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D.Quixote de La Mancha - Unama

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www.nead.unama.br<br />

vendo que a podia repetir em voz alta, para que o duque e os outros circunstantes a<br />

ouvissem, leu <strong>de</strong>sta maneira:<br />

CARTA DE TERESA PANÇA À DUQUESA<br />

"Muita satisfação me <strong>de</strong>u, senhora minha, a carta que vossa graça me<br />

escreveu, que, na verda<strong>de</strong>, bastante a <strong>de</strong>sejava. O colar <strong>de</strong> corais é muito bom, e o<br />

fato <strong>de</strong> caça <strong>de</strong> meu marido não lhe fica atrás. Muito gostou este povo todo <strong>de</strong> saber<br />

que Vossa Senhoria tinha feito governador a Sancho meu consorte, ainda que não<br />

há quem o creia, e menos ainda o cura, e mestre Nicolau, o barbeiro, e Sansão<br />

Carrasco, o bacharel; mas a mim é que me não importa que, sendo isto assim como<br />

é, diga lá cada um o que quiser; ainda que, a dizer a verda<strong>de</strong>, se não viessem os<br />

corais e o fato eu também não acreditava, porque, nesta terra, todos têm meu<br />

marido por um tolo, que, em o tirando <strong>de</strong> governar um rebanho <strong>de</strong> cabras, não se<br />

imagina para que governo ele possa ser bom; enfim, Deus o encaminhe, como vê<br />

que seus filhos precisam. Eu, senhora da minha alma, estou resolvida, com licença<br />

<strong>de</strong> Vossa Mercê, a ir até a corte, para andar <strong>de</strong> coche e quebrar os olhos aos mil<br />

invejosos que já tenho; e, assim, peço a Vossa Excelência que man<strong>de</strong> dizer a meu<br />

marido que me envie algum dinheirinho, e que não seja pouco, porque, na corte, as<br />

<strong>de</strong>spesas são gran<strong>de</strong>s, que o pão está a real e a carne a trinta maravedis o arrátel,<br />

tudo pela hora da morte; e, se ele não quiser que eu vá, que me avise a tempo,<br />

porque já me está pulando o pé para me pôr a caminho; e dizem-me as minhas<br />

amigas e as minhas vizinhas que, se eu e a minha filha andarmos pomposas na<br />

corte, mais conhecido virá a ser meu marido por mim do que eu por ele, perguntando<br />

muitos, por força: "Quem são as senhoras que vão naquele coche?" E um criado<br />

meu respon<strong>de</strong>rá: "São a mulher e a filha <strong>de</strong> Sancho Pança, governador da ilha<br />

Barataria". E, <strong>de</strong>ste modo, será conhecido meu marido, e eu serei estimada. Pesame,<br />

o mais que pesar-me po<strong>de</strong>, não ter havido, este ano, bolotas neste povo;<br />

contudo, mando a Vossa Alteza meio salamim, que fui colher a uma e uma e<br />

escolher ao monte, e não as achei mais, maiores quereria que fossem como ovos <strong>de</strong><br />

avestruz.<br />

"Não se esqueça vossa pomposida<strong>de</strong> <strong>de</strong> me escrever, que eu cuidarei <strong>de</strong><br />

mandar logo a resposta, dando novas da minha saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> tudo o <strong>de</strong> que neste<br />

lugar houver que dar notícia, e aqui fico rogando a Nosso Senhor que guar<strong>de</strong> vossa<br />

gran<strong>de</strong>za e que a mim não me esqueça. Sancha minha filha, e meu filho, beijam as<br />

mãos a Vossa Mercê.<br />

"A que tem mais <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ver a Vossa Senhoria do que <strong>de</strong> lhe escrever.<br />

Sua criada,<br />

TERESA PANÇA."<br />

Todos se divertiram muito, ouvindo a carta <strong>de</strong> Teresa Pança, principalmente<br />

os duques; e a duquesa perguntou a D. <strong>Quixote</strong> se se po<strong>de</strong>ria abrir a carta que<br />

vinha para o governador, que <strong>de</strong>via ser excelente, e D. <strong>Quixote</strong> disse que a abriria<br />

ele, para lhes dar gosto; e assim o fez, e viu que dizia <strong>de</strong>sta maneira:<br />

CARTA DE TERESA PANÇA A SANCHO PANÇA SEU MARIDO<br />

"Recebi a tua carta, meu Sancho da minha alma, e juro-te, como católica, que<br />

não faltaram dois <strong>de</strong>dos para eu ficar louca <strong>de</strong> contentamento. Olha, mano, quando<br />

ouvi dizer que estás sendo governador, por pouco não caí morta <strong>de</strong> puro gozo; que<br />

tu bem sabes que dizem que tanto mata a súbita alegria, como a gran<strong>de</strong> aflição. A<br />

Sanchita, <strong>de</strong> puro contentamento, pôs-se num charco sem se sentir. Eu tinha diante<br />

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