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disputas se faz presente pelo menos no imaginário das pessoas de mais idade, e para<br />
ex<strong>em</strong>plificar a distância e o isolamento, entre pessoas estranhas e locais. 37<br />
Nas visitas que realizamos a agricultores familiares <strong>na</strong>s diversas regiões <strong>do</strong><br />
esta<strong>do</strong>, a diversidade de bens fi<strong>na</strong>ncia<strong>do</strong>s foi expressiva, eram agroindústria, animais<br />
reprodutores e matrizes, animais de tração, carroças e carretas, impl<strong>em</strong>entos agrícolas,<br />
resfria<strong>do</strong>res de leite, seca<strong>do</strong>res de grãos, vacas de leite, entre outros. Nas localidades <strong>do</strong><br />
Rincão <strong>do</strong>s Marques e Rincão <strong>do</strong>s Cravos os bens fi<strong>na</strong>ncia<strong>do</strong>s eram ape<strong>na</strong>s <strong>do</strong>is:<br />
animais de tração (junta de bois) e vacas de leite. Inicialmente pensávamos que era para<br />
renovar o plantel de animais, mas aos poucos fomos perceben<strong>do</strong> que esses agricultores<br />
não tinham animais n<strong>em</strong> de tração e n<strong>em</strong> de leite.<br />
Para trabalhar a terra utilizavam a enxada e quan<strong>do</strong> tinham um vizinho disposto<br />
a <strong>em</strong>prestar a junta de bois, primeiro aguardavam o <strong>do</strong>no <strong>do</strong>s animais preparar a terra<br />
para o plantio para depois começar a lavrar a sua lavoura. Isso, <strong>em</strong> parte, explica as<br />
peque<strong>na</strong>s áreas plantadas e perdidas no meio <strong>do</strong>s campos. Quan<strong>do</strong> era realizada somente<br />
com o uso da enxada, o trabalho rendia pouco, e o agricultor era obriga<strong>do</strong> a reduzir sua<br />
área de lavoura para não perder o perío<strong>do</strong> adequa<strong>do</strong> para o plantio, e quan<strong>do</strong> utilizava<br />
animais de tração <strong>em</strong>presta<strong>do</strong>s, também era obriga<strong>do</strong> a reduzir a área para não perder o<br />
t<strong>em</strong>po certo, sen<strong>do</strong> que o <strong>em</strong>préstimo <strong>do</strong>s animais ocorria no momento posterior quan<strong>do</strong><br />
a maioria <strong>do</strong>s agricultores que dispunha de animais de tração próprios já havia<br />
encerra<strong>do</strong> o preparo da terra. Outra informação, os agricultores utilizavam s<strong>em</strong>entes<br />
próprias, guardadas da safra anterior, e não possuíam recursos fi<strong>na</strong>nceiros para corrigir a<br />
fertilidade <strong>do</strong> solo, procuran<strong>do</strong> trocar com maior freqüência o local da lavoura para<br />
tentar melhorar os resulta<strong>do</strong>s da safra. Dadas as condições, entend<strong>em</strong>os tal prática como<br />
uma forma racio<strong>na</strong>l e lógica de cultivo.<br />
O leite muitas vezes não fazia parte da dieta alimentar dessas famílias de<br />
agricultores, a condição econômica restringia a possibilidade de <strong>aqui</strong>sição de uma vaca<br />
de leite. Leite só chegava à mesa dessas famílias se algum vizinho tivesse sobra para<br />
ceder um pouco, ou se tivesse algum animal disponível para <strong>em</strong>prestar. O <strong>em</strong>préstimo<br />
de vacas de leite, <strong>em</strong> alguns casos, era solução para ambos os la<strong>do</strong>s: aprovisio<strong>na</strong>va leite<br />
para o que necessitava <strong>do</strong> produto para consumo e dispensava, o <strong>do</strong>no, <strong>do</strong> custo de<br />
manutenção <strong>do</strong> animal. 38<br />
Esse percurso pelos rincões <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul, conhecen<strong>do</strong> um pouco de<br />
cada região e da vida <strong>do</strong>s agricultores familiares, motivou a realização deste trabalho. A<br />
condição de vida <strong>do</strong>s agricultores familiares de Canguçu, especificamente a <strong>do</strong> Rincão<br />
<strong>do</strong>s Marques e <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Cravos, instigou o aprofundamento da investigação que se<br />
iniciara num rápi<strong>do</strong> contato com a região. Conhecer e compreender os fatores que<br />
compõ<strong>em</strong> o processo histórico de desenvolvimento dessas famílias passou a objetivo<br />
deste trabalho. Tínhamos, então, um caso a ser estuda<strong>do</strong>: localidades rurais com<br />
restrições ou dificuldades de desenvolvimento, mas estudar esses rincões nos permitiria<br />
conhecer os motivos ou fatores que, de alguma forma, participaram <strong>do</strong> processo, ou,<br />
grosso mo<strong>do</strong>, que levaram à situação que presenciamos. Para enriquecer o trabalho<br />
precisávamos de um outro ex<strong>em</strong>plo, de uma localidade que produzira ou vivenciara<br />
outros campos de possibilidades. Com esses <strong>do</strong>is ex<strong>em</strong>plos poderíamos conhecer os<br />
37<br />
Este relato foi presencia<strong>do</strong> <strong>em</strong> janeiro de 2001, entre as localidades <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Marques e Rincão<br />
<strong>do</strong>s Cravos, quarto distrito de Canguçu.<br />
38<br />
Encontramos agricultores que trabalham a terra com vaca de leite, animal de dupla função – tração e<br />
produção de leite. Na maioria <strong>do</strong>s casos não era uma escolha a utilização da vaca como animal de tração,<br />
mas necessidade, pela falta de animais para essa função. Nos perío<strong>do</strong>s que a vaca de leite era utilizada no<br />
preparo da lavoura ou <strong>em</strong> outra atividade que exigia maior esforço <strong>do</strong> animal, o agricultor tinha uma<br />
redução <strong>na</strong> produção de leite pelo desgaste físico <strong>do</strong> animal.<br />
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