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Estética - OUSE SABER!

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1983 - Mictiel Foucault/Pierre B ou lez - A M úsica Contem porânea e o Público 395<br />

cumento, fundamentada no momento raro e no instante fugaz,<br />

que nos lembra ao m esm o tempo a fragilidade e a perenidade<br />

do intérprete tornado imortal, rivalizando então com a imortalidade<br />

da obra-prima. Todos os mistérios do sudário de Turim,<br />

todos os poderes da m agia moderna, o que mais vocês desejariam<br />

como álibi da reprodução frente à produção atual? A modernidade<br />

é essa superioridade técnica que temos em relação<br />

aos séculos passados de poder recriar o acontecimento. Ah! Se<br />

tivéssemos a prim eira execução da Nona, mesmo - sobretudo -<br />

com todos os seus defeitos, ou se pudéssemos fazer a aprazível<br />

diferença entre a versão de Praga e a vienense de Don Giovanni<br />

pelo próprio Mozart... Essa carapaça historicizante sufoca os<br />

que com ela se cobrem, confina-os em uma rigidez asfixiante; o<br />

ar mefítico que respiram fragiliza para sempre seu organismo<br />

em relação à aventura atual. Imagino Fidelio satisfeito em permanecer<br />

em sua masmorra, ou penso ainda na caverna de Platão:<br />

civilização da som bra e das sombras.<br />

M. Foucault: Certamente, a escuta da música se torna mais<br />

difícil à medida que sua escrita se liberta de tudo o que pode<br />

constituir esquemas, sinais, marca perceptível de uma estrutura<br />

repetitiva.<br />

Na música clássica, há uma certa transparência da escrita à escuta.<br />

E, embora os fatos da escrita musical em Bach ou Beetho-<br />

ven não sejam reconhecíveis para a maior parte dos ouvintes,<br />

há sempre outros, e importantes, que lhes são acessíveis. Ora,<br />

a música contemporânea, tendendo a fazer de cada um dos<br />

seus elementos um acontecimento singular, torna difícil qualquer<br />

apreensão ou reconhecimento por parte do ouvinte.<br />

P. B o u le z : Haverá de fato somente desatenção, indiferença<br />

por parte desse ouvinte diante da música contemporânea? As<br />

queixas tão freqüentemente ouvidas não se deveriam apenas à<br />

preguiça, à inércia, à satisfação de permanecer em um território<br />

conhecido? Berg escreveu, há meio século, um texto intitulado<br />

Por que a m ú sica d e Schònberg é difícil de compreender?1.<br />

As dificuldades que ele então descrevia são quase as mesmas<br />

das quais ouvimos falar hoje em dia. Teria sido sempre igual?<br />

Provavelmente, qualquer novidade fere sensibilidades não<br />

acostumadas com isso. Mas se pode acreditar que, em nossos<br />

1. Berg (A.), "W aru m ist Schoenbergs Musik so schwer verständlich?".<br />

Musikblätter des A m bruch, 1924.

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