Pedagogia dos monstros - Apresentação
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sim, alguma validade às tentativas de Moretti e de<br />
Wood de fixar o significado do monstruoso, o mesmo<br />
ocorrendo relativamente à ênfase de Todorov na hesitação<br />
estrutural e à insistência de Penley na mobilidade<br />
da identificação. Freud observa várias vezes —<br />
particularmente com referência aos contos de fadas<br />
— que a representação ficcional de eventos estranhos<br />
não é, em si, suficiente para produzir o efeito do estranho:<br />
“aquele sentimento não pode surgir a menos<br />
que haja um conflito de julgamento relativamente a<br />
saber se as coisas que foram superadas e são consideradas<br />
como incríveis [arcaísmo e animismo, por exemplo]<br />
não podem, afinal, ser possíveis; e este problema<br />
é eliminado, desde o início, pelos postula<strong>dos</strong> do mundo<br />
<strong>dos</strong> contos de fada”. Essa insistência na incerteza<br />
como uma exigência do estranho possibilitaria o filme<br />
Vampiro, mas excluiria o Exterminador do futuro, o<br />
qual desafia as leis da natureza mas deixa as do naturalismo<br />
de Hollywood discretamente intactas. Entretanto,<br />
os críticos têm repetidamente mostrado como,<br />
em sua leitura do conto de Hoffmann, “O homem de<br />
areia”, que constitui a espinha dorsal do ensaio, Freud<br />
consistentemente reprime a maior parte de seus aspectos<br />
estranhos a fim de identificar um único e coerente<br />
significado e justificar sua interpretação. Sua<br />
complexidade narrativa, a intensidade de sua retórica<br />
e suas repetidas cenas de violência ficam, todas, sem<br />
explicação, a fim de que ele possa estabelecer a verdade<br />
“científica” de sua tese de que sua estranheza é atribuível<br />
à “ansiedade que pertence ao complexo de<br />
castração da infância” (FREUD, 1985, p. 373).<br />
Ao mesmo tempo, observa Hélène Cixous (1976,<br />
p. 540), a parcialidade dessa leitura revela as próprias<br />
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