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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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Diante da inércia <strong>do</strong> juiz, portanto, as regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil continuarão a ser<br />

as mesmas <strong>do</strong> diploma processu<strong>al</strong> revoga<strong>do</strong>.<br />

Mesmo antes da consagração legislativa, o Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>u início à aplicação <strong>de</strong>ssa forma dinâmica <strong>de</strong><br />

distribuição <strong>do</strong> ônus da prova em ações civis por danos ambientais182, e também na tutela <strong>do</strong> i<strong>do</strong>so, em respeito aos arts. 2.º, 3.º e<br />

71 da Lei 10.741/2003 (Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so), no que asseguram aos litigantes maiores <strong>de</strong> 60 anos facilida<strong>de</strong> na produção <strong>de</strong> provas e<br />

a ef<strong>et</strong>ivação concr<strong>et</strong>a <strong>de</strong>sse direito 183 . No entanto, já existem <strong>de</strong>cisões recentes que a<strong>do</strong>tam a tese <strong>de</strong> forma mais ampla, ora<br />

v<strong>al</strong>en<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> interpr<strong>et</strong>ação sistemática da nossa legislação processu<strong>al</strong>, inclusive em bases constitucionais 184 , ora admitin<strong>do</strong> a<br />

flexibilização <strong>do</strong> sistema rígi<strong>do</strong> <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus probatório diante da insuficiência da regra ger<strong>al</strong> 185 .<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil a<strong>do</strong>ta essa forma dinâmica <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova. Conforme já menciona<strong>do</strong>,<br />

apesar <strong>de</strong> o art. 373, em seus <strong>do</strong>is incisos, rep<strong>et</strong>ir as regras contidas no art. 333 <strong>do</strong> CPC/1973, em seu § 1.º permite que o juiz, nos<br />

casos previstos em lei ou diante <strong>de</strong> peculiarida<strong>de</strong>s da causa, relacionadas à impossibilida<strong>de</strong> ou à excessiva dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprir o<br />

encargo ou à maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obtenção da prova <strong>do</strong> fato contrário, atribua, em <strong>de</strong>cisão fundamentada e com respeito ao<br />

princípio <strong>do</strong> contraditório, o ônus da prova <strong>de</strong> forma diversa.<br />

Consagra-se legislativamente a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ve ter o ônus da prova a parte que apresentar maior facilida<strong>de</strong> em produzir a<br />

prova e se livrar <strong>do</strong> encargo. Como essa maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> caso concr<strong>et</strong>o, cabe ao juiz fazer a análise e d<strong>et</strong>erminar<br />

qu<strong>al</strong> o ônus <strong>de</strong> cada parte no processo. Registre-se que, diante da omissão <strong>do</strong> juiz, as regras continuaram a ser aplicadas como<br />

sempre foram sob a égi<strong>de</strong> <strong>do</strong> CPC/1973, ou seja, caberá ao autor o ônus <strong>de</strong> provar os fatos constitutivos <strong>de</strong> seu direito e ao réu, os<br />

fatos impeditivos, modificativos e extintivos.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, o sistema brasileiro passou a ser misto, sen<strong>do</strong> possível aplicar ao caso concr<strong>et</strong>o tanto o sistema flexível<br />

da distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova como o sistema rígi<strong>do</strong> da distribuição leg<strong>al</strong>. Tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da iniciativa <strong>do</strong> juiz, que<br />

não estará obriga<strong>do</strong> a fazer distribuição <strong>do</strong> ônus probatório <strong>de</strong> forma diferente daquela prevista na lei.<br />

Interessante e elogiável a vedação a essa inversão contida no § 2.º <strong>do</strong> dispositivo ora comenta<strong>do</strong>, proibin<strong>do</strong>-a sempre que<br />

possa gerar situação em que a <strong>de</strong>sincumbência <strong>do</strong> encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. A norma é<br />

elogiável porque a técnica <strong>de</strong> distribuição dinâmica da prova não se presta a tornar uma das partes vitoriosa por onerar a parte<br />

contrária com encargo <strong>do</strong> qu<strong>al</strong> ela não terá como se <strong>de</strong>sincumbir. A nova sistemática <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova serve para<br />

facilitar a produção da prova, e não para fixar a priori vence<strong>do</strong>res e venci<strong>do</strong>s. Nesse senti<strong>do</strong>, interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior<br />

Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça quanto à inversão prevista no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC186.<br />

Apesar <strong>de</strong> o art. 373, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC prever a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz atribuir o ônus da prova “<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diverso”,<br />

natur<strong>al</strong>mente a regra trata da inversão <strong>do</strong> ônus da prova, até porque, sen<strong>do</strong> este distribuí<strong>do</strong> entre autor e réu, o mo<strong>do</strong> diverso só<br />

po<strong>de</strong> significar a inversão da regra leg<strong>al</strong>. Tanto assim que o dispositivo expressamente se refere aos casos previstos em lei como<br />

umas das hipóteses da fixação “<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diverso”, e esses casos são justamente os <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

10.7.3.<br />

Inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

Existem três espécies <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova: (a) convencion<strong>al</strong>; (b) leg<strong>al</strong>; (c) judici<strong>al</strong>.<br />

10.7.3.1.<br />

Inversão convencion<strong>al</strong><br />

A inversão convencion<strong>al</strong> <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> um acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s entre as partes, que po<strong>de</strong>rá ocorrer antes ou durante o processo.<br />

Essa forma <strong>de</strong> inversão tem duas limitações previstas pelo art. 373, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong><br />

inversão quan<strong>do</strong>: (i) recair sobre direito indisponível da parte; (ii) tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício <strong>do</strong> direito.<br />

Essa segunda limitação leg<strong>al</strong> é aplicável nas hipóteses <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus probatório diante da <strong>al</strong>egação <strong>de</strong> fato negativo<br />

ind<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong>, cuja prova é chamada pela <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> “prova diabólica”187.<br />

Note-se que não é difícil a prova <strong>de</strong> um fato negativo d<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong>, bastan<strong>do</strong>, para tanto, a produção <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> um fato<br />

positivo d<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong> incompatível logicamente com o fato negativo. O problema é o fato negativo ind<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong> (fatos<br />

absolutamente negativos), porque nesse caso é até possível a prova <strong>de</strong> que a <strong>al</strong>egação <strong>de</strong>sse fato é f<strong>al</strong>sa, mas é impossível a<br />

produção <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> que ela seja verda<strong>de</strong>ira 188 .<br />

Essa forma <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova tem interessante particularida<strong>de</strong> no tocante ao direito consumerista em razão <strong>do</strong> art.<br />

51, VI, da Lei 8.078/1990, que prevê como sen<strong>do</strong> nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula contratu<strong>al</strong> que estabeleça inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, “o dispositivo <strong>do</strong> CDC ora an<strong>al</strong>isa<strong>do</strong> não proíbe a convenção sobre o ônus da prova, mas, sim, tacha<br />

<strong>de</strong> nula a convenção se trouxer prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r. Trata-se <strong>de</strong> norma s<strong>al</strong>utar, a<strong>do</strong>tada pelos mais mo<strong>de</strong>rnos sistemas jurídicos<br />

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