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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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fonte <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Contemporâneo. Trata-se <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver imposto ao cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong> mitigar suas perdas, ou seja, o próprio prejuízo.<br />

Sobre essa premissa foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> n. 169 <strong>do</strong> CJF/STJ na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, pelo qu<strong>al</strong> “O princípio da boa-fé<br />

obj<strong>et</strong>iva <strong>de</strong>ve levar o cre<strong>do</strong>r a evitar o agravamento <strong>do</strong> próprio prejuízo”.<br />

A proposta <strong>do</strong>utrinária, elaborada por Vera Maria Jacob <strong>de</strong> Fra<strong>de</strong>ra, professora da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul,<br />

representa muito bem a natureza <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> colaboração, presente em todas as fases contratuais e que <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> princípio da boafé<br />

obj<strong>et</strong>iva, inci<strong>de</strong>nte para qu<strong>al</strong>quer contrato.49 Anote-se que o Enuncia<strong>do</strong> n. 169 CJF/STJ está inspira<strong>do</strong> no art. 77 da Convenção<br />

<strong>de</strong> Viena <strong>de</strong> 1980, sobre a venda internacion<strong>al</strong> <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “A parte que invoca a quebra <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong>ve<br />

tomar as medidas razoáveis, levan<strong>do</strong> em consi<strong>de</strong>ração as circunstâncias, para limitar a perda, nela compreendi<strong>do</strong> o prejuízo<br />

resultante da quebra. Se ela negligencia em tomar tais medidas, a parte f<strong>al</strong>tosa po<strong>de</strong> pedir a redução das perdas e danos, em<br />

proporção igu<strong>al</strong> ao montante da perda que po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong> diminuída”. Para a autora da proposta, há uma relação dir<strong>et</strong>a com o<br />

princípio da boa-fé obj<strong>et</strong>iva, uma vez que a mitigação <strong>do</strong> próprio prejuízo constituiria um <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> natureza acessória, um <strong>de</strong>ver<br />

anexo, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> da boa conduta que <strong>de</strong>ve existir entre os negociantes.<br />

A título <strong>de</strong> exemplo para os contratos <strong>de</strong> consumo, imagine-se um contrato bancário ou financeiro em que há <strong>de</strong>scumprimento<br />

por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Segun<strong>do</strong> a interpr<strong>et</strong>ação <strong>de</strong>ste autor, já aplicada pela jurisprudência, não po<strong>de</strong> a instituição financeira<br />

permanecer inerte, aguardan<strong>do</strong> que, diante da <strong>al</strong>ta taxa <strong>de</strong> juros prevista no instrumento contratu<strong>al</strong>, a dívida atinja montantes<br />

astronômicos. Se assim agir, como consequência da violação da boa-fé, os juros <strong>de</strong>vem ser reduzi<strong>do</strong>s. Vejamos a ementa <strong>de</strong> julga<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Mato Grosso <strong>do</strong> Sul que subsume tais premissas:<br />

“Apelação cível. Ação <strong>de</strong> cobrança. Aplicação <strong>do</strong> princípio duty to mitigate the loss. Contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito. Contrato <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC. Revisão das cláusulas abusivas. Possibilida<strong>de</strong>. Juros remuneratórios. Cópia <strong>do</strong> contrato. Ausência.<br />

Aplicação <strong>do</strong> art. 333 <strong>do</strong> CPC. Manutenção da limitação <strong>do</strong>s juros em 12% ao ano. Comissão <strong>de</strong> permanência. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

averiguação da sua cobrança cumulada com outros encargos. Inexistência <strong>de</strong> cópia <strong>do</strong> contrato. Manutenção da sentença que afastou<br />

a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> capit<strong>al</strong>ização mens<strong>al</strong> <strong>de</strong> juros. Prática ileg<strong>al</strong>. Anatocismo. Súmula 121 <strong>do</strong> STF. Usura. Multa. 2%.<br />

F<strong>al</strong>ta <strong>de</strong> interesse recurs<strong>al</strong>. Recurso parci<strong>al</strong>mente conheci<strong>do</strong> e improvi<strong>do</strong>. Se a instituição financeira permanece inerte por longo<br />

perío<strong>do</strong>, aguardan<strong>do</strong> que a dívida atinja montantes astronômicos, impõe-se-lhe a aplicação <strong>do</strong> princípio <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> duty to mitigate<br />

the loss, que impõe, nestes casos, por pen<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>, a redução <strong>do</strong> crédito <strong>do</strong> mutuário <strong>de</strong>veria, nos termos <strong>do</strong> princípio da boa-fé<br />

obj<strong>et</strong>iva, evitar o agravamento <strong>do</strong> próprio prejuízo. Nos termos da Súmula 297 <strong>do</strong> STJ e prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Supremo Tribun<strong>al</strong> Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, o<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável às instituições financeiras. O contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, eis<br />

que resulta da padronização e uniformização das cláusulas contratuais re<strong>al</strong>izadas pela instituição financeira, as quais o consumi<strong>do</strong>r é<br />

obriga<strong>do</strong> a aceitá-las em bloco, em seu prejuízo. Na esteira <strong>do</strong> entendimento atu<strong>al</strong> <strong>do</strong> Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça, levan<strong>do</strong>-se em<br />

consi<strong>de</strong>ração a situação jurídica específica <strong>do</strong> contrato, é <strong>de</strong> se admitir a revisão das cláusulas consi<strong>de</strong>radas abusivas pelo Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Se os juros remuneratórios contrata<strong>do</strong>s exce<strong>de</strong>m a taxa média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>, fixada pelo Banco Centr<strong>al</strong> <strong>do</strong><br />

Brasil, fica autorizada a revisão contratu<strong>al</strong>, eis que caracterizada a abusivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> os juros ser reduzi<strong>do</strong>s ao v<strong>al</strong>or da taxa<br />

média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>. Outrossim, quan<strong>do</strong> a instituição financeira não comprova os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos <strong>do</strong><br />

direito <strong>do</strong> autor, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que a taxa <strong>de</strong> juros por ele cobrada não é extorsiva, mantém-se a fixação <strong>do</strong>s juros em 12%, nos<br />

termos da sentença. Mantém-se a sentença recorrida que afastou a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança da comissão <strong>de</strong> permanência se não<br />

houver nos autos cópia <strong>do</strong> contrato, permitin<strong>do</strong> aferir se a sua cobrança foi cumulada com outros encargos. A capit<strong>al</strong>ização mens<strong>al</strong> <strong>de</strong><br />

juros, <strong>de</strong>nominada anatocismo, é prática vedada pelo nosso or<strong>de</strong>namento jurídico, a exemplo <strong>do</strong> que ocorre com o art. 13 <strong>do</strong> Decr<strong>et</strong>o<br />

22.626/1933, tanto que o STF editou a Súmula 121, que estabelece ser vedada a capit<strong>al</strong>ização <strong>de</strong> juros. Se a sentença apenas afasta a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança da multa em percentu<strong>al</strong> superior a 2%, nos termos contrata<strong>do</strong>s, carece o autor <strong>de</strong> interesse recurs<strong>al</strong>” (TJMS<br />

– Apelação Cível 2009.022658-4/0000-00, Campo Gran<strong>de</strong> – Terceira Turma Cível – Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay – DJEMS<br />

24.09.2009, p. 12).<br />

Exatamente na mesma linha, <strong>de</strong>staque-se <strong>de</strong>cisão recente <strong>do</strong> Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, que substituiu os vultosos<br />

juros contratuais pelos juros legais, incidin<strong>do</strong> o duty to mitigate the loss (TJRJ – Apelação Cível 0010623-64.2009.8.19.0209 – 9.ª<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Roberto <strong>de</strong> Abreu e Silva, j. 2011).<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo, o Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo fez incidir o duty to mitigate the loss em face <strong>de</strong> instituição bancária,<br />

que não apresentou o contrato que iniciou o relacionamento com o correntista. A<strong>de</strong>mais, o banco, durante a execução <strong>do</strong> contrato,<br />

manteve a incidência <strong>de</strong> taxas e <strong>de</strong> juros sobre essas em relação à conta inativa, não solicitan<strong>do</strong> o comparecimento <strong>do</strong> cliente na<br />

agência para o seu <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> encerramento. Além <strong>de</strong> reconhecer a impossibilida<strong>de</strong> da cobrança <strong>do</strong>s v<strong>al</strong>ores, o Tribun<strong>al</strong> Paulista<br />

concluiu pelo <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> banco, diante da inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> correntista em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes (TJSP<br />

– Apelação n. 0003643-11.2012.8.26.0627 – 20ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Origem: Comarca <strong>de</strong> Teo<strong>do</strong>ro Sampaio – Relator<br />

Des. Correia Lima – j. 15.06.2015).<br />

Por fim quanto às ilustrações, a este autor parece que há uma relação dir<strong>et</strong>a entre o duty to mitigate the loss e a cláusula <strong>de</strong> stop<br />

loss, tema an<strong>al</strong>isa<strong>do</strong> pelo Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça no ano <strong>de</strong> 2014. Nos termos <strong>de</strong> julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> no Informativo n. 541 da<br />

Corte Superior, “a instituição financeira que, <strong>de</strong>scumprin<strong>do</strong> o que foi ofereci<strong>do</strong> a seu cliente, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> acionar mecanismo

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