141virtudes sem o que a escuta não se pode dar. Se não os escuto não posso falar comeles, mas a eles, de cima para baixo‖ (FREIRE, 1996, p. 120). Essa é uma dasvirtudes colocadas por Freire para um verdadeiro professor problematizador.Saber enfrentar e preparar-se para trabalhar com obstáculos e desafios que aeducação nos apresenta é uma especificidade da atividade docente. Pois, se anossa postura é de uma educação democrática é não de imposição e puramentetransmissão de conhecimento, acreditamos que esses sempre estarão presentes emnossa prática. Assim, temos nas palavras de Freire uma maior explicação de nossoentendimento a respeito da narrativa da professora.Especificamente humana a educação é gnosiológica, é diretiva, por issopolítica, é artística e moral, serve-se de meios, técnicas, envolvefrustrações, medos, desejos. Exige de mim, como professor, umacompetência geral, um saber de sua natureza e saberes especiais, ligadosà minha atividade docente. (1996, p. 70).O trabalho em educação requer que tenhamos presente essas dimensões quefazem parte do cotidiano. Não para nos adaptar, mas para buscar a mudança dessarealidade. Entendemos, assim, que não há como trabalhar na educação sem que dealguma forma entendamos que há características próprias dessa realidade das quaisnão podemos nos eximir.Segundo a professora ―C‖:“Educar é permitir que as diferenças se unam para tornarem-se mais semelhantes”.Pensar em como me vejo sendo professora da EJA faz com eu pense em uma fraseque li certa vez em uma reunião de estudos na nossa instituição, a qual dizia que aEJA “é um campo aberto que não deve ser cercado e assim deverá permanecer parapoder respeitar as diferenças”.Por isso, sempre que vou planejar as aulas, começar um novo semestre ou entrar emsala para mais uma atividade letiva, penso nesta frase e me sinto bem, porque seique, apesar do desafio ser grande, sempre vale a pena.Ser professora da EJA é ser dinâmica, adaptável, flexível, comprometida,respeitadora, amiga, ouvinte, conselheira, educadora e, principalmente, incentivadorapara que no final do semestre não se tenha uma grande evasão.Apesar de trabalhar com a EJA desde 2000, é como se cada ano eu estivessecomeçando, porque sei que muitas histórias novas se encontrarão paraacrescentarem-se a minha história de professora. Concluo me declarando ainda“enamorada” pela EJA e afirmando que se um dia essa “paixão” acabar, eu deixarei olugar para outros que amem e saibam respeitar esse espaço privilegiado deeducação.(Professora C).Nessa narrativa, percebemos ênfase ao respeito e às diferenças que seapresentam na EJA. A partir da frase de Arroyo, citada pela professora, fica claro
142que não podemos esperar uma classe, uma turma de alunos que atendam àsexpectativas das classes tradicionais de regularidade, de um mesmo nível deconhecimento (como muitos professores desejam), de organização temporal dosconhecimentos escolares pensados para as crianças e adolescentes.Significa entender que os tempos de aprendizagem são outros, que as históriasde vida são diferentes e que:Os jovens e adultos estão num outro tempo mental, cultural, social do queas crianças de 6 a 14 anos. Seus saberes, sua cultura e vivência sãooutros, sua lógica, seus conhecimentos da natureza, da cidade ou docampo, da produção e do trabalho, o conhecimento de si mesmos e do serhumano, de seu gênero, etnia, ração, são outros. (ARROYO, 2005, p. 30 e31).Por isso, a organização deve ser diferenciada, as metodologias devem serpensadas a partir desse jovem e adulto. Ou seja, um campo aberto que tenhapresente as especificidades da EJA e que os trabalhos aconteçam a partir de suascondições e não somente de sua escolarização. Da mesma forma, a professoraexpõe algumas qualidades, características do professor da EJA que vão ao encontrodos saberes necessários à prática educativa de um professor que assume umapostura ética de acordo com Freire.É preciso que saibamos que, sem certas qualidades ou virtudes comoamorosidade, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto pela alegria,gosto pela vida, abertura ao novo, disponibilidade à mudança, persistênciana luta, recusa aos fatalismos, identificação com a esperança, abertura àjustiça, não é possível a prática pedagógico-progressista, que não se fazapenas com ciência e técnica. (1996, p. 120).A professora ―D‖ relata:“Trabalho na EJA desde março de 2001.É gratificante e prazeroso trabalhar na EJA, pois tem seu diferencial do ensino regular.Os alunos têm uma característica diferenciada, alguns não tiveram acesso à escola naidade escolar, hoje procuram a EJA para concluir os seus estudos no ensinofundamental.Alguns alunos apresentam maior dificuldade na aprendizagem, mas sempre aprendemalgo, e eu aprendo muito com os alunos também, pois trazem uma bagagem de vidasem fim.Os alunos adultos são pessoas vividas que muitas vezes trazem grandes sofrimentose amarguras, mas no espaço da EJA sempre temos o momento do diálogo onde secomenta e questiona-se sobre assuntos muitas vezes até pessoais.
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