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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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da carência econômica <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles. Note-se que, nesse caso, sen<strong>do</strong> indivisível o direito, não se admitiria que essa i<strong>de</strong>ntificação e<br />

comprovação fossem reservadas ao momento da execução, pois seria impossível a <strong>de</strong>cisão favorecer somente parcela <strong>do</strong> grupo,<br />

classe ou categoria.<br />

Há no acórdão ora an<strong>al</strong>isa<strong>do</strong> a menção da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a Defensoria Pública executar a sentença individu<strong>al</strong>mente em<br />

favor <strong>de</strong> quem não comprovar a hipossuficiência econômica, o que parece razoável, mas em nada interfere em sua legitimida<strong>de</strong><br />

para a propositura da ação col<strong>et</strong>iva, ainda que a tutela buscada possa tutelar também quem não é hipossuficiente econômico. A<br />

solução é perfeita porque numa tutela individu<strong>al</strong> não po<strong>de</strong> a Defensoria Pública atuar por quem não provar sua situação <strong>de</strong> pobreza<br />

jurídica.<br />

Registre-se que, em voto venci<strong>do</strong> proferi<strong>do</strong> no julgamento <strong>do</strong> Recurso Especi<strong>al</strong> 912.849/RS, o Ministro Teori Albino Zavascki,<br />

seguin<strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong> relator da apelação no caso concr<strong>et</strong>o, curiosamente o processu<strong>al</strong>ista Araken <strong>de</strong> Assis, já havia entendi<strong>do</strong><br />

pela legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, limitan<strong>do</strong> a proteção<br />

jurisdicion<strong>al</strong> obtida somente àqueles que <strong>de</strong>monstrassem individu<strong>al</strong>mente, em fase <strong>de</strong> execução, sua condição <strong>de</strong> economicamente<br />

necessita<strong>do</strong> 167 .<br />

Como bem <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> por ab<strong>al</strong>izada <strong>do</strong>utrina, essa limitação subj<strong>et</strong>iva pr<strong>et</strong>endida pelo entendimento ora examina<strong>do</strong> exigiria<br />

<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que não são economicamente hipossuficientes, a propositura <strong>de</strong> nova ação – col<strong>et</strong>iva ou individu<strong>al</strong> –, o que<br />

contraria os princípios da economia processu<strong>al</strong> e da harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s 168 . A<strong>de</strong>mais, o entendimento mistura<br />

in<strong>de</strong>vidamente a questão <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> e da eficácia subj<strong>et</strong>iva da coisa julgada col<strong>et</strong>iva, sen<strong>do</strong> irrelevante para a d<strong>et</strong>erminação<br />

<strong>do</strong>s beneficia<strong>do</strong>s quem foi o autor da ação col<strong>et</strong>iva. Se assim não fosse, ação col<strong>et</strong>iva movida por associação <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res não po<strong>de</strong>ria beneficiar individu<strong>al</strong>mente sujeito não consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> tecnicamente consumi<strong>do</strong>r, o que evi<strong>de</strong>ntemente não<br />

acontece nem <strong>de</strong>ve ocorrer.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> o entendimento <strong>do</strong> Supremo Tribun<strong>al</strong> Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> é superior, porque ele não impe<strong>de</strong> que a sentença col<strong>et</strong>iva<br />

favoreça também quem não é hipossuficiente econômico, apenas r<strong>et</strong>ira da Defensoria Pública a legitimida<strong>de</strong> ativa para executar a<br />

sentença em favor <strong>do</strong> indivíduo que não <strong>de</strong>monstrar seu esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> pobreza.<br />

No voto prolata<strong>do</strong> pelo Ministro Barroso, há expressa menção à ilegitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública na hipótese <strong>de</strong> já ser<br />

possível i<strong>de</strong>ntificar que os tutela<strong>do</strong>s, como grupo, classe, categoria ou individu<strong>al</strong>mente, não são hipossuficientes, como ocorreria<br />

numa ação para tutelar os associa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Iate Clube ou os correntistas <strong>do</strong> Itaú Personn<strong>al</strong>ité. Nesse senti<strong>do</strong>, inclusive, há <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong><br />

Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela ilegitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública em ação col<strong>et</strong>iva que visava tutelar<br />

interesses <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos contratantes <strong>de</strong> planos priva<strong>do</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>169.<br />

É tradicion<strong>al</strong> na <strong>do</strong>utrina a divisão da função da Defensoria Pública em típica e atípica. Há unanimida<strong>de</strong> em apontar como<br />

função típica a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s economicamente necessita<strong>do</strong>s, existin<strong>do</strong> certa divergência no que viria a ser sua função<br />

atípica. Essas divergências são mais <strong>de</strong> forma <strong>do</strong> que <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong>, pois atinentes à forma <strong>de</strong> classificação <strong>de</strong>ssa função, mas ainda<br />

assim merecem breves comentários.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, qu<strong>al</strong>quer atuação que, apesar <strong>de</strong> permitida por previsão leg<strong>al</strong>, não seja em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> economicamente<br />

necessita<strong>do</strong> representa uma atuação atípica 170 , cujos clássicos exemplos são a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> acusa<strong>do</strong>s no processo pen<strong>al</strong> (art. 4.º, XIV e<br />

XV, da LC 80/1994), com amparo nos arts. 261 e 263 <strong>do</strong> CPP, e a cura<strong>do</strong>ria especi<strong>al</strong> nas hipóteses previstas no art. 72, II, <strong>do</strong> Novo<br />

CPC e admitida expressamente pelo art. 4.º, XVI, da LC 80/1994.<br />

Em ambos os casos menciona<strong>do</strong>s a condição econômica <strong>do</strong> sujeito tutela<strong>do</strong> pela Defensoria Pública é irrelevante, pois são<br />

outras as razões que d<strong>et</strong>erminam sua participação no processo. Uma eventu<strong>al</strong> legitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública<br />

absolutamente dissociada da hipossuficiência econômica seria possível, portanto, em razão <strong>de</strong> suas funções atípicas.<br />

Outra parcela da <strong>do</strong>utrina, ao especificar a função atípica <strong>de</strong>senvolvida pela Defensoria Pública, divi<strong>de</strong>-a em duas espécies:<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> hipossuficiente jurídico e <strong>do</strong> hipossuficiente organizacion<strong>al</strong>, o que se obtém por meio <strong>do</strong> <strong>al</strong>argamento <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong><br />

necessita<strong>do</strong>s, <strong>al</strong>vo constitucion<strong>al</strong> <strong>de</strong> tutela nos termos <strong>do</strong> art. 134 da CF.<br />

Alarga-se o conceito <strong>de</strong> necessita<strong>do</strong>s para, <strong>al</strong>ém <strong>do</strong>s tradicionais carentes <strong>de</strong> recursos econômicos, incluírem-se também os<br />

necessita<strong>do</strong>s jurídicos, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que caberia à Defensoria Pública, quan<strong>do</strong> previsto em lei, garantir a d<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong>s sujeitos,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua condição econômica, o pleno exercício da ampla <strong>de</strong>fesa e <strong>do</strong> contraditório171. Costuma-se indicar como<br />

exemplos as já citadas atuações em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu no processo pen<strong>al</strong> e da cura<strong>do</strong>ria especi<strong>al</strong> exercida no processo civil.<br />

Também incluem-se entre os necessita<strong>do</strong>s aqueles que têm re<strong>al</strong> dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se organizar para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem seus direitos em<br />

juízo e fora <strong>de</strong>le. Nesse caso, passa-se a f<strong>al</strong>ar em necessita<strong>do</strong>s organizacionais, hipossuficiência <strong>de</strong>rivada da vulnerabilida<strong>de</strong> das<br />

pessoas em face das relações complexas existentes na socieda<strong>de</strong> contemporânea, com especi<strong>al</strong> ênfase aos conflitos próprios da<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massa atu<strong>al</strong> 172 . Derivaria <strong>de</strong>ssa função atípica a legitimação da Defensoria Pública nas ações col<strong>et</strong>ivas.<br />

A tese, entr<strong>et</strong>anto, não é pacífica, existin<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina que, em <strong>al</strong>gum grau, continua a vincular a atuação da Defensoria Pública<br />

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