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O posicio<strong>na</strong>mento frente ao entrevista<strong>do</strong>r, a forma de sentar, os gestos, o<br />
comportamento servil, denunciavam o sentimento de inferioridade, a baixa auto-estima,<br />
observa<strong>do</strong> mais claramente <strong>na</strong>s famílias <strong>em</strong> condições precárias. Nessas famílias os<br />
entrevista<strong>do</strong>s concentravam-se quase s<strong>em</strong>pre num la<strong>do</strong> da peça da casa (cozinha ou<br />
sala), num canto de mesa, <strong>em</strong> posição defensiva; sentavam-se encolhi<strong>do</strong>s e tensos,<br />
gesticulavam menos, e nos primeiros momentos eram tími<strong>do</strong>s e deixavam-nos escolher<br />
o local para sentar. Comportamentos que representavam, relativamente, falta de<br />
confiança nos outros. Nas outras famílias, <strong>em</strong> condições melhores, o posicio<strong>na</strong>mento<br />
era mais <strong>na</strong>tural, por vezes <strong>em</strong> s<strong>em</strong>icírculo, parecen<strong>do</strong> menos calcula<strong>do</strong>, sentavam-se<br />
descontraí<strong>do</strong>s, os gestos com os braços e as mãos eram mais intensos, e, ao entrar <strong>na</strong><br />
casa, logo indicavam o lugar para o entrevista<strong>do</strong>r sentar – eram determi<strong>na</strong><strong>do</strong>s.<br />
Holanda (1995), ao tratar <strong>do</strong> hom<strong>em</strong> cordial, l<strong>em</strong>bra <strong>do</strong> uso acentua<strong>do</strong>, pelos<br />
brasileiros, <strong>do</strong>s diminutivos, salientan<strong>do</strong> o <strong>em</strong>prego da termi<strong>na</strong>ção “inho” para<br />
aproximar, familiarizar, mais com as pessoas ou os objetos, de algum mo<strong>do</strong> dan<strong>do</strong>-lhes<br />
relevo. No Rincão <strong>do</strong>s Marques, observamos o uso <strong>do</strong>s diminutivos nos diálogos, a<br />
utilização tanto da termi<strong>na</strong>ção “inho” como da “ito”, está última influência da língua<br />
espanhola, ora referin<strong>do</strong>-se ao rebanho bovino como gadinho ora como gadito. 339 No<br />
caso estuda<strong>do</strong>, o uso <strong>do</strong> diminutivo era mais freqüente <strong>na</strong>s famílias que dispunham de<br />
menor patrimônio e comportamento mais humilde, <strong>em</strong> condições de vida precária.<br />
Durante as entrevistas, a utilização <strong>do</strong> diminutivo estava relacio<strong>na</strong>da à questão da<br />
subsistência da família, por ex<strong>em</strong>plo, “uma lavourinha de feijão pro gasto” ou “planto<br />
um feijãozinho pro gasto”, transparecen<strong>do</strong> que o entrevista<strong>do</strong> tentava destacar a sua<br />
condição social e fragilidade. Este destacar menos no senti<strong>do</strong> intencio<strong>na</strong>l e mais no<br />
senti<strong>do</strong> instintivo, espontâneo. Outra observação, talvez exagero de nossa parte, o uso<br />
<strong>do</strong>s diminutivos era mais freqüente <strong>na</strong>s conversas informais (ao desligar o grava<strong>do</strong>r) e<br />
no fi<strong>na</strong>l de tarde quan<strong>do</strong> a ilumi<strong>na</strong>ção solar perde intensidade. 340 No início da pesquisa<br />
tínhamos o conhecimento <strong>do</strong> uso <strong>do</strong>s diminutivos, mas estávamos atentos à questão da<br />
herança espanhola no vocabulário da sociedade, aos poucos perceb<strong>em</strong>os que a<br />
intensidade <strong>na</strong> utilização deles dava-se justamente <strong>na</strong>s últimas entrevistas <strong>do</strong> dia,<br />
pensamos que poderia ser a nossa intervenção que provocava tal comportamento por<br />
parte <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s. Reduzimos nossa intervenção (diminuin<strong>do</strong> o número de<br />
questio<strong>na</strong>mentos e o tamanho das frases, excluin<strong>do</strong> o uso de diminutivos), mas<br />
continuávamos a observar o <strong>em</strong>prego <strong>do</strong> diminutivo. 341 Na manhã subseqüente, íamos<br />
para a primeira entrevista <strong>do</strong> dia com esta questão <strong>na</strong> mente, e, por duas vezes,<br />
escolh<strong>em</strong>os famílias com características próximas às últimas entrevistadas nos dias<br />
anteriores, constatamos que utilizavam o diminutivo, mas <strong>em</strong> menor intensidade e <strong>na</strong><br />
maioria <strong>do</strong>s casos relacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s à questão produtiva (tamanho da lavoura e <strong>do</strong> rebanho;<br />
quantidades produzidas).<br />
A análise desta questão leva a algumas interpretações relacio<strong>na</strong>das a autoestima.<br />
O uso <strong>do</strong>s diminutivos ajuda a aproximarmo-nos <strong>do</strong>s objetos, familiarizarmonos,<br />
tal como Holanda (1995) observou, mas também pode levar a outras reflexões. Nos<br />
pareceu que a aplicação <strong>do</strong>s diminutivos pelas pessoas não era um mero vício de<br />
339 Sobre a influência espanhola no linguajar <strong>do</strong> gaúcho brasileiro, ver Laytano (1981, p. 49-50).<br />
340 Após o término <strong>do</strong> depoimento formal (grava<strong>do</strong>), saíamos a conhecer um pouco <strong>do</strong> estabelecimento, as<br />
lavouras, os animais, era nesses momentos que a tensão entrevista<strong>do</strong>r-entrevista<strong>do</strong> diminuía e o diálogo<br />
desenrolava-se espontaneamente.<br />
341 Ex<strong>em</strong>plo <strong>do</strong> exposto. Na última entrevista <strong>do</strong> dia, ainda registran<strong>do</strong> as palavras <strong>do</strong> senhor Plínio (67<br />
anos, agricultor no Rincão <strong>do</strong>s Marques), <strong>em</strong> tom suave e vagarosamente declara: “(...) Com uns<br />
animalzinho e a aposenta<strong>do</strong>riazinha a gente vai quebran<strong>do</strong> o galho, (...) a idade chegou!” (grifos nosso).<br />
Observamos o uso <strong>do</strong> diminutivo e o <strong>do</strong> destacar a condição de fragilidade, esta às vezes física, como<br />
neste ex<strong>em</strong>plo, outras vezes econômica e social.<br />
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