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auto-estima e confirman<strong>do</strong> condições de promover o próprio desenvolvimento.<br />

Retor<strong>na</strong>r<strong>em</strong>os a esta discussão <strong>na</strong> próxima seção.<br />

Em junho de 2002 ao percorrermos diversas localidades <strong>do</strong> município de<br />

Canguçu encontramos um cenário, inicialmente visto, desola<strong>do</strong>r no Rincão <strong>do</strong>s Maia:<br />

pomares inteiros de pessegueiros arranca<strong>do</strong>s, árvores tombadas e com as raízes<br />

expostas. Cogitamos <strong>em</strong> renovação <strong>do</strong> pomar, mas adiante soub<strong>em</strong>os que estavam <strong>em</strong><br />

pleno processo de mudança de cultivo, substituin<strong>do</strong> os pessegueiros pelas lavouras de<br />

fumo. As dificuldades que relatadas atrás sobre a produção de pêssegos e os incentivos<br />

da indústria de tabacos contribuíram para este processo de substituição de cultivo.<br />

Pod<strong>em</strong>os inferir que esse processo de substituição de cultivo não é, de to<strong>do</strong>, algo<br />

negativo (da<strong>do</strong> o combate ao tabagismo), já que permitiu a ampliação de novos elos e<br />

possibilidades sociais e econômicas. O senhor Paulo (63 anos) relata os motivos da<br />

mudança de cultivo: De <strong>do</strong>is anos para cá invent<strong>em</strong>o de plantar fumo! O cara s<strong>em</strong>pre t<strong>em</strong> que procurar<br />

se melhorar um pouco né? Aí mesmo onde eu tenho fumo, eu tava cheio de<br />

chácara [pessegueiros]. Arranquei as chácara para plantar fumo. Pêssego é uma<br />

coisa que não dá mais, pelo seguinte: os fabricante começaram a explorar o<br />

agricultor. Se o senhor manda 50 caixas de pêssego, quan<strong>do</strong> o senhor vai receber<br />

o vale, o senhor vai recebe o vale de 20 caixas que o resto eles descontô a troco<br />

de que a gente não sabe. Não é só uma fábrica, é geral, todas elas são assim.<br />

Então vale a pe<strong>na</strong> o senhor apanhá 50 caixa de pêssego e aí lhe sobra 20 caixa? Aí<br />

vai que o cara vai perden<strong>do</strong> a <strong>em</strong>oção de cuidar esse tipo de planta. Aí<br />

começaram a entrar no fumo e aí entr<strong>em</strong>o no fumo também! 493<br />

O apelo da indústria de tabacos garantin<strong>do</strong> a compra da produção, seguran<strong>do</strong><br />

perdas <strong>na</strong> lavoura, fi<strong>na</strong>ncian<strong>do</strong> investimentos (<strong>em</strong> até cinco anos s<strong>em</strong> juros) e<br />

fornecen<strong>do</strong> assistência técnica, parece ter si<strong>do</strong> decisivo para a mudança <strong>do</strong> sist<strong>em</strong>a<br />

produtivo (de pêssego para o fumo). A agricultura, por <strong>na</strong>tureza, é uma atividade de<br />

risco, o agricultor está quase s<strong>em</strong>pre vulnerável às condições climáticas e à<br />

comercialização <strong>do</strong> produto, foram nestes itens que a indústria de tabacos conquistou os<br />

produtores rurais familiares, a ponto de fazê-los refletir sobre os princípios éticos de<br />

suas vidas <strong>em</strong> argumentos pró-fumo e pró-alimentos. Na lógica <strong>do</strong>s agricultores<br />

familiares tradicio<strong>na</strong>is, percebida nos depoimentos, há duas questões presentes <strong>na</strong> sua<br />

própria concepção como agente social (função): prove<strong>do</strong>r da sua própria subsistência e<br />

produtor de alimentos. Ao discutirmos com os entrevista<strong>do</strong>s sobre a atividade produtiva,<br />

observamos claramente que a lógica de reprodução privilegia <strong>em</strong> primeiro lugar a<br />

subsistência <strong>do</strong> grupo familiar, levan<strong>do</strong> <strong>em</strong> conta a quantidade e a qualidade <strong>do</strong> produto<br />

desti<strong>na</strong><strong>do</strong> ao autoconsumo, seguida pela função de produzir alimentos para a sociedade.<br />

Valores éticos que aos poucos estão, relativamente, 494 submergin<strong>do</strong> à dinâmica<br />

capitalista (<strong>integra</strong>ção ao merca<strong>do</strong>), como no depoimento <strong>do</strong> senhor Frederico (44<br />

anos): “Se continuar com esse interesse das grandes indústrias, parece que Canguçu vai<br />

pará de produzi. Só vai produzi fumo!” 495 No discurso deste agricultor, como <strong>em</strong> outros,<br />

há a idéia subjacente de que produzir (“vai pará de produzi”) está associada ao que se<br />

consome, o que alimenta o corpo e faz subsistir a vida – vocação nobre (agricultor).<br />

493 Aposenta<strong>do</strong> rural e agricultor no Rincão <strong>do</strong>s Maia.<br />

494 Se a<strong>na</strong>lisarmos por outro la<strong>do</strong>, os princípios éticos não sofreram uma ruptura significativa, já que<br />

passou <strong>do</strong> pêssego com toxidez ao tóxico da droga fumo. Entretanto, estamos a<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> <strong>do</strong> ponto de vista<br />

<strong>do</strong>s relatos, a comparação entre uma droga e um alimento para a barriga.<br />

495 Também reproduzimos parte <strong>do</strong> discurso <strong>do</strong> senhor Ber<strong>na</strong>r<strong>do</strong> (47 anos – representante local,<br />

funcionário público municipal e agricultor no Rincão <strong>do</strong>s Maia), o qual expõe s<strong>em</strong>elhanças com o <strong>do</strong><br />

senhor Frederico: “O fumo é o mal necessário, a gente sabe que é um mal, ninguém come, n<strong>em</strong> os<br />

próprios insetos se utilizam <strong>do</strong> fumo, mas o produtor t<strong>em</strong> que produzir porque t<strong>em</strong> essa garantia de venda<br />

e um preço razoável.”<br />

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