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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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d<strong>et</strong>erminadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente <strong>de</strong> um produto ou serviço possa ser equiparada à condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>ra,<br />

por apresentar frente ao fornece<strong>do</strong>r <strong>al</strong>guma vulnerabilida<strong>de</strong>, que constitui o princípio-motor da política nacion<strong>al</strong> das relações <strong>de</strong><br />

consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, <strong>do</strong> CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumi<strong>do</strong>r. A <strong>do</strong>utrina<br />

tradicion<strong>al</strong>mente aponta a existência <strong>de</strong> três mod<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>: técnica (ausência <strong>de</strong> conhecimento específico acerca<br />

<strong>do</strong> produto ou serviço obj<strong>et</strong>o <strong>de</strong> consumo), jurídica (f<strong>al</strong>ta <strong>de</strong> conhecimento jurídico, contábil ou econômico e <strong>de</strong> seus reflexos na<br />

relação <strong>de</strong> consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o coloca<br />

em pé <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigu<strong>al</strong>da<strong>de</strong> frente ao fornece<strong>do</strong>r). Mais recentemente, tem se incluí<strong>do</strong> também a vulnerabilida<strong>de</strong> informacion<strong>al</strong> (da<strong>do</strong>s<br />

insuficientes sobre o produto ou serviço capazes <strong>de</strong> influenciar no processo <strong>de</strong>cisório <strong>de</strong> compra). Além disso, a casuística po<strong>de</strong>rá<br />

apresentar novas formas <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> aptas a atrair a incidência <strong>do</strong> CDC à relação <strong>de</strong> consumo. Numa relação<br />

interempresari<strong>al</strong>, para <strong>al</strong>ém das hipóteses <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> já consagradas pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência, a relação <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> uma das partes frente à outra po<strong>de</strong>, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilida<strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>ra da aplicação <strong>do</strong><br />

CDC, mitigan<strong>do</strong> os rigores da teoria fin<strong>al</strong>ista e autorizan<strong>do</strong> a equiparação da pessoa jurídica compra<strong>do</strong>ra à condição <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>ra” (STJ – REsp 1.195.642/RJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 13.11.2012).<br />

O julgamento é louvável, por também levar em conta a <strong>de</strong>pendência econômica nas relações interempresariais como um<br />

critério amplia<strong>do</strong>r das relações <strong>de</strong> consumo. Lamenta-se apenas a utilização <strong>do</strong> termo “vulnerabilida<strong>de</strong>”, pois, na opinio <strong>de</strong>ste<br />

autor, o que há <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> é a hipossuficiência – conceito fático –, e não a vulnerabilida<strong>de</strong> – conceito jurídico <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong><br />

uma presunção absoluta da condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

d) Teoria minim<strong>al</strong>ista<br />

A par das teorias relativas ao consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong> ser exposta uma corrente chamada <strong>de</strong> minim<strong>al</strong>ista, que não vê a existência da<br />

relação <strong>de</strong> consumo em casos em que ela po<strong>de</strong> ser claramente percebida. Entre os a<strong>de</strong>ptos <strong>de</strong>ssa corrente, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s<br />

aqueles que enten<strong>de</strong>m que não haveria uma relação <strong>de</strong> consumo entre banco e correntista, o que po<strong>de</strong> ser claramente percebi<strong>do</strong> da<br />

leitura <strong>do</strong> art. 3º, § 2º, da Lei 8.078/1990, segun<strong>do</strong> o qu<strong>al</strong> o serviço <strong>de</strong> crédito é abrangi<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>.<br />

Dessa forma se posicionavam os juristas Ives Gandra da Silva Martins e Arnol<strong>do</strong> W<strong>al</strong>d, signatários da p<strong>et</strong>ição inici<strong>al</strong> da ADIn<br />

2.591, que pr<strong>et</strong>endia afastar a incidência das normas consumeristas para os contratos bancários.<br />

Para o bem, o Supremo Tribun<strong>al</strong> Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> acabou por enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma contrária ao pedi<strong>do</strong>, confirman<strong>do</strong> o que já constava da<br />

Súmula 297 <strong>do</strong> Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça, in verbis: “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável às instituições<br />

financeiras”. A corrente minim<strong>al</strong>ista restou, assim, tot<strong>al</strong>mente <strong>de</strong>rrotada no âmbito <strong>do</strong>s nossos Tribunais.<br />

De toda sorte, anote-se que <strong>al</strong>guns julga<strong>do</strong>s apontam ser a teoria minim<strong>al</strong>ista sinônima da teoria fin<strong>al</strong>ista, em questões<br />

envolven<strong>do</strong> justamente os contratos bancários:<br />

“Contrato bancário. Relação <strong>de</strong> consumo. Destinatário fin<strong>al</strong>. Art. 2º <strong>do</strong> CDC. Não caracterização. Teoria minim<strong>al</strong>ista ou fin<strong>al</strong>ista.<br />

Não caracterizada a condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário fin<strong>al</strong>, não há que se f<strong>al</strong>ar em aplicação das regras contidas na Lei <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Negócios jurídicos bancários que tinham por fin<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> fomentar as ativida<strong>de</strong>s empresariais <strong>de</strong>senvolvidas pela empresa coapelante.<br />

Inexistência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo. Negócios bancários que não foram celebra<strong>do</strong>s por empresa na qu<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatária fin<strong>al</strong>.<br />

Juros remuneratórios. Não <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> ef<strong>et</strong>iva contratação. Limitação <strong>do</strong>s juros remuneratórios à taxa média <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> à<br />

época da contratação. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ. Comissão <strong>de</strong> permanência. Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não cumulada com<br />

outros encargos. Renovação automática <strong>do</strong> contrato. Possibilida<strong>de</strong>. Autores que não <strong>de</strong>monstraram a intenção <strong>de</strong> impedir a<br />

renovação da avença. Sentença mantida. Recursos não provi<strong>do</strong>s” (TJSP – Apelação 0008514-82.2008.8.26.0576 – Acórdão<br />

4981658, São José <strong>do</strong> Rio Pr<strong>et</strong>o – Trigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Roberto Nussinkis Mac Cracken – j.<br />

10.02.2011 – DJESP 16.03.2011).<br />

“Cédula <strong>de</strong> credito bancário. Alegação <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perícia. A matéria discutida em juízo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> interpr<strong>et</strong>ação <strong>de</strong> cláusula<br />

<strong>de</strong> negócio jurídico bancário. Desnecessária a produção <strong>de</strong> outras provas, <strong>al</strong>ém daquelas já existentes nos autos. Preliminar afastada.<br />

Cédula <strong>de</strong> crédito bancário. Relação <strong>de</strong> consumo. Destinatário fin<strong>al</strong>. Art. 2º <strong>do</strong> CDC. Não caracterização. Teoria minim<strong>al</strong>ista ou<br />

fin<strong>al</strong>ista. Não caracterizada a condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário fin<strong>al</strong>, não há que se f<strong>al</strong>ar em aplicação das regras contidas na Lei <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Cédula <strong>de</strong> crédito bancário <strong>de</strong> capit<strong>al</strong> <strong>de</strong> giro que tem por fin<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> fomentar as ativida<strong>de</strong>s empresariais <strong>de</strong>senvolvidas<br />

pela empresa coapelante. Inexistência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo. Negócio bancário que não foi celebra<strong>do</strong> por empresa na qu<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>stinatária fin<strong>al</strong>. Se não impugna<strong>do</strong> ou discuti<strong>do</strong> no momento apropria<strong>do</strong> não autoriza ao julga<strong>do</strong>r seu conhecimento <strong>de</strong> ofício.<br />

Súmula 381 <strong>do</strong> STJ. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação Cível 990.10.164057-0 – Acórdão 4821431, Bragança Paulista –<br />

Trigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Roberto Nussinkis Mac Cracken – j. 11.11.2010 – DJESP 14.12.2010).<br />

A conclusão da comparação das teorias fin<strong>al</strong>ista e minim<strong>al</strong>ista parece representar um engano. Além disso, diante <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s<br />

transcritos, <strong>de</strong>ve ser feita a ress<strong>al</strong>va <strong>de</strong> que <strong>al</strong>gumas <strong>de</strong>cisões aplicam a teoria maxim<strong>al</strong>ista – ou a teoria fin<strong>al</strong>ista aprofundada – nas<br />

hipóteses em que pequenas empresas ou empresários individuais celebram contratos <strong>de</strong> empréstimos para obter capit<strong>al</strong> para a sua<br />

ativida<strong>de</strong>. Vejamos:

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