra</strong>ção, ou conjunção, de diferentes agentes, ou acontecimentos, que<br />

produziram transformações, à primeira vista, perceptíveis (materiais) e imperceptíveis<br />

(subjetivas). Nos dedicamos, ao longo deste capítulo, a apresentar alguns reflexos <strong>do</strong><br />

processo de desenvolvimento sobre aspectos materiais, mas nos debruçamos,<br />

principalmente, sobre as transformações <strong>na</strong> estrutura de perso<strong>na</strong>lidade da sociedade<br />

local. Neste aspecto, a autovalorização das pessoas representa uma das mais<br />

significativas mudanças no que diz respeito à questão psicológica, repercutin<strong>do</strong> <strong>em</strong><br />

outras áreas da vida cotidia<strong>na</strong> dessa sociedade. O sentimento de auto-estima e<br />

516 Sobre contra-estigmatização, ver Elias e Scotson (2000).<br />

517 Comerciante e agricultor no Rincão <strong>do</strong>s Maia.<br />

195

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!