14.04.2013 Views

Estética - OUSE SABER!

Estética - OUSE SABER!

Estética - OUSE SABER!

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

1 8 M ichel Foucault - Ditos e Escritos<br />

- estar advertido e conduzir sutilmente a ignorância fingindo<br />

se desorientar com ela (sed u zir);<br />

- ter reconhecido o mal aí onde a inocência ainda só decifra<br />

pureza, e fazer esta servir àquele (c o rro m p e r);<br />

- prever e preparar a saída, como o velhaco dispõe os recursos<br />

da armadilha que ele arma para a ingenuidade (abusar);<br />

- estar "a par” e aceitar, para melhor confundi-lo, entrar no<br />

jogo. embora se tenha apreendido bem o artifício que a prudência<br />

opõe em sua fingida simplicidade (tentar).<br />

Essas quatro figuras venenosas - todas elas florescem no jardim<br />

dos Égarem ents - crescem ao longo das belas formas simples<br />

da ignorância, da inocência, da ingenuidade, da prudência.<br />

Amoldam-se às suas formas, cobrem-nas com uma vegetação<br />

inquietante: em torno de sua nudez, cultivam um pudor redobrado<br />

- estranha vestimenta, palavras secretas e de duplo sentido.<br />

armadura que guia os golpes. Todas elas aparentam o erotismo<br />

do véu (o véu do qual o último episódio do Sopha abusa<br />

de forma tão vantajosa).<br />

O véu, essa fina superfície que o acaso, a pressa, o pudor colocaram<br />

e se esforçam por manter: mas sua linha de força é irremediavelmente<br />

ditada pelo vertical da queda. O véu desvela,<br />

por uma fatalidade que é a do seu tecido leve e de sua forma flexível.<br />

Para desempenhar seu papel de cobrir e ser exato, o véu<br />

deve forrar, da maneira mais justa, as superfícies, reexaminar<br />

as linhas, percorrer sem discursos supérfluos a extensão dos<br />

volumes e multiplicar por uma brancura cintilante as formas<br />

que despoja de sua sombra. Suas dobras acrescentam apenas<br />

uma desordem imperceptível, mas esse fervilhar de tecido é<br />

apenas a antecipação de uma nudez próxima: ele é, desse corpo<br />

que esconde, como a imagem já amarrotada, a doçura molestada.<br />

Ainda mais sendo transparente. De uma transparência funcional,<br />

ou seja, desequilibrada e dissimulada. Seu papel opaco<br />

e protetor, ele o desempenha bem, mas apenas para quem com<br />

ele se cobre, para a mão cega, tateante e febril que se defende.<br />

Mas, para quem assiste a tantos esforços e, de longe, fica à espreita,<br />

esse véu deixa aparecer. Paradoxalmente, o véu esconde<br />

o próprio pudor e surrupia o essencial da sua reserva de sua<br />

própria atenção: mas manifestando essa reserva ao indiscreto,<br />

ela lhe faz ver indiscretamente o que ela reserva. Duas vezes<br />

traidor, ele mostra o que evita e esconde àquele que ele deve<br />

ocultar que ele o desvela.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!