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3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)

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2º, <strong>do</strong> CDC). A redução por razoabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s juros e <strong>do</strong>s acréscimos afasta o enriquecimento sem causa por parte daquele que<br />

conce<strong>de</strong> o crédito.<br />

Além disso, como observam Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, a norma visa a afastar o<br />

superendividamento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, fenômeno muito comum na re<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> brasileira, em especi<strong>al</strong> pelas facilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong><br />

crédito, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que com <strong>al</strong>tas taxas <strong>de</strong> juros. Como bem explicam, “O superendividamento po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> como impossibilida<strong>de</strong><br />

glob<strong>al</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r-pessoa física, consumi<strong>do</strong>r, leigo e <strong>de</strong> boa-fé, <strong>de</strong> pagar todas as suas dívidas atuais e futuras <strong>de</strong> consumo<br />

(excluídas as dívidas com o Fisco, oriundas <strong>de</strong> <strong>de</strong>litos e <strong>al</strong>imentos) em um tempo razoável com sua capacida<strong>de</strong> atu<strong>al</strong> <strong>de</strong> rendas e<br />

patrimônio”.93 Em complemento, ensina Heloísa Carpena que o superendivida<strong>do</strong> é a “pessoa física que contrata a concessão <strong>de</strong> um<br />

crédito, <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à aquisição <strong>de</strong> produtos ou serviços que, por sua vez, visam aten<strong>de</strong>r a uma necessida<strong>de</strong> pesso<strong>al</strong>, nunca<br />

profission<strong>al</strong> <strong>do</strong> adquirente. A mais importante característica refere-se à condição pesso<strong>al</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que <strong>de</strong>ve agir <strong>de</strong> boa-fé”. 94<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, o afastamento <strong>de</strong>ssa infeliz situação se dá pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> redução das taxas <strong>de</strong> juros convencionais no<br />

Brasil, na linha <strong>do</strong> outrora exposto. Também passa pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ef<strong>et</strong>ivação <strong>de</strong> medidas educacionais para o brasileiro médio<br />

que, em regra, não sabe lidar com a concessão <strong>de</strong> crédito.<br />

O Proj<strong>et</strong>o <strong>de</strong> Lei 283/2012, uma das propostas <strong>de</strong> <strong>al</strong>teração <strong>do</strong> CDC, pr<strong>et</strong>en<strong>de</strong> regulamentar a matéria <strong>do</strong> superendividamento.<br />

Inici<strong>al</strong>mente, há proposição <strong>de</strong> introduzir o inc. XI ao art. 6º <strong>do</strong> CDC, prescreven<strong>do</strong> como direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r “a garantia<br />

<strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> crédito responsável, <strong>de</strong> educação financeira, <strong>de</strong> prevenção e tratamento das situações <strong>de</strong> superendividamento,<br />

preservan<strong>do</strong> o mínimo existenci<strong>al</strong>, por meio da revisão e repactuação da dívida, entre outras medidas”. A menção ao mínimo<br />

existenci<strong>al</strong> ou patrimônio mínimo é louvável, para a tutela da dignida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Além disso, são acrescenta<strong>do</strong>s os arts. 54-A a 54-G, com medidas concr<strong>et</strong>as para evitar o superendividamento, o que tem apoio<br />

<strong>de</strong>ste autor. O primeiro coman<strong>do</strong> merece <strong>de</strong>staque por consagrar princípios aplicáveis a essas medidas: “Esta seção tem a fin<strong>al</strong>ida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> prevenir o superendividamento da pessoa física, promover o acesso ao crédito responsável e à educação financeira <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> forma a evitar a sua exclusão soci<strong>al</strong> e o comprom<strong>et</strong>imento <strong>de</strong> seu mínimo existenci<strong>al</strong>, sempre com base nos<br />

princípios da boa-fé, da função soci<strong>al</strong> <strong>do</strong> crédito ao consumi<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> respeito à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana”.<br />

Dentro <strong>de</strong>sse capítulo da proposta, <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stacada a vedação <strong>de</strong> utilização <strong>de</strong> termos como “sem juros”, “gratuito”, “sem<br />

acréscimo”, “com taxa zero”, com o fim <strong>de</strong> evitar o consumo impulsivo <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, muitas vezes induzi<strong>do</strong> a erro. A<strong>de</strong>mais,<br />

a norma passa a estabelecer, como feliz tentativa, que nos contratos em que o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> pagamento da dívida envolva autorização<br />

prévia <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r pessoa física para consignação em folha <strong>de</strong> pagamento ou qu<strong>al</strong>quer forma que implique cessão ou reserva <strong>de</strong><br />

parte <strong>de</strong> sua remuneração, a soma das parcelas reservadas para pagamento <strong>de</strong> dívidas não po<strong>de</strong>rá ser superior a trinta por cento da<br />

sua remuneração mens<strong>al</strong> líquida. A fin<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse art. 54-D proj<strong>et</strong>a<strong>do</strong> é manter o mínimo existenci<strong>al</strong> ou o patrimônio mínimo <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntro da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> tutela da dignida<strong>de</strong> humana.<br />

Em 2016, importante aresto <strong>do</strong> Tribun<strong>al</strong> da Cidadania aplicou o texto <strong>do</strong> proj<strong>et</strong>o legislativo, limitan<strong>do</strong> o empréstimo obti<strong>do</strong> nos<br />

limites propostos. Nos termos da sua ementa, que conta com o tot<strong>al</strong> apoio <strong>de</strong>ste autor, “v<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> da cláusula autoriza<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconto em conta-corrente para pagamento das prestações <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> empréstimo, ainda que se trate <strong>de</strong> conta utilizada para<br />

recebimento <strong>de</strong> s<strong>al</strong>ário. Os <strong>de</strong>scontos, todavia, não po<strong>de</strong>m ultrapassar 30% (trinta por cento) da remuneração líquida percebida pelo<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, após <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong>s os <strong>de</strong>scontos obrigatórios (Previdência e Imposto <strong>de</strong> Renda). Preservação <strong>do</strong> mínimo existenci<strong>al</strong>, em<br />

consonância com o princípio da dignida<strong>de</strong> humana. Doutrina sobre o tema” (STJ – REsp 1.584.501/SP – Terceira Turma – Rel.<br />

Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 06.10.2016, DJe 13.10.2016).<br />

Por fim quanto à proposta, há também a louvável proposição <strong>de</strong> se incluir regulamentação a respeito da audiência <strong>de</strong><br />

conciliação no caso <strong>de</strong> superendividamento (art. 104-A). A regulamentação ger<strong>al</strong> vem com o seguinte senti<strong>do</strong>: “A requerimento <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r superendivida<strong>do</strong> pessoa física, o juiz po<strong>de</strong>rá instaurar processo <strong>de</strong> repactuação <strong>de</strong> dívidas, visan<strong>do</strong> à re<strong>al</strong>ização <strong>de</strong><br />

audiência conciliatória, presidida por ele ou por concilia<strong>do</strong>r cre<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> no juízo, com a presença <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os cre<strong>do</strong>res, em que o<br />

consumi<strong>do</strong>r apresentará proposta <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> pagamento com prazo máximo <strong>de</strong> cinco anos, preserva<strong>do</strong> o mínimo existenci<strong>al</strong>”. Pelo<br />

seu importante impacto soci<strong>al</strong>, espera-se que as projeções obtenham êxito no Congresso Nacion<strong>al</strong>.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, o art. 53 da Lei 8.078/1990 estabelece a nulida<strong>de</strong> específica, por abusivida<strong>de</strong>, da cláusula <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>caimento ou <strong>de</strong> perdimento, relativa à perda <strong>de</strong> todas as parcelas pagas em contratos <strong>de</strong> financiamento. Vejamos a redação <strong>de</strong>sse<br />

importante coman<strong>do</strong>:<br />

“Art. 53. Nos contratos <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas <strong>al</strong>ienações<br />

fiduciárias em garantia, consi<strong>de</strong>ram-se nulas <strong>de</strong> pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda tot<strong>al</strong> das prestações pagas em<br />

benefício <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r que, em razão <strong>do</strong> inadimplemento, pleitear a resolução <strong>do</strong> contrato e a r<strong>et</strong>omada <strong>do</strong> produto <strong>al</strong>iena<strong>do</strong>.<br />

§ 1º (V<strong>et</strong>a<strong>do</strong>).<br />

§ 2º Nos contratos <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> consórcio <strong>de</strong> produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma<br />

<strong>de</strong>ste artigo, terá <strong>de</strong>scontada, <strong>al</strong>ém da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o <strong>de</strong>sistente ou inadimplente

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