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Culturas Contemporâneas, Imaginário e Educação ... - Rima Editora

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Conhecer é descolar rótulos 63<br />

porém muito familiar e que nos diz respeito diretamente neste capítulo, aparece<br />

na deliciosa obra Diário de escola, em que o professor e escritor francês Daniel<br />

Pennac (2008) relata como certos professores o condenaram a ser Daniel o Lerdo,<br />

ao passo que outros o liberaram desse destino para que ele viesse a se tornar<br />

Daniel, o apaixonado professor de literatura do liceu.<br />

No entanto, há sempre que se levar em conta, para além das visões do coletivo,<br />

a das subjetividades afetadas. Essa tem sido, aliás, a inclinação da escola da<br />

pós-modernidade, heroicamente focada no sucesso do indivíduo em detrimento<br />

do bem-estar do coletivo. Do lado do sujeito rotulado, a nomeação, fruto da associação<br />

entre afeto (positivo e/ou negativo) e imaginação, pode igualmente motivar<br />

tanto reações criativas quanto defensivas, agressivas e receptivas, de rejeição<br />

ou adesão, de repulsa ou entusiasmo, revestindo-se, portanto, de tonalidades ora<br />

positivas, ora perversas, perversas e positivas em dosagens variadas, mais perversas<br />

do que positivas quando se trata de uma escola que estimula intensamente a<br />

competição e o individualismo, e onde, portanto, o outro terminará por se tornar,<br />

mais dia, menos dia, um oponente na disputa por uma vaga no ensino superior<br />

público ou no mercado de trabalho.<br />

Nas relações entre alunos, o rótulo é a designação do coletivo (ou de um certo<br />

coletivo) ao sujeito e, portanto, uma manifestação do poder (afetivo e imaginativo)<br />

do grupo sobre ele. Dependendo de quem é rotulado e do modo pelo<br />

qual o fenômeno é tratado no interior do grupo, ou seja, do sentido conferido ao<br />

rótulo individual pela comunidade escolar, o mesmo pode simplesmente esvairse,<br />

na ausência de uma contrapartida, perder a graça, não “pegar”, também porque<br />

o sujeito rotulado recusa-se a entrar no molde que lhe é imposto de fora. E<br />

assim desmantela-se o jogo. Dissolvido em seu próprio vazio, o rótulo emudece.<br />

Neste caso, ele pode até mesmo mobilizar o sujeito rotulado a fortalecer sua identidade,<br />

querendo mostrar-se como acredita que, de fato, é, demonstrando com<br />

mais veemência os atributos que considera legítimos em si, para que os outros o<br />

reconheçam e assim reconheçam que erraram, ao rotulá-lo. Por outro lado, um<br />

rótulo pode “pegar” de tal modo que o sujeito passa a se identificar com ele, a<br />

carregá-lo consigo como uma cruz ou um distintivo de “pertença pelo avesso”<br />

a um coletivo que muitas vezes o rechaça. Afinal, como bem pontuou George<br />

Berkeley, “ser é ser percebido”. Neste sentido, o rotulado pode apegar-se ao rótulo<br />

como a uma tábua de salvação, já que se trata quase de uma marca de discriminação<br />

e reconhecimento (ainda que perverso) por parte do grupo. A esse<br />

sujeito caberá conformar-se ou deformar-se, para se amoldar à projeção do coletivo<br />

sobre ele.

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