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Estética - OUSE SABER!

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358 Michel Foucault - Ditos e Escritos<br />

H. Cixous: Penso que o outro poder que dela emana é sua relação<br />

com o olhar. É o que inicialmente me havia detido em minha<br />

leitura. De início, não li Marguerite Duras com facilidade.<br />

Eu a li resistindo, porque me desagradava a posição na qual ela<br />

me colocava. Pois a posição à qual ela conduz, na qual “coloca”<br />

as pessoas, não me disponho a ocupá-la sem um certo desprazer.<br />

Foi preciso que eu superasse isso. Acredito que é a relação<br />

com o olhar. Você dizia: memória sem lembranças. É isso. 0<br />

trabalho que ela faz é um trabalho de perda; como se a perda<br />

fosse inacabável; é muito paradoxal. Como se a perda jamais<br />

fosse perdida o bastante, você sempre tem a perder. Isso sempre<br />

caminha nesse sentido.<br />

Então, sua memória sem lembranças, sim, é como se a memória<br />

não chegasse a se apresentar, como se o passado fosse<br />

tão passado que, para que haja lembrança, seja necessário ir ao<br />

passado. Ser passado. O passado não retorna. É alguma coisa<br />

monstruosa, é impossível de pensar e, no entanto, é isso, acredito.<br />

E na imagem, como isso se dá? Com um olhar de uma intensidade<br />

extrema, porque ele não chega a re-parar. É um olhar<br />

que não consegue parar. Por toda parte aqueles personagens<br />

"olhados”, isso também era uma das coisas que me incomodavam,<br />

antes que eu tivesse conseguido aceitar o que ela pede: ou<br />

seja, a mais extrema passividade. Esses personagens vêm uns<br />

após os outros, com o olhar que recai sobre o outro, que é um<br />

pedido que não pede nada. Ela tem fórmulas muito belas que<br />

são sempre fórmulas passivas: alguém é olhado. “Ela” é olhada,<br />

ela não sabe que é olhada. Por um lado, o olhar recai sobre um<br />

sujeito que não recebe o olhar, que é de tal forma ele próprio<br />

sem imagens que ele não tem com o que refletir um olhar. E,<br />

por outro, aquele que olha é igualmente alguém tão pobre e tão<br />

desprovido, ele quereria poder agarrar como se faz com o<br />

olhar, ele quereria captar. Sempre a mesma coisa, é a areia que<br />

escorre...<br />

M. Foucault: Você diria que ela escorre da mesma maneira<br />

nos filmes e nos livros? Nos livros, é uma perpétua anulação<br />

desde que alguma coisa, como uma presença, começa a se esboçar;<br />

a presença se esconde por trás de seus próprios gestos,<br />

de seus próprios olhares, e se dissolve; não resta mais do que<br />

uma espécie de clarão que remete a um outro clarão, e o mini-<br />

mo apelo à lembrança foi anulado. E depois nos filmes, pelo<br />

contrário, me parece que há aparecimentos. Aparecimentos

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