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pod<strong>em</strong> destacar palavras como lucros e estrito. Na palavra lucros estão subentendidas<br />
as motivações <strong>do</strong> aventureiro, e <strong>na</strong> palavra estrito reconhece-se a adaptação (<strong>em</strong> direção<br />
as qualidades <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r), mas prevalecen<strong>do</strong> o espírito aventureiro.<br />
A introdução da discussão sobre aventureiro e trabalha<strong>do</strong>r, abordada por<br />
Holanda (1995), pode auxiliar a entender algumas características que ainda hoje se<br />
encontram <strong>em</strong> algumas localidades da região de Canguçu e <strong>em</strong> outras partes <strong>do</strong> Rio<br />
Grande <strong>do</strong> Sul. As características <strong>do</strong> tipo gaúcho pod<strong>em</strong> ser vinculadas ao espírito<br />
aventureiro <strong>do</strong>s portugueses <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r, mas também ao espírito<br />
aventureiro <strong>do</strong>s grupos indíge<strong>na</strong>s que habitavam a região, principalmente <strong>do</strong>s<br />
pampianos. As condições, das variadas instâncias, favoreciam a heg<strong>em</strong>onia <strong>do</strong> espírito<br />
aventureiro. O processo de desenvolvimento, desde a colonização até os dias atuais,<br />
t<strong>em</strong>, <strong>em</strong> parte, convivi<strong>do</strong> com heranças culturais que estão de alguma forma, talvez<br />
tênues, relacio<strong>na</strong>das com as qualidades <strong>do</strong> espírito aventureiro.<br />
A figura <strong>do</strong> gaúcho, construída ao longo <strong>do</strong> processo histórico de ocupação e<br />
formação <strong>do</strong> território rio-grandense, incorporou diversas significações até alcançar a<br />
atual – habitante <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul. A palavra gaúcho, no decorrer <strong>do</strong>s<br />
anos, passou por um processo, diria-se, de construção <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de identidade,<br />
seguin<strong>do</strong> <strong>do</strong>is caminhos que convergiram para o significa<strong>do</strong> atual da palavra. Esses <strong>do</strong>is<br />
caminhos estão identifica<strong>do</strong>s com a perso<strong>na</strong>lidade <strong>do</strong>s indivíduos e com o espaço físico<br />
que ocupam. 88 Antigamente referi<strong>do</strong> a certa casta de características depreciativas que<br />
ocupava determi<strong>na</strong>da região que compreendia parte <strong>do</strong>s territórios da Argenti<strong>na</strong>, <strong>do</strong><br />
Brasil e <strong>do</strong> Uruguai; 89 atualmente, desvinculada das características depreciativas,<br />
atribuídas aos habitantes <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul.<br />
Oliven (1996, p. 18-19), basea<strong>do</strong> <strong>em</strong> Augusto Meyer, relata que o habitante <strong>do</strong><br />
Rio Grande era chama<strong>do</strong> de guasca e posteriormente de gaudério, termos distintos <strong>do</strong><br />
significa<strong>do</strong> heróico atribuí<strong>do</strong> à palavra gaúcho, tanto <strong>na</strong> literatura como <strong>na</strong><br />
historiografia regio<strong>na</strong>l. Gaudério referia-se aos paulistas que contrabandeavam ga<strong>do</strong> <strong>na</strong><br />
fronteira entre Portugal e Espanha (atuais territórios da Argenti<strong>na</strong>, Brasil e Uruguai),<br />
eram pessoas de vida rude, identificadas como aventureiros e vagabun<strong>do</strong>s. Nos últimos<br />
anos <strong>do</strong> século XVIII, o termo gaudério foi substituí<strong>do</strong> pelo termo gaúcho, conservan<strong>do</strong><br />
a conotação pejorativa. Com o estabelecimento e organização das estâncias dedicadas à<br />
criação de ga<strong>do</strong>, mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XIX, o gaúcho passa a ser identifica<strong>do</strong> como o peão,<br />
o guerreiro, abstrain<strong>do</strong> o significa<strong>do</strong> negativo. Conforme o autor, “(...) o que ocorreu foi<br />
a ress<strong>em</strong>antização <strong>do</strong> termo, através <strong>do</strong> qual um tipo social que era considera<strong>do</strong><br />
desviante e margi<strong>na</strong>l foi apropria<strong>do</strong>, reelabora<strong>do</strong> e adquiriu um novo significa<strong>do</strong><br />
positivo, sen<strong>do</strong> transforma<strong>do</strong> <strong>em</strong> símbolo de identidade regio<strong>na</strong>l.” 90<br />
A transformação <strong>do</strong> significa<strong>do</strong> ou o surgimento de nova palavra no vocabulário<br />
de determi<strong>na</strong>da região pode diagnosticar mudanças culturais significativas. Segun<strong>do</strong><br />
Elias (1994ª, p. 68), “(...) o aparecimento mais ou menos súbito de palavras <strong>em</strong> línguas<br />
quase s<strong>em</strong>pre indica mudanças <strong>na</strong> vida <strong>do</strong> próprio povo, sobretu<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> os novos<br />
conceitos estão desti<strong>na</strong><strong>do</strong>s a se tor<strong>na</strong>r<strong>em</strong> fundamentais e de longa duração (...).”<br />
Observa-se nos relatos históricos que o surgimento da palavra gaúcho e a transformação<br />
<strong>do</strong> seu significa<strong>do</strong> estão atrela<strong>do</strong>s a mudanças significativas <strong>na</strong> vida <strong>do</strong> povo riograndense,<br />
passou da captura <strong>do</strong> ga<strong>do</strong> xucro para criação, resultan<strong>do</strong> <strong>na</strong> mudança <strong>do</strong><br />
estilo de vida nômade para o estático, estabelecimento das estâncias.<br />
88 Ver a concepção de identidade social de Moreira (2005).<br />
89 Estamos preocupa<strong>do</strong>s somente com o senti<strong>do</strong> que a palavra assume no Rio Grande <strong>do</strong> Sul.<br />
90 Diría-se que a palavra gaúcho passou por um processo, guardan<strong>do</strong> as particularidades culturais e as<br />
qualidades explicativas de cada termo, pareci<strong>do</strong> com o descrito por Elias (1994a) quan<strong>do</strong> a<strong>na</strong>lisa o<br />
significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> conceito de civilização.<br />
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