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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Recurso especi<strong>al</strong>. Cheque furta<strong>do</strong>. Devolução por motivo <strong>de</strong> conta encerrada. F<strong>al</strong>ta <strong>de</strong> conferência da autenticida<strong>de</strong><br />

da assinatura. Protesto in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Inscrição no cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. Dano mor<strong>al</strong>. Configuração. Culpa concorrente. A f<strong>al</strong>ta <strong>de</strong><br />

diligência da instituição financeira em conferir a autenticida<strong>de</strong> da assinatura <strong>do</strong> emitente <strong>do</strong> título, mesmo quan<strong>do</strong> já encerrada a<br />

conta e ainda que o banco não tenha recebi<strong>do</strong> aviso <strong>de</strong> furto <strong>do</strong> cheque, enseja a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar os danos morais<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> protesto in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> e da inscrição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r nos cadastros <strong>de</strong> inadimplentes. Prece<strong>de</strong>ntes. Consi<strong>de</strong>radas as<br />

peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> processo, caracteriza-se hipótese <strong>de</strong> culpa concorrente quan<strong>do</strong> a conduta da vítima contribui para a ocorrência <strong>do</strong><br />

ilícito, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, por certo, a in<strong>de</strong>nização aten<strong>de</strong>r ao critério da proporcion<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>. Recurso especi<strong>al</strong> parci<strong>al</strong>mente conheci<strong>do</strong> e nessa<br />

parte provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 712.591/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 16.11.2006 – DJ 04.12.2006, p. 300).<br />

Em aresto <strong>de</strong> 2013, o mesmo Tribun<strong>al</strong> da Cidadania aplicou a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> risco concorrente em caso envolven<strong>do</strong> a<br />

responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva bancária, fundada no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Houve a redução <strong>do</strong> v<strong>al</strong>or reparatório pela<br />

conduta da vítima, uma pessoa jurídica consumi<strong>do</strong>ra, que contribuiu para o próprio prejuízo pela f<strong>al</strong>ta <strong>de</strong> diligência na emissão <strong>de</strong><br />

títulos <strong>de</strong> crédito. Vejamos a publicação da ementa <strong>de</strong>sse instigante acórdão, que cita trechos <strong>de</strong>ste livro e toda a evolução aqui<br />

exposta, especi<strong>al</strong>mente a percebida nas Jornadas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil:<br />

“Recursos especiais. Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> concorrente. 1) Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização movida por correntista contra o banco.<br />

Pagamento <strong>de</strong> cheques emiti<strong>do</strong>s mediante assinatura apenas <strong>de</strong> gerente, Quan<strong>do</strong> exigida a assinatura <strong>de</strong>ste e <strong>de</strong> mais um dir<strong>et</strong>or.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva <strong>do</strong> banco. 2) Responsabilida<strong>de</strong> concorrente reconhecida. In<strong>de</strong>nização à m<strong>et</strong>a<strong>de</strong>. 3) Correção mon<strong>et</strong>ária a<br />

partir da data <strong>de</strong> cada cheque in<strong>de</strong>vidamente pago. 4) Juros <strong>de</strong> mora conta<strong>do</strong>s a partir da citação e não <strong>de</strong> cada pagamento <strong>de</strong><br />

cheque. Inadimplemento contratu<strong>al</strong> e não in<strong>de</strong>nização por ato ilícito. 5) Lucros cessantes <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s. Ativida<strong>de</strong> empresari<strong>al</strong> pressupõe<br />

uso produtivo <strong>do</strong> dinheiro e não permanência contemplativa em conta bancária. 6) Liquidação <strong>de</strong> lucros cessantes por arbitramento.<br />

7) Aplicação <strong>do</strong> direito à espécie impossível, pois pleiteada somente na peça extraprocessu<strong>al</strong> inform<strong>al</strong> <strong>do</strong> memori<strong>al</strong>, quan<strong>do</strong><br />

impossível observar o contraditório. 8) Nulida<strong>de</strong> inexistente na dispensa <strong>de</strong> prova or<strong>al</strong>, pois testemunhos jamais influiriam na<br />

conclusão <strong>do</strong> julgamento. 9) Recursos especiais improvi<strong>do</strong>s. 1. Há responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva <strong>do</strong> banco, que paga cheques assina<strong>do</strong>s<br />

apenas por gerente, quan<strong>do</strong> exigível dupla assinatura, também assinatura <strong>de</strong> um dir<strong>et</strong>or. Aplicação <strong>do</strong> art. 24 <strong>do</strong> CDC. 2. A<br />

responsabilida<strong>de</strong> concorrente é admissível, ainda que no caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> há<br />

responsabilida<strong>de</strong> subj<strong>et</strong>iva patente e irrecusável também <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não se exigin<strong>do</strong>, no caso, a exclusivida<strong>de</strong> da culpa. (…)”<br />

(STJ – REsp 1.349.894/SP – Rel. Min. Sidnei Ben<strong>et</strong>i – Terceira Turma – j. 04.04.2013 – DJe 11.04.2013).<br />

Insta anotar que o próprio codifica<strong>do</strong>r civil brasileiro admitiu a discussão da culpa concorrente da vítima, ou melhor,<br />

tecnicamente, <strong>de</strong> fato concorrente da vítima, em um caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva, a saber, na responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

transporta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> pessoas. O dispositivo em questão, art. 738 <strong>do</strong> Código Civil, enuncia, em seu caput, que a pessoa transportada<br />

<strong>de</strong>ve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transporta<strong>do</strong>r, constantes no bilh<strong>et</strong>e ou afixadas à vista <strong>do</strong>s usuários. Ato contínuo,<br />

<strong>de</strong>ve abster-se <strong>de</strong> quaisquer atos que causem incômo<strong>do</strong> ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, dificultem ou impeçam<br />

a execução norm<strong>al</strong> <strong>do</strong> serviço. A norma é compl<strong>et</strong>ada pelo seu parágrafo único, segun<strong>do</strong> o qu<strong>al</strong>, se o prejuízo sofri<strong>do</strong> pela pessoa<br />

transportada for atribuível à transgressão <strong>de</strong> normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente a in<strong>de</strong>nização, na<br />

medida em que a vítima houver concorri<strong>do</strong> para a ocorrência <strong>do</strong> dano. Na jurisprudência, vários são os acórdãos que reconhecem o<br />

fato concorrente da vítima como atenuante da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r, que é subm<strong>et</strong>ida ao CDC.<br />

Cite-se o entendimento relativo ao pingente <strong>de</strong> trem, aquele passageiro que vai pendura<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong> <strong>de</strong> fora <strong>do</strong> vagão, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong><br />

ser ger<strong>al</strong>mente nota<strong>do</strong> por quem opera a máquina. Por vezes, fica ele pendura<strong>do</strong> por pura diversão, mas, em <strong>al</strong>gumas situações, o<br />

faz por necessida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> ao fato <strong>de</strong> o vagão estar lota<strong>do</strong>. Deve ficar claro que a sua atitu<strong>de</strong> não se confun<strong>de</strong> com a <strong>do</strong> surfista <strong>de</strong><br />

trem, o qu<strong>al</strong> é aquele que viaja em cima <strong>do</strong> vagão. A respeito <strong>do</strong> pingente, o Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça tem entendi<strong>do</strong> pela<br />

presença da culpa concorrente da vítima, não se excluin<strong>do</strong> tot<strong>al</strong>mente a responsabilida<strong>de</strong> da empresa férrea, mas atenuan<strong>do</strong>-a (STJ<br />

– REsp 226.348/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 19.09.2006 – DJ 23.10.2006, p. 294; e STJ – REsp 324.166/SP<br />

– Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 18.10.2001 – DJ 18.02.2002, p. 455). Existem <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> Tribunais<br />

Estaduais na mesma linha, julgan<strong>do</strong> pela contribuição das condutas (ilustran<strong>do</strong>: TJRJ – Acórdão 2006.001.54574 – Décima Sexta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Conv. Pedro Freire Raguen<strong>et</strong> – j. 09.01.2007).<br />

Po<strong>de</strong> até parecer que a admissão <strong>do</strong> fato concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r constitui um argumento contrário à tutela <strong>de</strong> seus direitos,<br />

violan<strong>do</strong> a proteção constitucion<strong>al</strong> constante <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, <strong>do</strong> Texto Maior. Trata-se <strong>de</strong> um engano, uma vez que, em<br />

<strong>al</strong>gumas situações, o fato ou o risco concorrente constitui um argumento para proteção <strong>do</strong>s vulneráveis negociais, pela divisão<br />

justa <strong>do</strong>s custos sociais da responsabilida<strong>de</strong> civil. Isso po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> pelo próximo tópico <strong>de</strong>ste capítulo, que enfrenta o<br />

problema da responsabilida<strong>de</strong> civil que surge <strong>do</strong> tabagismo.

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