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Culturas Contemporâneas, Imaginário e Educação ... - Rima Editora

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194 <strong>Culturas</strong> <strong>Contemporâneas</strong>, <strong>Imaginário</strong> e <strong>Educação</strong>: Reflexões e Relatos de Pesquisa<br />

da em “Projeto Integrado” que se empenhava no “estudo do imaginário de escolas<br />

de primeiro grau”, canalizei meu trabalho para a escola inicialmente mencionada.<br />

Restou-me, então, dentro desse estudo antropológico sobre a organização<br />

educativa, estabelecer mediações entre as duas cotidianidades.<br />

Apresento, assim, detalhes únicos para mim, que diante de suas pequenezas<br />

e da banalidade de suas aparências remeteram-me à intensidade da vida diária da<br />

família cigana e a algumas intersecções com o universo escolar.<br />

Penso que, apesar de ter detectado expressões orais e gestuais entre os mais<br />

jovens, que se caracterizavam pelo aparente desapego às tradições ciganas, outros<br />

fatos “indicaram uma invariância das atitudes” grupais (Maffesoli, 1985: 23) que<br />

apontarei a seguir.<br />

Dentro de uma “dialética entre profano e sagrado” (Maffesoli, 1985: 26), presenciei<br />

a “hierofania” e sua “ambivalência” a partir da presença simultânea e contraditória<br />

de um “ícone” cristão ao lado da prática de um ritual pagão (de um lado, a<br />

imagem da santa e, do outro, o pacto que usava a torta – o trigo da torta doce mais<br />

o vinho). Na imagem da santa, identifico o “sistema D” – a duplicidade –, e no ritual<br />

do pacto vejo a comunhão, a fé obscura, o sagrado para o grupo. Tal qual esse<br />

mecanismo de utilizar a imagem da santa como forma de convencer a mim – representante<br />

da sociedade estigmatizadora – sobre suas boas intenções para o exercício<br />

de um “cristianismo tribal”, ardil semelhante foi utilizado no início da<br />

construção da edícula, bem como no que trata das diversas formas de trabalho da<br />

tribo – inclusive os possíveis pequenos furtos –, que Maffesoli (1985: 42) nos lembra<br />

como “a prática da ilegalidade versus a moral uniforme” da sociedade. Tais<br />

práticas, exercidas pelas mulheres ciganas, marido e crianças, faziam parte de um<br />

sistema D – da duplicidade grupal –, em que existia uma conivência grupal aliada<br />

a uma dupla intenção, responsável pelas múltiplas faces de um mesmo fato, uma<br />

delas cuidadosamente obscura. Como exemplo disto, lembro aqui o próprio desdobramento<br />

de personalidade grupal, que os levava a construir a casa ao lado da tenda<br />

– sinal da duplicidade que denotava uma “recusa branda” para com as segregações<br />

sofridas (Maffesoli, 1985).<br />

Posso dizer sobre a “nobreza de massa feita de cinismo” (Maffesoli, 1985:<br />

42), que levava os membros da tribo a se acomodarem aos valores menosprezados<br />

pela sociedade em geral, levando as ciganas inicialmente a me chamarem de<br />

“cumadre”, enquanto resultado do humor criado pela própria socialidade, como<br />

forma de resistência ao que poderia ameaçá-las.

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