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Estética - OUSE SABER!

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354 Michel Foucault - Ditos e Escritos<br />

na rua, se perfilando entre o diapositivo projetado e a tela sobre<br />

a qual ele pinta, para finalmente permanecer na tela) servia de<br />

qualquer forma de relé, de ponto de fixação da fotografia sobre<br />

a tela. Daí em diante (novo despojamento, nova leveza, nova<br />

aceleração), a imagem é impelida por um pirotécnico do qual<br />

não se vê nem mesmo a sombra. Ela vem pelo curto caminho,<br />

lançada de seu ponto de origem - a montanha, o mar, a China -<br />

até nossa porta - e com enquadramentos variados onde o pintor<br />

não tem mais lugar (enorme plano sobre a ferragem de uma<br />

porta de prisão, de um punhado de notas entre a mão rude de<br />

um açougueiro e a de uma menina; a imensa paisagem de montanha,<br />

desproporcional em relação aos personagens minúsculos<br />

que ali se encontram e que apenas pontos coloridos chegam<br />

a assinalar).<br />

Migração autônoma da imagem que circula em nossa direção<br />

segundo as mesmas vias do desejo que os personagens que aí<br />

se mostram, se detêm na beira do mar, vêem uma criança com<br />

uma metralhadora ou sonham com uma manada de elefantes.<br />

Saímos agora desse longo período em que a pintura não parou<br />

de se minimizar como pintura, para se “purificar”, se exasperar<br />

como arte. Talvez, com a nova pintura “fotogénica”, ela<br />

deboche finalmente dessa parte dela mesma que buscava o gesto<br />

intransitivo, o signo puro, o “traço”. Ei-la que aceita tornar-se<br />

lugar de passagem, infinita transição, pintura povoada e passante.<br />

E eis que se abrindo a tantos acontecimentos que persegue,<br />

ela se integra a todas as técnicas da imagem; reata parentesco<br />

com elas, para se debruçar sobre elas, ampliá-las, multiplicá-las,<br />

desestabilizá-las ou fazê-las desviar. Em torno dela se<br />

delineia um campo aberto em que os pintores não podem mais<br />

estar sós, nem a pintura ser a única soberana; ali, eles encontrarão<br />

a multidão de todos os amadores, pirotécnicos, manipuladores,<br />

contrabandistas, ladrões, piratas de imagens; e eles<br />

poderão rir do velho Baudelaire, e transformar em prazer seus<br />

desdéns de esteta: “a partir desse momento, dizia ele a propósito<br />

da invenção da fotografia, a turba imunda se lançará como<br />

um único narciso para contemplar sua trivial imagem sobre o<br />

metal. Uma loucura, um fanatismo extraordinário se apoderara<br />

de todos esses novos adoradores do sol”. Que Fromanger seja<br />

então para nós um desses fabricantes de sol.<br />

Daí em diante, poder “pintar tudo”? Sim. Mas talvez aí também<br />

esteja uma afirmação e uma vontade de pintar. Se dissés­

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