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D.Quixote de La Mancha - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Não quiseram esperar mais pelo <strong>de</strong>sfecho, e seguiram o seu caminho,<br />

fazendo mais cruzes, que se levassem o diabo atrás <strong>de</strong> si.<br />

Estava D. <strong>Quixote</strong>, como já se disse, falando com a senhora do coche,<br />

dizendo-lhe:<br />

— A Vossa formosura, senhora minha, po<strong>de</strong> fazer da sua pessoa o que mais<br />

lhe apeteça, porque já a soberba <strong>de</strong> vossos roubadores jaz <strong>de</strong>rribada em terra por<br />

este meu forte braço; e para que vos não raleis <strong>de</strong> não saber o nome do vosso<br />

libertador, chamo-me D. <strong>Quixote</strong> <strong>de</strong> la <strong>Mancha</strong>, cavaleiro andante, e cativo da sem<br />

par em formosura D. Dulcinéia <strong>de</strong>l Toboso; e em paga do benefício que <strong>de</strong> mim<br />

haveis recebido, nada mais quero senão que volteis a Toboso, e que da minha parte<br />

vos apresenteis a ela, e lhe digais o que fiz para vos libertar.<br />

Tudo que D. <strong>Quixote</strong> dizia, estava-o escutando um escu<strong>de</strong>iro dos que<br />

acompanhavam o coche, e que era biscainho, o qual, vendo que o cavaleiro não<br />

queria <strong>de</strong>ixar ir o coche para diante, mas teimava que havia <strong>de</strong> <strong>de</strong>sandar logo para<br />

Toboso, fez frente a D. <strong>Quixote</strong>, e, agarrando-lhe na lança, lhe disse em mau<br />

castelhano e pior biscainho o que pouco mais ou menos vinha a parar nisto:<br />

— Anda, cavaleiro, que mal andas; pelo Deus que me criou, que, se não<br />

<strong>de</strong>ixas o coche, morres tão certo como ser eu biscainho.<br />

Enten<strong>de</strong>u-o muito bem D. <strong>Quixote</strong>, e com muito sossego lhe respon<strong>de</strong>u:<br />

— Se foras cavaleiro, assim como o não és, já eu teria castigado a tua<br />

sandice e atrevimento, criatura reles.<br />

Ao que respon<strong>de</strong>u o biscainho lá pelo seu dialeto:<br />

— Não sou cavaleiro eu? Juro a Deus que mentes, tão certo como ser eu<br />

cristão; se arrojas lança ou arrancas espada, verás como te vai tudo pelo pó do gato;<br />

biscainho por terra, fidalgo por mar, fidalgo com os diabos; e, se o negares, mentiste.<br />

— Agora o veremos, como dizia Agrages — respon<strong>de</strong>u D. <strong>Quixote</strong>.<br />

E, atirando a lança ao chão, <strong>de</strong>sembainhou a espada, embraçou a ro<strong>de</strong>la, e<br />

arremeteu ao biscainho, <strong>de</strong> estômago feito para lhe arrancar a vida. O biscainho,<br />

que assim o viu sobrevir-lhe, ainda que se quisesse apear da mula, que, por ser das<br />

<strong>de</strong> aluguer, não era das boas, nem havia que fiar nela, o mais que pô<strong>de</strong> foi sacar da<br />

espada; e foi-lhe dita achar-se junto ao coche, don<strong>de</strong> pô<strong>de</strong> tomar uma almofada que<br />

lhe serviu <strong>de</strong> escudo; e logo se foram um para o outro como dois mortais inimigos.<br />

A <strong>de</strong>mais gente bem quisera pô-los em paz, mas não pô<strong>de</strong>, porque dizia o<br />

biscainho nas suas <strong>de</strong>scosidas razões que, se o não <strong>de</strong>ixassem acabar a batalha,<br />

ele próprio mataria a sua ama e a quantos lho estorvassem.<br />

A senhora do coche, pasmada e temerosa do que via, disse ao cocheiro que<br />

se <strong>de</strong>sviasse algum tanto dali, e se pôs <strong>de</strong> longe a admirar a pavorosa contenda.<br />

No <strong>de</strong>curso <strong>de</strong>la, <strong>de</strong>u o biscainho uma gran<strong>de</strong> cutilada a D. <strong>Quixote</strong>, acima <strong>de</strong> um<br />

ombro por sobre a ro<strong>de</strong>la, que, a dar-lha sem <strong>de</strong>fensa, o abrira até à cintura. D.<br />

<strong>Quixote</strong>, que sentiu o peso daquele <strong>de</strong>saforado golpe, <strong>de</strong>u um gran<strong>de</strong> berro,<br />

dizendo:<br />

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