3 - TARTUCE, Flávio et al. Manual de Direito do Consumidor - Direito Material e Processual (2017)
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
após a homologação, as causas referentes à nacion<strong>al</strong>ida<strong>de</strong>, inclusive a respectiva opção, e à natur<strong>al</strong>ização”) e XI (“a disputa sobre<br />
direitos indígenas”).<br />
Mas na hipótese prevista pelo inciso III <strong>do</strong> art. 109 da CF/1988 o tema não será resolvi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma tão tranquila. Serão <strong>de</strong><br />
comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> as causas fundadas em trata<strong>do</strong> ou contrato da União com Esta<strong>do</strong> estrangeiro ou organismo<br />
internacion<strong>al</strong>, sen<strong>do</strong> possível, ainda que raro, que o contrato menciona<strong>do</strong> pelo dispositivo constitucion<strong>al</strong> tenha natureza<br />
consumerista. Como bem lembra a <strong>do</strong>utrina, são variadas as espécies <strong>de</strong> contratos internacionais:<br />
“Os contratos internacionais, igu<strong>al</strong>mente expressan<strong>do</strong> convergência <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s, po<strong>de</strong>m tratar <strong>do</strong>s mais varia<strong>do</strong>s assuntos (sociais,<br />
econômicos, tecnológicos, entre outros), <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> sempre obj<strong>et</strong>ivar a concreção <strong>do</strong> interesse público, a ef<strong>et</strong>ivação <strong>do</strong>s princípios<br />
constitucionais e o cumprimento das avenças internacionais. Po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s os contratos <strong>de</strong> transporte marítimo, <strong>de</strong> tarifas<br />
aplicáveis às operações entre países signatários <strong>de</strong> acor<strong>do</strong>s a elas relativos, <strong>de</strong> importação e trânsito <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias estrangeiras, <strong>de</strong><br />
responsabilida<strong>de</strong> por danos ecológicos, entre outros”114.<br />
Seria mais fácil imaginar t<strong>al</strong> situação num contrato celebra<strong>do</strong> entre a União e uma empresa estrangeira, mas, como já restou<br />
<strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> pelo Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça, não se po<strong>de</strong> confundir empresa estrangeira com organismo internacion<strong>al</strong> 115 . De<br />
qu<strong>al</strong>quer forma, mesmo tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> contrato firma<strong>do</strong> com organismo internacion<strong>al</strong>, é possível, ainda que rara, a existência <strong>de</strong><br />
relação <strong>de</strong> consumo, conforme exposto anteriormente.<br />
Sen<strong>do</strong> a comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> d<strong>et</strong>erminada pela pessoa, a matéria passa a ser irrelevante, sen<strong>do</strong> natur<strong>al</strong>mente<br />
possível que envolva matéria consumerista. Em especi<strong>al</strong> na hipótese <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência prevista no art. 109, I, da CF/1988, que<br />
justifica a maior parte das ações em trâmite perante a Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>.<br />
O dispositivo leg<strong>al</strong> se refere à União, entida<strong>de</strong> autárquica e empresa pública fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>. A jurisprudência, entr<strong>et</strong>anto, se<br />
consoli<strong>do</strong>u no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> também incluir as fundações fe<strong>de</strong>rais como entes aptos a exigir a comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>. As<br />
pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público da administração indir<strong>et</strong>a mencionadas já seriam o suficiente para compreen<strong>de</strong>r a possibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo serem obj<strong>et</strong>o <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>. A pesquisa <strong>de</strong> 2011 re<strong>al</strong>izada pelo CNJ a<br />
respeito <strong>do</strong>s 100 maiores litigantes da Justiça Brasileira aponta os bancos com 18% <strong>do</strong>s processos em trâmite perante a Justiça<br />
Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, em sua absoluta maioria em <strong>de</strong>corrência da participação da Caixa Econômica Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, que é o segun<strong>do</strong> maior litigante<br />
nacion<strong>al</strong>, envolvida em 8,50% das ações em trâmite.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> não existir expressa previsão no art. 109, I, da CF/1988 a esse respeito, é tranquilo o entendimento<br />
<strong>do</strong> Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça pela inclusão em t<strong>al</strong> dispositivo leg<strong>al</strong> <strong>do</strong>s conselhos <strong>de</strong> fisc<strong>al</strong>ização profission<strong>al</strong>116 e das agências<br />
regula<strong>do</strong>ras fe<strong>de</strong>rais 117 . Nesses casos, entr<strong>et</strong>anto, como bem <strong>de</strong>monstra a <strong>do</strong>utrina, é mais comum a existência <strong>de</strong> ações col<strong>et</strong>ivas na<br />
<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r:<br />
“De fato, hoje é possível colecionar diversas ações civis públicas promovidas pelos entes legitima<strong>do</strong>s em face da Anatel, Aneel,<br />
ANP, ANS, e mesmo a Superintendência <strong>de</strong> Seguros Priva<strong>do</strong>s (Susep) e Banco Centr<strong>al</strong> <strong>do</strong> Brasil (Bacen), autarquias fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong><br />
outrora. O obj<strong>et</strong>o litigioso <strong>do</strong> processo é, via <strong>de</strong> regra, a regulamentação fruto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r regulatório que fere o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />
Consumi<strong>do</strong>r” 118 .<br />
O mesmo ocorre com a presença na <strong>de</strong>manda <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>. Mantenho o entendimento <strong>de</strong> que a simples<br />
presença <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> seja suficiente para d<strong>et</strong>erminar a comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, mas é preciso reconhecer<br />
o entendimento contrário consolida<strong>do</strong> no Superior Tribun<strong>al</strong> <strong>de</strong> Justiça, com fundamento na ausência <strong>de</strong> person<strong>al</strong>ida<strong>de</strong> jurídica <strong>do</strong><br />
Ministério Público. Afirma-se que o Ministério Público Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> é um órgão da União e, como t<strong>al</strong>, está incluí<strong>do</strong> no termo “União”<br />
expressamente previsto pelo art. 109, I, da CF/1988. Dessa forma, ainda que se admita um litisconsórcio entre o Ministério Público<br />
Estadu<strong>al</strong> e o Ministério Público Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>verá tramitar perante a Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, por <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> interpr<strong>et</strong>ação<br />
extensiva <strong>do</strong> rol <strong>de</strong> sujeitos previstos no art. 109, I, da CF 119 . De qu<strong>al</strong>quer forma, a exemplo das <strong>de</strong>mandas que envolvem as<br />
agências regula<strong>do</strong>ras, a presença <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> interessa às ações col<strong>et</strong>ivas consumeristas.<br />
Não se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>, a comp<strong>et</strong>ência da Justiça Estadu<strong>al</strong> será residu<strong>al</strong>. A comp<strong>et</strong>ência da justiça<br />
comum é residu<strong>al</strong>, d<strong>et</strong>ermina<strong>do</strong> pelo que não for <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência das justiças especi<strong>al</strong>izadas. Na justiça comum, a comp<strong>et</strong>ência da<br />
Justiça Estadu<strong>al</strong> é residu<strong>al</strong>, d<strong>et</strong>erminada pelo que não for <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência da Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong>. Ainda que residu<strong>al</strong>, a maior parte das<br />
<strong>de</strong>mandas que têm como obj<strong>et</strong>o uma relação consumerista são <strong>de</strong> comp<strong>et</strong>ência da Justiça Estadu<strong>al</strong>.<br />
10.4.3.<br />
Comp<strong>et</strong>ência territori<strong>al</strong><br />
A comp<strong>et</strong>ência territori<strong>al</strong> é aquela que d<strong>et</strong>ermina o foro comp<strong>et</strong>ente, ou seja, a circunscrição territori<strong>al</strong> comp<strong>et</strong>ente para o<br />
julgamento da <strong>de</strong>manda: na Justiça Estadu<strong>al</strong> é a Comarca e na Justiça Fe<strong>de</strong>r<strong>al</strong> a Seção Judiciária.