05.05.2017 Views

3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

sucessiva e acintosa <strong>de</strong> mau atendimento ao consumi<strong>do</strong>r, geran<strong>do</strong> a perda <strong>de</strong> tempo útil, tem leva<strong>do</strong> a jurisprudência a dar seus<br />

primeiros passos para solucionar os dissabores experimenta<strong>do</strong>s por milhares <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res, passan<strong>do</strong> a admitir a reparação civil<br />

pela perda <strong>do</strong> tempo livre”.53<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, fato corriqueiro que é, po<strong>de</strong>r-se-ia imaginar que uma espera exagerada em fila <strong>de</strong> banco constituiria um<br />

mero aborrecimento, não caracteriza<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano mor<strong>al</strong> ao consumi<strong>do</strong>r. Todavia, o Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça tem entendi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

forma contrária, con<strong>de</strong>nan<strong>do</strong> a instituição pelo excesso <strong>de</strong> tempo perdi<strong>do</strong> pelo usuário <strong>do</strong> serviço. O <strong>de</strong>cisum foi assim publicada<br />

no Informativo n. 504 daquela Corte Superior:<br />

“O dano mor<strong>al</strong> <strong>de</strong>corrente da <strong>de</strong>mora no atendimento ao cliente não surge apenas da violação <strong>de</strong> legislação que estipula tempo<br />

máximo <strong>de</strong> espera, mas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da verificação <strong>do</strong>s fatos que causaram sofrimento <strong>al</strong>ém <strong>do</strong> norm<strong>al</strong> ao consumi<strong>do</strong>r. Isso porque a<br />

legislação que d<strong>et</strong>ermina o tempo máximo <strong>de</strong> espera tem cunho administrativo e trata da responsabilida<strong>de</strong> da instituição financeira<br />

perante a Administração Pública, a qu<strong>al</strong> po<strong>de</strong>rá aplicar sanções às instituições que <strong>de</strong>scumprirem a norma. Assim, a extrapolação <strong>do</strong><br />

tempo <strong>de</strong> espera <strong>de</strong>verá ser consi<strong>de</strong>rada como um <strong>do</strong>s elementos an<strong>al</strong>isa<strong>do</strong>s no momento da verificação da ocorrência <strong>do</strong> dano<br />

mor<strong>al</strong>. No caso, <strong>al</strong>ém da <strong>de</strong>mora <strong>de</strong>sarrazoada no atendimento, a cliente encontrava-se com a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>bilitada e permaneceu o<br />

tempo to<strong>do</strong> em pé, caracterizan<strong>do</strong> indiferença <strong>do</strong> banco quanto à situação. Para a Turma, o somatório <strong>de</strong>ssas circunstâncias<br />

caracterizou o dano mor<strong>al</strong>. Por fim, o colegia<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>u razoável o v<strong>al</strong>or da in<strong>de</strong>nização em R$ 3 mil, ante o caráter pedagógico da<br />

con<strong>de</strong>nação. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no Ag 1.331.848-SP, DJe 13.09.2011; REsp 1.234.549-SP, DJe 10.02.2012, e REsp<br />

598.183-DF, DJe 27.11.2006” (STJ – REsp 1.218.497/MT – Rel. Min. Sidnei Ben<strong>et</strong>i – j. 11.09.2012).<br />

Sem dúvidas, trata-se <strong>de</strong> uma importante mudança no pensamento <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>res brasileiros, bem como <strong>de</strong> expressiva<br />

ampliação da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> dano mor<strong>al</strong>.<br />

Cabe ress<strong>al</strong>tar que o tema foi obj<strong>et</strong>o <strong>de</strong> proposta <strong>de</strong> enuncia<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> da VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, em 2013, formulada por<br />

Wladimir Alcebía<strong>de</strong>s Marinho F<strong>al</strong>cão Cunha e que contou com o forte apoio <strong>de</strong>ste autor. A proposição tinha o seguinte teor: “As<br />

microlesões <strong>do</strong> dia a dia, relacionadas à <strong>al</strong>teração da rotina e/ou <strong>do</strong> curso natur<strong>al</strong> da vida <strong>do</strong> indivíduo em situações cotidianas <strong>do</strong><br />

tráfego jurídico-econômico comum (labor, consumo, lazer <strong>et</strong>c.), vin<strong>do</strong> a ocasionar aborrecimentos relevantes e não meros<br />

aborrecimentos, integram a acepção lata <strong>de</strong> dano, pois também significam lesão a interesses ou bens jurídicos liga<strong>do</strong>s à<br />

person<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> humana, ainda que em esc<strong>al</strong>a menos grave <strong>do</strong> que nos danos extrapatrimoniais. Como t<strong>al</strong>, tais lesões constituem<br />

danos extrapatrimoniais residuais e <strong>de</strong>vem também ser in<strong>de</strong>nizadas”. Infelizmente, por uma pequena margem <strong>de</strong> votos, a proposta<br />

não foi aprovada naquele evento, que se tornou o mais importante <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Brasileiro.<br />

De toda sorte, a questão <strong>de</strong>ve ser refl<strong>et</strong>ida pela comunida<strong>de</strong> jurídica nacion<strong>al</strong>, uma vez que o filtro relativo aos meros<br />

aborrecimentos muitas vezes tem afasta<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>s justos <strong>de</strong> reparação imateri<strong>al</strong> <strong>de</strong> direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

4.4.2.<br />

A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro<br />

A culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro é fator obstante <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> caus<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>, constituin<strong>do</strong> uma das exclu<strong>de</strong>ntes da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil consumerista. Não se po<strong>de</strong> esquecer que o nexo <strong>de</strong> caus<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> constitui a relação <strong>de</strong> causa e efeito entre a<br />

conduta <strong>do</strong> agente e o dano causa<strong>do</strong>.54 Assim sen<strong>do</strong>, as exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> nexo servem para qu<strong>al</strong>quer mod<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong>, seja ela subj<strong>et</strong>iva ou obj<strong>et</strong>iva.<br />

Apesar <strong>de</strong> a lei mencionar a culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro, seria melhor utilizar o termo fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro, uma vez que a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil pelo CDC, em regra, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> culpa, o que po<strong>de</strong> gerar a confusão. Na verda<strong>de</strong>, a expressão fato<br />

exclusivo é concebida em senti<strong>do</strong> amplo, a englobar a culpa (<strong>de</strong>srespeito a um <strong>de</strong>ver preexistente) e o risco assumi<strong>do</strong> por outrem<br />

(conduta acima da situação <strong>de</strong> norm<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>, uma iminência <strong>de</strong> perigo que po<strong>de</strong> causar dano). Muitos acórdãos, acertadamente,<br />

preferem a expressão ampla (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9059293-06.2004.8.26.0000 – Acórdão 4978699, Bauru – Vigésima<br />

Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rômolo Russo – j. 24.02.2011 – DJESP 23.03.2011; TJRS – Recurso Cível<br />

71002709756, Porto Alegre – Primeira Turma Recurs<strong>al</strong> Cível – Rel. Des. Leandro Raul Klippel – j. 26.08.2010 – DJERS<br />

02.09.2010; TJRJ – Apelação 2009.001.05440 – Primeira Câmara Cível – Rel. Des. Camilo Ribeiro Ruliere – j. 27.05.2009 –<br />

DORJ 14.07.2009, p. 55; e TJPR – Apelação Cível 0473497-4, Foz <strong>do</strong> Iguaçu – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Marcos <strong>de</strong> Luca<br />

Fanchin – DJPR 08.08.2008, p. 113).<br />

Deve ficar claro que esse terceiro <strong>de</strong>ve ser pessoa tot<strong>al</strong>mente estranha à relação jurídica estabelecida. Se houver qu<strong>al</strong>quer<br />

relação <strong>de</strong> confiança ou <strong>de</strong> pressuposição entre t<strong>al</strong> terceiro e o fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, o último respon<strong>de</strong>rá. Anote-se que, nos<br />

casos envolven<strong>do</strong> a oferta ou publicida<strong>de</strong>, há norma específica a respeito da relação <strong>de</strong> pressuposição <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s com a<br />

publicida<strong>de</strong>, no art. 34 da Lei 8.078/1990.<br />

Como bem observa Sérgio Cav<strong>al</strong>ieri Filho, “terceiro que integra a corrente produtiva, ainda que remotamente, não é terceiro; é<br />

fornece<strong>do</strong>r solidário. Assim, se a enfermeira, por <strong>de</strong>scui<strong>do</strong> ou intencion<strong>al</strong>mente, aplica medicamente erra<strong>do</strong> no paciente – ou em

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!