05.05.2017 Views

3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

tempo ou conv<strong>al</strong>escimento tempor<strong>al</strong>. Na verda<strong>de</strong>, é melhor concluir que a exigência <strong>de</strong> cheque-caução, mormente quan<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r já tem plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, nos casos <strong>de</strong> emergência médica ou quan<strong>do</strong> ausente justo motivo para a negativa <strong>de</strong> cobertura,<br />

configura uma prática ou cláusula abusiva que, por envolver matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, ocasiona a nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato correspon<strong>de</strong>nte,<br />

sem prejuízo <strong>de</strong> outras sanções caso da imputação civil <strong>do</strong>s danos suporta<strong>do</strong>s. Utiliza-se a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, com solução<br />

mais satisfatória aos consumi<strong>do</strong>res. Concluin<strong>do</strong> corr<strong>et</strong>amente <strong>de</strong>ssa maneira, colaciona-se, a título <strong>de</strong> exemplo:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> corréu que se recusou a cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> internação <strong>do</strong> autor, sob o fundamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento <strong>do</strong><br />

plano. F<strong>al</strong>ta <strong>de</strong> comunicação <strong>do</strong> associa<strong>do</strong> quanto ao <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento. Recusa que causou danos morais ao autor, que era i<strong>do</strong>so e<br />

estava com a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>bilitada. Fixação em R$ 9.000,00. Razoabilida<strong>de</strong>. Exigência <strong>de</strong> cheque-caução pela corré para prestar<br />

atendimento médico. Danos morais. Ocorrência. Fixação em R$ 2.000,00. Recurso <strong>do</strong> autor provi<strong>do</strong> em parte, improvi<strong>do</strong> o <strong>do</strong> réu. O<br />

corréu Centro Transmontano causou dano mor<strong>al</strong> ao autor, pessoa <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> e que sofria <strong>de</strong> sérios problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, ao negar-se a<br />

cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> internação, pois não o informara <strong>do</strong> <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento <strong>do</strong> hospit<strong>al</strong>. Ao que tu<strong>do</strong> indica, o hospit<strong>al</strong> condicionou<br />

a prestação <strong>de</strong> serviço médico à emissão <strong>de</strong> cheque caução, o que configura prática abusiva e, em face das circunstâncias,<br />

notadamente o fato <strong>de</strong> que paciente era i<strong>do</strong>so e sua internação era emergenci<strong>al</strong>, acarr<strong>et</strong>ou danos morais” (TJSP – Apelação 0131319-<br />

87.2006.8.26.0000 – Acórdão 4931640, São Paulo – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Jesus Lofrano – j. 08.02.2011 –<br />

DJESP 02.03.2011).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Relação <strong>de</strong> consumo. Hospit<strong>al</strong>. Situação <strong>de</strong> emergência. Cheque caução. Exigência para fins <strong>de</strong> internação.<br />

Prática abusiva. Aflição e angústia impostas ao consumi<strong>do</strong>r. Dano mor<strong>al</strong> configura<strong>do</strong>. Violação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

e <strong>de</strong> lei estadu<strong>al</strong>. Agravo r<strong>et</strong>i<strong>do</strong>. Cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa. Inocorrência. O juiz é o <strong>de</strong>stinatário da prova e está autoriza<strong>do</strong> a dispensar<br />

as <strong>de</strong>snecessárias ao <strong>de</strong>slin<strong>de</strong> da causa (CPC, art. 130). Não se configura cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa o julgamento antecipa<strong>do</strong> da li<strong>de</strong>,<br />

presentes as condições previstas no art. 330, inc. I, <strong>do</strong> CPC. A exigência <strong>de</strong> cheque-caução para que ocorra a internação hospit<strong>al</strong>ar <strong>de</strong><br />

paciente em esta<strong>do</strong> grave emergenci<strong>al</strong>, configura prática abusiva, ferin<strong>do</strong> as disposições <strong>do</strong> CDC. Configura ainda afronta à Lei<br />

Estadu<strong>al</strong> 3.426/2000, que proíbe a exigência <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito prévio <strong>de</strong> qu<strong>al</strong>quer natureza, para possibilitar internação <strong>de</strong> <strong>do</strong>ente em<br />

situação <strong>de</strong> urgência e emergência. Dano mor<strong>al</strong> configura<strong>do</strong>. V<strong>al</strong>or que aten<strong>de</strong> aos princípios reitores <strong>do</strong> instituto. Verba honorária<br />

bem fixada. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se aplicar a multa leg<strong>al</strong> por ausência <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> inici<strong>al</strong>, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> inovar em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso.<br />

Manutenção da sentença. Conhecimento e <strong>de</strong>sprovimento <strong>de</strong> ambos os recursos” (TJRJ – Apelação 2008.001.57406 – Décima<br />

Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Rogério <strong>de</strong> Oliveira Souza – j. 07.04.2009 – DORJ 13.04.2009, p. 167).<br />

Em suma, não se po<strong>de</strong> mais insistir na premissa <strong>de</strong> que o Código Civil é a via <strong>de</strong> solução para to<strong>do</strong>s os problemas práticos,<br />

para a cura <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os m<strong>al</strong>es, como pensavam os antigos civilistas. Em muitos casos, a corr<strong>et</strong>a solução <strong>de</strong> enquadramento está no<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Como outro exemplo <strong>de</strong> situação <strong>de</strong> lesão obj<strong>et</strong>iva ao consumi<strong>do</strong>r, cite-se a comum cobrança, nos contratos <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong><br />

imóveis a prazo, <strong>de</strong> juros no pé, ou seja, antes da entrega da obra. De qu<strong>al</strong>quer maneira, infelizmente, o Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong><br />

Justiça passou a enten<strong>de</strong>r, no ano <strong>de</strong> 2012, que a sua cobrança é legítima. Vejamos a publicação <strong>de</strong> acórdão constante <strong>do</strong><br />

Informativo n. 499 da Corte:<br />

“Juros compensatórios (‘juros no pé’). Incidência anterior à entrega das chaves. Compromisso <strong>de</strong> compra e venda. A Seção, por<br />

maioria, <strong>de</strong>cidiu que não é abusiva a cláusula <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> juros compensatórios inci<strong>de</strong>ntes em perío<strong>do</strong> anterior à entrega das<br />

chaves nos contratos <strong>de</strong> compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóveis em construção sob o regime <strong>de</strong> incorporação imobiliária.<br />

Observou o Min. Antonio Carlos Ferreira que, a rigor, o pagamento pela compra <strong>de</strong> um imóvel em fase <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>veria ser feito<br />

à vista. Não obstante, em favorecimento financeiro ao compra<strong>do</strong>r, o incorpora<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> estipular o adimplemento da obrigação<br />

mediante o parcelamento <strong>do</strong> preço, inclusive, em regra, a prazos que vão <strong>al</strong>ém <strong>do</strong> tempo previsto para o término da obra. Em t<strong>al</strong><br />

hipótese, afigura-se legítima a cobrança <strong>do</strong>s juros compensatórios, pois o incorpora<strong>do</strong>r, <strong>al</strong>ém <strong>de</strong> assumir os riscos <strong>do</strong><br />

empreendimento, antecipa os recursos para o seu regular andamento. Destacou-se que seria injusto pagar na compra parcelada o<br />

mesmo v<strong>al</strong>or correspon<strong>de</strong>nte da compra à vista. Acrescentou-se, ainda, que, sen<strong>do</strong> esses juros compensatórios um <strong>do</strong>s custos<br />

financeiros da incorporação imobiliária suporta<strong>do</strong>s pelo adquirente, <strong>de</strong>ve ser convenciona<strong>do</strong> expressamente no contrato ou incluí<strong>do</strong><br />

no preço fin<strong>al</strong> da obra. Concluiu-se que, para a segurança <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em observância ao direito <strong>de</strong> informação insculpi<strong>do</strong> no art.<br />

6º, II, <strong>do</strong> CDC, é conveniente a previsão expressa <strong>do</strong>s juros compensatórios sobre to<strong>do</strong> o v<strong>al</strong>or parcela<strong>do</strong> na aquisição <strong>do</strong> bem,<br />

permitin<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ssa forma, o controle pelo Judiciário. Além disso, afirmou o Min. Antonio Carlos Ferreira que se esses juros não<br />

pu<strong>de</strong>rem ser convenciona<strong>do</strong>s no contrato, serão incluí<strong>do</strong>s no preço fin<strong>al</strong> da obra e suporta<strong>do</strong>s pelo adquirente, sen<strong>do</strong> <strong>do</strong>sa<strong>do</strong>s, porém,<br />

<strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a boa ou má intenção <strong>do</strong> incorpora<strong>do</strong>r. Com base nesse entendimento, <strong>de</strong>u-se provimento aos embargos <strong>de</strong><br />

divergência para reconhecer a leg<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> da cláusula contratu<strong>al</strong> que previu a cobrança <strong>do</strong>s juros compensatórios <strong>de</strong> 1% a partir da<br />

assinatura <strong>do</strong> contrato” (STJ – EREsp 670.117-PB – Rel. originário Min. Sidnei Ben<strong>et</strong>i – Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos<br />

Ferreira – j. 13.06.2012).<br />

Trata-se <strong>de</strong> mais uma <strong>de</strong>cisão da Corte Superior à qu<strong>al</strong> não se filia, por representar clara afronta ao dispositivo <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em análise. A onerosida<strong>de</strong> excessiva da previsão contratu<strong>al</strong> acima mencionada é clara e crist<strong>al</strong>ina.<br />

Infelizmente, a questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> t<strong>al</strong> forma naquele Tribun<strong>al</strong> que, em 2015, publicou-se ementa por meio da ferramenta

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!