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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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esponsabilida<strong>de</strong> contratu<strong>al</strong>, <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> inadimplemento obrigacion<strong>al</strong>, tem os efeitos <strong>de</strong>scritos nos arts. 1.218 a 1.229.<br />

De mo<strong>do</strong> semelhante fez o Código Civil Português, <strong>de</strong> 1966, eis que a responsabilida<strong>de</strong> por fatos ilícitos e pelo risco consta<br />

<strong>do</strong>s arts. 483º a 510º, ao passo que a <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> não cumprimento das obrigações está entre os arts. 790º e 836º. De qu<strong>al</strong>quer<br />

forma, já há uma tentativa <strong>de</strong> unificação na legislação portuguesa, pela previsão da obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>mnização, entre os arts. 562º<br />

e 572º. De acor<strong>do</strong> com as lições <strong>de</strong> Antunes Varela, os trab<strong>al</strong>hos preparatórios da então nova legislação civil portuguesa colocaram<br />

em relevo os pontos <strong>de</strong> congruência entre os <strong>do</strong>is tipos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, o que culminou com a elaboração <strong>do</strong>s cita<strong>do</strong>s<br />

dispositivos, em um tratamento leg<strong>al</strong> em conjunto no tocante às consequências da responsabilida<strong>de</strong>. 2<br />

As codificações brasileiras foram pensadas na mesma esteira <strong>de</strong>ssa partilha m<strong>et</strong>o<strong>do</strong>lógica, a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> o cita<strong>do</strong> sistema du<strong>al</strong>ista.<br />

No Código Civil <strong>de</strong> 1916, a responsabilida<strong>de</strong> extracontratu<strong>al</strong>, a obrigação por atos ilícitos, estava entre os arts. 1.518 e 1.553; a<br />

responsabilida<strong>de</strong> contratu<strong>al</strong>, as consequências da inexecução das obrigações, nos arts. 1.056 a 1.058, compl<strong>et</strong>a<strong>do</strong>s pelos<br />

dispositivos relativos às perdas e danos (arts. 1.059 a 1.061) e aos juros legais (arts. 1.062 a 1.064). Isso sem f<strong>al</strong>ar no tratamento da<br />

cláusula pen<strong>al</strong>, <strong>de</strong>corrência natur<strong>al</strong> <strong>do</strong> inadimplemento, que era matéria <strong>do</strong>s coman<strong>do</strong>s anteriores (arts. 916 a 927). Além da<br />

divisão, o conceito estruturante <strong>de</strong> ato ilícito constava <strong>do</strong> art. 159 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> 1916.<br />

Na codificação brasileira <strong>de</strong> 2002, mais bem organizada, o Título IX <strong>do</strong> Livro das Obrigações recebeu o nome “Da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil”, tratan<strong>do</strong>, a princípio, da responsabilida<strong>de</strong> extracontratu<strong>al</strong> (arts. 927 a 954), uma vez que o seu dispositivo<br />

inaugur<strong>al</strong> faz menção ao ato ilícito (art. 186) e ao abuso <strong>de</strong> direito (art. 187). De outro mo<strong>do</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> contratu<strong>al</strong>,<br />

<strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> inadimplemento das obrigações, consta <strong>do</strong>s arts. 389 a 420 <strong>do</strong> CC/2002. Na Parte Ger<strong>al</strong>, assim como no Código<br />

Civil anterior, há o conceito <strong>de</strong> ato ilícito (art. 186), ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito (art. 187), categorias básicas da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Apesar da consolidação <strong>de</strong>ssa s<strong>et</strong>orização, como bem afirma Fernan<strong>do</strong> Noronha, a divisão da responsabilida<strong>de</strong> civil em<br />

extracontratu<strong>al</strong> e contratu<strong>al</strong> refl<strong>et</strong>e “um tempo <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>”, uma vez que os princípios e regramentos básicos que regem as duas<br />

supostas mod<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil são idênticos.3 Em senti<strong>do</strong> muito próximo, leciona Judith Martins-Costa que há um<br />

gran<strong>de</strong> questionamento acerca <strong>de</strong>ssa distinção, “pois não resiste à constatação <strong>de</strong> que, na mo<strong>de</strong>rna socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massas, ambas<br />

têm, a rigor, uma mesma fonte, o ‘contato soci<strong>al</strong>’, e obe<strong>de</strong>cem aos mesmos princípios, nascen<strong>do</strong> <strong>de</strong> um mesmo fato, qu<strong>al</strong> seja, a<br />

violação <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver jurídico preexistente”. 4<br />

O Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r representa uma superação <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>lo du<strong>al</strong> anterior, unifican<strong>do</strong> a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. Na verda<strong>de</strong>, pela Lei Consumerista, pouco importa se a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> um contrato ou<br />

não, pois o tratamento diferencia<strong>do</strong> se refere apenas aos produtos e serviços, enquadran<strong>do</strong>-se nos últimos a veiculação <strong>de</strong><br />

informações pela oferta e publicida<strong>de</strong> (Capítulo 6 <strong>de</strong>sta obra). 5 Por oportuno, <strong>de</strong>staque-se que, sem qu<strong>al</strong>quer distinção a respeito da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil, a Lei 8.078/1990 aplica-se à atu<strong>al</strong> problemática <strong>do</strong>s contratos coliga<strong>do</strong>s e <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres <strong>de</strong>les <strong>de</strong>correntes, tão<br />

comuns no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Tais negócios estão interliga<strong>do</strong>s por um ponto ou nexo <strong>de</strong> convergência, seja dir<strong>et</strong>o ou indir<strong>et</strong>o,<br />

presentes, por exemplo, nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, na incorporação imobiliária ou outros negócios imobiliários, bem como<br />

em contratos el<strong>et</strong>rônicos ou digitais.6 O tema será repisa<strong>do</strong> e aprofunda<strong>do</strong> no próximo capítulo <strong>de</strong>ste livro.<br />

Como <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> exaustivamente no presente estu<strong>do</strong>, o Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r consagra como regra a<br />

responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva e solidária <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços, frente aos consumi<strong>do</strong>res. T<strong>al</strong> opção<br />

visa a facilitar a tutela <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em prol da reparação integr<strong>al</strong> <strong>do</strong>s danos, constituin<strong>do</strong> um aspecto materi<strong>al</strong> <strong>do</strong><br />

acesso à justiça. Desse mo<strong>do</strong>, não tem o consumi<strong>do</strong>r o ônus <strong>de</strong> comprovar a culpa <strong>do</strong>s réus nas hipóteses <strong>de</strong> vícios ou <strong>de</strong>feitos <strong>do</strong>s<br />

produtos ou serviços. Trata-se <strong>de</strong> hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> culpa, prevista expressamente em lei, nos mol<strong>de</strong>s<br />

<strong>do</strong> que preceitua a primeira parte <strong>do</strong> art. 927, parágrafo único, <strong>do</strong> Código Civil, in verbis:<br />

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obriga<strong>do</strong> a repará-lo.<br />

Parágrafo único. Haverá obrigação <strong>de</strong> reparar o dano, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa, nos casos especifica<strong>do</strong>s em lei, ou quan<strong>do</strong> a<br />

ativida<strong>de</strong> norm<strong>al</strong>mente <strong>de</strong>senvolvida pelo autor <strong>do</strong> dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos <strong>de</strong> outrem”.<br />

Deve ficar bem claro que, como a responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva consumerista é especificada em lei, não se <strong>de</strong>bate a existência ou<br />

não <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco, nos termos da segunda parte <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, que consagra a chamada cláusula ger<strong>al</strong> <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva. Na verda<strong>de</strong>, o CDC a<strong>do</strong>tou expressamente a i<strong>de</strong>ia da teoria <strong>do</strong> risco-proveito, aquele que gera a<br />

responsabilida<strong>de</strong> sem culpa justamente por trazer benefícios, ganhos ou vantagens. Em outras p<strong>al</strong>avras, aquele que expõe aos<br />

riscos outras pessoas, d<strong>et</strong>erminadas ou não, por <strong>de</strong>le tirar um benefício, dir<strong>et</strong>o ou não, <strong>de</strong>ve arcar com as consequências da situação<br />

<strong>de</strong> agravamento. Uma <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>corrências é justamente a responsabilida<strong>de</strong> obj<strong>et</strong>iva e solidária <strong>do</strong>s agentes envolvi<strong>do</strong>s com a<br />

prestação ou fornecimento.<br />

A par <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> pensar, José Ger<strong>al</strong><strong>do</strong> Brito Filomeno apresenta os seguintes pontos fundamentais para justificar a

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