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D.Quixote de La Mancha - Unama

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www.nead.unama.br<br />

também não lhe fico atrás, que até sou ainda mais mentecapto do que ele, pois que<br />

o sirvo e sigo, se é verda<strong>de</strong>iro o rifão: Diz-me com quem andas, dir-te-ei as manhas<br />

que tens. Sendo assim tão doido, dando-lhe a loucura para tomar a maior parte das<br />

vezes uma coisa por outra, o branco pelo preto e o preto pelo branco, moinhos <strong>de</strong><br />

vento por gigantes, mulas <strong>de</strong> religiosos por dromedários, rebanhos <strong>de</strong> carneiros por<br />

exércitos <strong>de</strong> inimigos, e outras <strong>de</strong>ste jaez, não me será difícil fazer-lhe crer que a<br />

primeira lavra<strong>de</strong>ira que eu por aí topar é a senhora Dulcinéia; e, quando ele o não<br />

acredite, eu juro, e se ele jurar também, juro outra vez, e se teimar, eu ainda mais<br />

teimo, <strong>de</strong> forma que fique sempre na minha, venha o que vier. Talvez com esta<br />

porfia conseguirei que me não torne a incumbir <strong>de</strong> semelhantes mensagens, vendo<br />

que dou tão má conta do recado, ou talvez pense, como imagino, que algum mau<br />

nigromante, dos que ele diz que lhe querem mal, lhe mudou a figura <strong>de</strong> Dulcinéia,<br />

para lhe fazer dano.<br />

E com isto ficou Sancho <strong>de</strong> espírito sossegado, e <strong>de</strong>u por findo o seu negócio,<br />

<strong>de</strong>morando-se ali até à tar<strong>de</strong>, para que D. <strong>Quixote</strong> supusesse que ele efetivamente<br />

fora a Toboso; e saiu-lhe tudo tão bem, que quando se levantou para montar no<br />

burro, viu que saíam do Toboso três lavra<strong>de</strong>iras montadas em burros ou em burras,<br />

o que o autor não explica bem, <strong>de</strong>vendo acreditar antes que seriam burricas, por<br />

serem essas as cavalgaduras habituais das al<strong>de</strong>ãs; mas, como o caso não é<br />

importante, não vale a pena <strong>de</strong>morarmo-nos a averiguá-lo. Assim que Sancho viu as<br />

lavra<strong>de</strong>iras, foi logo ter com D. <strong>Quixote</strong>, e achou-o suspirando e repetindo mil<br />

amorosas lamentações.<br />

— Que há <strong>de</strong> novo, Sancho amigo? — perguntou-lhe D. <strong>Quixote</strong> assim que o<br />

viu — Po<strong>de</strong>rei marcar este dia com pedra branca ou pedra negra?<br />

— Será melhor — respon<strong>de</strong>u Sancho — que Vossa Mercê o marque com<br />

almagre, para se ver bem <strong>de</strong> longe.<br />

— Então — redarguiu D. <strong>Quixote</strong> — trazes boas notícias.<br />

— Tão boas — respon<strong>de</strong>u Sancho — que não tem Vossa Mercê mais que<br />

fazer que picar as esporas a Rocinante e sair à estrada para ver a senhora Dulcinéia<br />

<strong>de</strong>l Toboso, que com duas damas suas vem ver Vossa Mercê.<br />

— Santo Deus! Que estás dizendo, Sancho amigo? Não me enganes, nem<br />

queiras com falsos júbilos alegrar as minhas verda<strong>de</strong>iras tristezas.<br />

— Que aproveitava eu em o enganar — tornou Sancho — po<strong>de</strong>ndo Vossa<br />

Mercê tão <strong>de</strong>pressa <strong>de</strong>scobrir a verda<strong>de</strong>? Pique as esporas, e venha ver a princesa,<br />

nossa ama, que aí temos adornada e vestida como quem é. Ela e as suas damas<br />

todas são ouro, pérolas, diamantes, rubins, telas <strong>de</strong> brocado; os cabelos soltos nos<br />

ombros, que parecem outros tantos raios do sol que andam brincando com o vento;<br />

e, sobretudo, vêm a cavalo em três calafréns, que não se po<strong>de</strong> ver coisa melhor.<br />

— Palafréns é que tu queres dizer, Sancho.<br />

— Vem a dar na mesma; mas, seja lá como for, o que é certo é que vêm o<br />

mais garbosas que se po<strong>de</strong>m imaginar, principalmente a princesa Dulcinéia, senhora<br />

minha, que arrebata os sentidos.<br />

— Vamos, Sancho filho — tornou D. <strong>Quixote</strong> — e, em alvíssaras <strong>de</strong>stas boas<br />

e inesperadas novas, te darei o maior <strong>de</strong>spojo que eu ganhar na primeira aventura<br />

que tiver; e se isto te não agradar, dou-te as crias que tiverem este ano as minhas<br />

três éguas, que sabes que ficaram cheias.<br />

— Prefiro as crias — respon<strong>de</strong>u Sancho — porque não é lá muito certo que<br />

sejam gran<strong>de</strong> coisa os <strong>de</strong>spojos da primeira aventura.<br />

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