dissertação revisada para biblioteca - Centro de Referência Virtual ...
dissertação revisada para biblioteca - Centro de Referência Virtual ...
dissertação revisada para biblioteca - Centro de Referência Virtual ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
138<br />
também, como era a situação da igreja em Ribeirão da Folha, se muita gente estava<br />
freqüentando o culto, se teria missa no fim do mês, do que em saber o que eu e o professor<br />
que me acompanhava estávamos fazendo ali. Chamou-nos <strong>para</strong> a cozinha, “pra ficá melhor<br />
<strong>de</strong> conversar...”. (Dona Maria, moradora.) 39 .<br />
É comum no interior <strong>de</strong> Minas, como bem po<strong>de</strong>mos afirmar, as pessoas serem<br />
recebidas nas cozinhas, é um local propício às interações. Receber uma pessoa na cozinha é<br />
sinal <strong>de</strong> que a pessoa é bem vinda, que é querida. O diálogo, as conversas informais ou não,<br />
fluem, enquanto um café é servido. O calor do fogão <strong>de</strong> lenha aquece as interações e relações<br />
afetivas. E também a dona-<strong>de</strong>-casa po<strong>de</strong> conversar enquanto termina o almoço, ou o jantar.<br />
Quando uma pessoa chega à casa da outra e entra na cozinha, na hora das refeições, eles<br />
dizem assim: “chegar na hora da comida é sinal <strong>de</strong> que você nunca fala mal do povo da casa”.<br />
Po<strong>de</strong>mos perceber assim o valor que é dado à cozinha como espaço não só <strong>de</strong> alimentação,<br />
mas também <strong>de</strong> interação.<br />
De acordo com Malinowski, (1980, p. 46) “o pesquisador <strong>de</strong> campo baseia-se<br />
inteiramente na inspiração proporcionada pela teoria”. Portanto, nesse primeiro contato tentei<br />
me orientar teoricamente com o já apreendido ao longo dos meus estudos e leituras. Busquei<br />
<strong>de</strong> acordo com DaMatta,<br />
tirar a capa <strong>de</strong> membro <strong>de</strong> uma classe e <strong>de</strong> um grupo social específico <strong>para</strong> po<strong>de</strong>r –<br />
como etnólogo – estranhar alguma regra social familiar e assim <strong>de</strong>scobrir (ou<br />
recolocar, como fazem as crianças quando perguntam os ) o exótico no<br />
que está petrificado <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> nós pela reificação e pelos mecanismos <strong>de</strong><br />
legitimação. (1987, p. 157).<br />
Tentei, <strong>de</strong>ssa forma, praticar o chamado estranhamento, que é a tentativa <strong>de</strong> afastamento do<br />
que era <strong>para</strong> mim muito familiar, o fato <strong>de</strong> ser recebida na cozinha, por exemplo. No Vale do<br />
Jequitinhonha <strong>de</strong> maneira geral, mas, especificamente na região <strong>de</strong> Minas Novas é bem<br />
comum as pessoas serem recebidas nas cozinhas das casas. Dessa forma, tentei perceber esse<br />
familiar – o fato <strong>de</strong> ser recebida na cozinha – como algo exótico. Para Gilberto Velho, citado<br />
por DaMatta, o que é exótico nem sempre é totalmente <strong>de</strong>sconhecido. E, sobre o que é<br />
familiar ele diz que, “o que sempre vemos e encontramos po<strong>de</strong> ser familiar mas não é<br />
necessariamente conhecido”. Segundo DaMatta,<br />
[...] em toda a socieda<strong>de</strong>, isto é, em toda totalida<strong>de</strong>, existem coisas que me são<br />
familiares no sentido <strong>de</strong> serem elementos do sistema <strong>de</strong> classificação e coisas que<br />
são totalmente estranhas a este sistema. (1987, p. 160).<br />
39 Dados da conversa informal. Pesquisa <strong>de</strong> campo realizada no Quilombo em 20/07/2010.