14.04.2013 Views

Estética - OUSE SABER!

Estética - OUSE SABER!

Estética - OUSE SABER!

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

1965 - "As Damas de Companhia" 201<br />

breposição instável - e levá-las logo à outra extremidade do quadro,<br />

a este pólo que é o mais perfeitamente representado: o de<br />

uma profundidade de reflexo no interior de uma profundidade<br />

de quadro. O espelho assegura uma metátese da visibilidade que<br />

abrange, ao mesmo tempo, o espaço representado no quadro e<br />

sua natureza de representação; ele faz ver, no centro da tela, aquilo<br />

que no quadro é duas vezes necessariamente invisível.<br />

Estranha maneira de aplicar ao pé da letra, mas invertendo-o,<br />

o conselho que o velho Pacheco havia dado, ao que parece,<br />

ao seu aluno, quando trabalhava em seu ateliê de Sevilha: “A<br />

imagem deve sair do quadro.”<br />

*<br />

Mas talvez seja o momento de nomear essa imagem que aparece<br />

no fundo do espelho e que o pintor contempla na frente do<br />

quadro. Talvez seja melhor determinar, de uma vez por todas,<br />

as identidades dos personagens presentes ou indicados, do que<br />

se embaralhar permanentemente nessas designações flutuantes,<br />

um pouco abstratas, sempre suscetíveis de equívocos e<br />

desdobramentos: “o pintor”, “os personagens”, “os modelos”,<br />

“os espectadores”, “as imagens”. Em vez de persistir incessantemente<br />

em uma linguagem fatalmente inadequada ao visível,<br />

bastaria dizer que Velásquez compôs um quadro; que nesse<br />

quadro ele próprio se representou, em seu ateliê, ou em uma<br />

sala do Escoriai, pintando dois personagens que a infanta Margarida<br />

vem contemplar, cercada de aias, damas de companhia,<br />

cortesãos e anões; que a esse grupo é possível atribuir nomes: a<br />

tradição reconhece aqui dona Maria Agustina Sarmiente, no<br />

fundo, Nieto, no prim eiro plano, Nicolaso Pertusato, bufão italiano.<br />

Bastaria acrescentar que os dois personagens que servem<br />

de modelo ao pintor não estão visíveis, pelo menos diretamente;<br />

mas que podem os percebê-los em um espelho; que se<br />

trata, sem dúvida, do rei Felipe IV e de sua esposa, Marianna.<br />

Esses nomes próprios constituiriam referências úteis, evitariam<br />

designações ambíguas; dir-nos-iam, em todo caso, o que o<br />

pintor vê, e com ele a maior parte dos personagens do quadro.<br />

Mas a relação da linguagem com a pintura é uma relação infinita.<br />

Não que a fala seja imperfeita e, diante do visível, se encontre<br />

em um déficit que ela em vão se esforçaria para superar. Elas<br />

são irredutíveis uma à outra: por mais que se diga o que se vê, o

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!