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Estética - OUSE SABER!

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342 Michel Foucault - Ditos e Escritos<br />

rências - de referências positivas - mais amplo, mais vasto.<br />

Para muitas pessoas, por exemplo, isso consiste em se rea-<br />

propriar da '‘história da França”. Foi sob essa ótica que se leu<br />

atentamente Eu, Pierre Rivière..., porque nos dávamos conta<br />

de que a rigor, paradoxalmente, isso nos era útil para dar<br />

conta de Lacombe Lucien, que a com paração não era improdutiva.<br />

Por exemplo, uma diferença significativa é que Pierre<br />

Rivière é um homem que escreve, que executa um assassinato<br />

e que tem uma memória absolutamente extraordinária.<br />

Malle trata seu herói como um imbecil, com o alguém que<br />

atravessa tudo, a história, a guerra, a colaboração, sem nada<br />

capitalizar. É ali que o tema da memória, da memória popular,<br />

pode ajudar a operar uma clivagem entre alguém, Pierre<br />

Rivière, que toma a palavra não a tendo e é obrigado a matar<br />

para ter o direito a essa palavra, e o personagem criado por<br />

Malle e Modiano que prova, justam ente não capitalizando<br />

nada do que lhe acontece, que não há nada de que valha a<br />

pena se lembrar. É deplorável que você não tenha visto Le<br />

Courage du Peuple5. É um film e boliviano, fe ito explicitamente<br />

com o objetivo de constituir uma prova circunstancial para<br />

um dossiê. Esse film e, que circula no mundo inteiro (mas não<br />

na Bolívia, por causa do regime), é encenado pelos próprios<br />

atores do drama real que ele reconstitui (um a greve dos mineiros<br />

e sua sangrenta repressão); eles próprios se encarregaram<br />

de sua representação, para que ninguém esqueça.<br />

É interessante ver que, em um nível mínimo, todo film e funciona<br />

como arquivo potencial e que, em uma perspectiva de<br />

luta, é possível se apoderar dessa idéia, passar para um estágio<br />

mais avançado, quando as pessoas organizam seu film e como<br />

uma prova circunstancial. É possível pensar isso de duas maneiras<br />

radicalmente diferentes: seja porque o film e coloca em<br />

cena o poder, seja porque ele representa as vítimas desse poder,<br />

as classes exploradas que, sem a ajuda do aparelho de pro-<br />

dução-difusão do cinema, com pouquíssimos meios técnicos, se<br />

encarregam de sua própria representação, testemunham para<br />

a história. Um pouco como Pierre Rivière testemunhava, ou<br />

seja, começava a escrever, sabendo que ele teria mais cedo ou<br />

mais tarde que se apresentar à justiça e que seria preciso que<br />

todo mundo compreendesse o que ele tinha a dizer.<br />

5. El Corage dei Pueblo, de J. Sanjines, 1971. C o - p r o d u ç ã o b o l i v i a n a e italiana<br />

sobre as lutas dos mineiros de estanho em 1967.

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