25.04.2013 Views

Pedagogia dos monstros - Apresentação

Pedagogia dos monstros - Apresentação

Pedagogia dos monstros - Apresentação

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

36<br />

Speculum naturale (31.126), a visita de um cinocéfalo<br />

hermafrodita à corte francesa. 14 Diz-se que seu órgão<br />

reprodutor masculino é desproporcionalmente grande,<br />

mas o monstro pode usar, à sua escolha, qualquer<br />

um <strong>dos</strong> sexos. Bruno Roy (1975, p. 77) assim escreve<br />

sobre esse fantástico híbrido: “Que advertência ele veio<br />

trazer ao rei? Ele veio para dar testemunho de normas<br />

sexuais... Ele corporificava a punição recebida por<br />

aqueles que violavam tabus sexuais”. Essa estranha<br />

criatura — uma combinação de categorias supostamente<br />

separadas, “masculina” e “feminina” — chega<br />

diante do rei Luís para validar a heterossexualidade,<br />

em detrimento da homossexualidade, com suas supostas<br />

inversões e transformações (“Equa fit equus”,<br />

um escritor latino declarou; “O cavalo torna-se uma<br />

égua”). 15 O estranho monstro com cabeça de cão é<br />

uma censura viva da ambigüidade de gênero e da anormalidade<br />

sexual, tal como o momento cultural de Vincent<br />

as define: heteronormalização encarnada.<br />

A raça tem sido, da Época Clássica ao século XX,<br />

um catalisador quase tão poderoso para a criação de<br />

<strong>monstros</strong> quanto a cultura, o gênero e a sexualidade. A<br />

África tornou-se desde cedo o outro significante do<br />

Ocidente, com o signo de sua diferença ontológica<br />

sendo constituído simplesmente pela cor da pele. De<br />

acordo com o mito grego do Phaeton, os habitantes<br />

da misteriosa e incerta Etiópia eram negros porque<br />

tinham sido queima<strong>dos</strong> pela passagem demasiado próxima<br />

do sol. O naturalista romano Plínio supunha que<br />

a pele não-branca era sintomática de uma completa<br />

diferença de temperamento e atribuía a escuridão da<br />

África ao clima; o intenso calor, dizia ele, tinha queimado<br />

a pele <strong>dos</strong> africanos e malformado seus corpos

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!