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como formas sociais avançadas e superiores. As técnicas tradicio<strong>na</strong>is, economicamente<br />
defasadas ou não-competitivas, são visualizadas como formas sociais atrasadas e<br />
inferiores.” Nesse caso, pensan<strong>do</strong> sobre o processo de transformação, a sociedade <strong>do</strong><br />
Rincão <strong>do</strong>s Maia caminhou <strong>em</strong> direção a formas sociais tidas como avançadas e<br />
superiores, permitin<strong>do</strong> identificá-la, relativamente, com os grupo sociais dinâmicos<br />
como os colonos. Identificação que, de alguma forma, pode-se relacio<strong>na</strong>r com aspectos<br />
psicológicos tanto da sociedade local como exter<strong>na</strong>. Dev<strong>em</strong>os atentar, como destaca<br />
Elias (1999, p. 84), “(...) tal como o conceito de poder, o conceito de função deve ser<br />
compreendi<strong>do</strong> como um conceito de relação.” Nesse senti<strong>do</strong>, a sociedade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s<br />
Maia e a urba<strong>na</strong> continuam interdependente, mas as relações de poder e função foram<br />
modificadas, mas não necessariamente invertidas. Para Elias (1999), a mudança <strong>na</strong><br />
estrutura das sociedades e <strong>na</strong>s relações globais de interdependências funcio<strong>na</strong>is pode<br />
levar um grupo a contestar o poder de coerção <strong>do</strong> outro grupo. Tal como observamos <strong>na</strong><br />
relação da sociedade rural menos favorecida <strong>em</strong> relação à sociedade urba<strong>na</strong><br />
canguçuense. Em reproduções anteriores de entrevistas de agricultores, observamos<br />
claramente a contestação desses quanto à pouca relevância da cidade como absorvente<br />
da produção agrícola, críticas que, de alguma forma, pod<strong>em</strong> ser interpretadas como<br />
contestação à diferença de poder. 521 As atitudes de contestação pod<strong>em</strong> ser observadas,<br />
ou tomam forma mais clara, <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> que os grupos sociais inferioriza<strong>do</strong>s<br />
reconhec<strong>em</strong> seu valor como agentes dinâmicos dentro <strong>do</strong> con<strong>texto</strong> social <strong>em</strong> que estão<br />
inseri<strong>do</strong>s. Essa valorização pode vir de uma mudança de foco sobre a posição <strong>na</strong><br />
sociedade (autopercepção) ou, dentre outras, decorrente de uma transformação<br />
significativa <strong>na</strong> estrutura econômica.<br />
Na sociedade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia, percebe-se que a transformação social e<br />
econômica contribuiu para uma mudança positiva <strong>na</strong> auto-imag<strong>em</strong> das pessoas da<br />
localidade, destacan<strong>do</strong> aspectos como auto-estima, valorização e confiança. Efeitos da<br />
mudança de percepção sobre si mesmos. Anteriormente auto-reconheciam-se como<br />
miseráveis, pobres, huma<strong>na</strong>mente inferiores, improfícuos, mas, aos poucos, v<strong>em</strong><br />
ocorren<strong>do</strong> uma inversão destas características. Nas palavras <strong>do</strong> senhor Ivo (52 anos)<br />
pod<strong>em</strong>os observar a valorização da capacidade das pessoas <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia como<br />
diferencial no processo de desenvolvimento: “(...) desenvolveu pelo conhecimento <strong>do</strong><br />
povo que se interessa pelas coisa, lutam para crescer.” Faz menção a características de<br />
perso<strong>na</strong>lidade <strong>do</strong> grupo, como, por ex<strong>em</strong>plo, persistência, dedicação e determi<strong>na</strong>ção;<br />
mas, também, insinua uma contraposição aos estigmas (por ex<strong>em</strong>plo: acomoda<strong>do</strong>s,<br />
vagabun<strong>do</strong>s, etc.) que eram imputa<strong>do</strong>s à sociedade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia. Estigmas estão<br />
relacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s aos atribuí<strong>do</strong>s ao gaúcho peão discuti<strong>do</strong> no primeiro capítulo.<br />
A mudança de percepção pode ser observada <strong>na</strong>s palavras <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s,<br />
tanto de residentes como não-residentes da localidade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia. Em<br />
contraste com as características de perso<strong>na</strong>lidade que marcam o passa<strong>do</strong>, as expressões<br />
que destacam aspectos da perso<strong>na</strong>lidade <strong>do</strong> presente envolv<strong>em</strong> a valorização da autoestima,<br />
confiança, otimismo e valores positivos. A transformação <strong>na</strong> estrutura da<br />
perso<strong>na</strong>lidade da sociedade <strong>do</strong> Rincão <strong>do</strong>s Maia é resulta<strong>do</strong> de diversos processos que<br />
possibilitaram um outro olhar sobre si mesmo e sobre os outros. A partir <strong>do</strong> momento<br />
que visualiza uma possível redefinição nos diferenciais de poder, a sociedade <strong>do</strong> Rincão<br />
<strong>do</strong>s Maia assume comportamento de contra-ataque (contra-estigmatização), 522 exaltan<strong>do</strong><br />
suas próprias qualidades e capacidades, e imputan<strong>do</strong> depreciações ao oponente, este,<br />
521 Por ex<strong>em</strong>plo, <strong>na</strong> fala <strong>do</strong> senhor Eduar<strong>do</strong> (comerciante e agricultor no Rincão <strong>do</strong>s Maia): “Canguçu não<br />
t<strong>em</strong> <strong>na</strong>da, não t<strong>em</strong> indústria, não t<strong>em</strong> <strong>em</strong>prego, não t<strong>em</strong> <strong>na</strong>da!”<br />
522 Ver Elias e Scotson (2000).<br />
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